* O jornalista viaja a convite da SAHIC Latin America & The Caribbean

** De Cartagena, na Colômbia

Logo após a coletiva de imprensa, houve a abertura formal da SAHIC Latin America & The Caribbean, que acaba amanhã (28), no Hilton Cartagena, em Cartagena, na Colômbia. CEO da empresa organizadora, Arturo Garcia Rosa deu boas-vindas aos participantes e celebrou o bom momento da indústria de hotéis desde o fim da pandemia.

“Temos certeza que estamos promovendo um evento que vai transformar o desenvolvimento da indústria na América Latina e do Caribe. Superamos a performance 2019, mostramos uma capacidade de resiliência muito importante para este setor, que também tem grande potencial de transformar a vida das pessoas, seja de quem trabalha ou seja quem consome produtos e serviços hoteleiros”, declarou. “Agora, não poderia abrir esse evento sem também agradecer a quem me ajuda a colocá-lo de pé. Então, gostaria de agradecer à minha equipe, aos patrocinadores e os mais de 250 delegados de diferentes países presentes.”

Na sequência, Adriana Arreaza subiu ao palco da SAHIC para apresentar uma visão geral da economia global e da América Latina. Para começar, e olhando os dois últimos anos em retrospectiva, a diretora de Estudos Macroeconômicos do CAF (Banco de Desenvolvimento da América Latina) disse que o ritmo de crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) global não tende a se manter.

“E isso vai acontecer em função do aperto da política monetária imposto em vários países. Há ainda guerra na Ucrânia e um cenário de inflação a se combater. No entanto, acho que ainda não é para se temer um risco de recessão global. Digo isso porque há sinais positivos, como o nível de empregabilidade estável na Europa e nos Estados Unidos e a ação rápida de bancos centrais para conter possíveis riscos de crise bancária”, comentou Adriana ao e referir aos recentes episódios envolvendo o SVB (Silycon Valley Bank), nos Estados Unidos, e o Credit Suisse, na Europa.

América Latina

Na região, as economias têm situações e perspectivas muito distintas, muito embora a baixa produtividade seja um traço marcante para todas elas. “Uma análise nas contas externas dos países da região mostra que há uma melhora e volta gradual ao que se via antes da pandemia, com o fluxo de capitais mostrando estabilidade. Outro ponto positivo é que os investimentos estrangeiros diretos também passam por um ciclo de crescimento”, comentou a executiva. “Por isso, essa combinação entre baixa necessidade de importar capital e as reservas internacionais elevadas, além do investimento estrangeiro crescendo, afasta um pouco o risco de um choque financeiro na região”, avalia.

Em paralelo, observou a executiva do CAF, a inflação está cedendo nas economias latino-americanas. “Importante destacar que os bancos centrais desses países foram os primeiros a iniciar um ciclo altista de juros em nível global. Ainda assim, apesar da queda na inflação, ela ainda segue alta, com impacto forte nos preços de alimentos e energia, o que afeta a indústria hoteleira”, comentou. Na contramão, o endividamento do Estado atrapalha os investimentos dos governos, o que impacta na aceleração do desenvolvimento econômico dos países.

“Depois do boom das commodities, que melhorou índices sociais, houve uma queda em função da pandemia. Gradualmente, esses indicadores voltam aos padrões pré-pandemia, mas seguem altos, embora o nível de empregos siga em bom patamar, apesar da elevada informalidade”, observou Adriana. “Ou seja, a pobreza e a extrema pobreza seguem sendo um problema não resolvido na região, o que demanda reformas importantes por parte dos governos para melhorar o nível de produtividade e acelerar o desempenho econômico”, finaliza.


Performance hoteleira em destaque no SAHIC

Depois de dados macroeconômicos, foi a vez de números específicos da hotelaria. Patricia Boo assumiu o plenária da SAHIC Latin America & The Caribbean, aberta hoje (27), para mostrar como anda o desempenho do setor na América Latina. No geral, o segmento segue sua acelerada recuperação, inclusive liderando a retomada global em alguns indicadores.

Por exemplo, comparando com outras regiões do planeta, a América Latina e o Caribe já estão muito próximos dos níveis de ocupação em relação a 2019. “É o melhor desempenho do mundo, juntamente com o Oriente Médio”, observou a Area Director Latam da STR. “Os preços nominais (sem correção de inflação) estão muito acima dos níveis pré-pandêmicos. O ritmo continua neste começo do ano, em um processo de recuperação constante. A exceção é o Peru, que está numa retomada mais lenta em função de problemas políticos”, ressaltou.

Patricia apontou o Rio como um dos destaques da região, combinando preços em crescimento e bons níveis de ocupação – e consequentemente de RevPar. “Ao mesmo tempo, os níveis de lucratividade não estão no mesmo patamar que vemos de RevPar e diária média. Inflação e custos de mão de obra pressionam as margens do setor”, acrescentou a executiva da STR.

A retomada do corporativo, grande preocupação logo que a pandemia estourou, segue seu ritmo, como mostraram dados apresentados por Patricia. Segundo ela, entre as principais praças de negócios da América Latina, a ocupação mensal varia entre algo próximo a 60% (São Paulo) a 84% (Montevidéu). “Vemos níveis de ocupação em bom patamar, mas ainda abaixo dos padrões de 2019. Ainda assim, vale citar a colaboração do bleisure, que está esticando a demanda para além da sexta-feira”, pontua.

SAHIC

Pipeline

Hoje, a maior parte dos projetos hoteleiros está no Caribe, mas os números da STR mostram há crescimento na comparação anual em outros países. “Um dado interessante é que dos 21 mil apartamentos assinados no México, 11 mil já estão em construção”, cita Patricia, acrescentando que o Brasil lidera o pipeline na América do Sul, com destaque para a Accor.

“Outra informação muito interessante é que o pipeline previsto na América Latina perpassa diferentes segmentos e categorias de hotéis, sendo bastante diversificado. Então, entendo que isso é muito positivo para o desenvolvimento hoteleiro da região”, finaliza.


Painel de lideranças é ponto alto do 1º dia de SAHIC

No primeiro painel da SAHIC logo após o almoço, líderes de diferentes cadeias hoteleiras internacionais abordaram as perspectivas do mercado e discutiriam possíveis soluções para as principais dores da indústria. Ponto alto para a mediação de Peter Greenberg, editor de Viagens da CBS News, que mostrou profundo conhecimento do setor e tirou os executivos participantes da zona de conforto.

Participaram do painel Thomas Dubaere, CEO da Accor para as Américas – Premium, Midscale & Economy Brands; Laurent De Kousemaeker, Chief Development Officer da Marriott para a América Latina e Caribe; Gustavo Viescas, CEO da Wyndham Hotels & Resorts para América Latina e Caribe; e Greg O’Stean, CEO da Aimbridge Hospitality.

Greenberg começou o painel perguntando sobre ensinamentos da pandemia e o estágio de recuperação do setor. Questionado sobre o tema, Dubaere disse coisas que já havia antecipado em entrevistas anteriores ao Hotelier News. “O mercado hoteleiro voltou mais rápido do que todos esperavam, e a parte positiva é que voltou diferente, com mais oportunidades. Por exemplo: muitos dos nossos hotéis tinham metros quadrados ociosos e identificamos aí uma chance de explorar espaços vazios e gerar receitas novas, além de atrair mais clientes”, comentou.

No caso específico da Marriott, De Kousemaeker citou o sucesso que as branded residences e villas fizeram com os consumidores ao longo desse período de retomada. “O comportamento do consumidor mudou. Percebemos que as pessoas querem mais espaço e ficar mais tempo no destino, e esse tipo de produto atende bem a essa necessidade”, comentou. Instigado por Greenberg se a ideia da Marriott seria “bater de frente” com o Airbnb nesse tipo de mercado, o CDO da gigante norte-americana se saiu bem com a resposta. “É outro modelo de negócio, são contratos muito diferentes”, destacou.

De Kousemaeker acrescentou que outro grande ensinamento foi o alto valor do mercado de lazer para a indústria hoteleira. “Sempre focamos no corporativo ao longo da nossa trajetória. A ascensão do bleisure e essa retomada pós-pandemia puxada pelo lazer mudaram o jogo e nos mostraram como o segmento pode ser um canal de crescimento”, disse o executivo da Marriott, que lembrou os investimentos recentes da empresa no mercado de all inclusive. “Na outras ponta, aprendemos que podemos e devemos ser mais eficientes na operação, e é o que estamos buscando.”

SAHIC - painel

Líderes abordaram perspectivas de mercado em painel da SAHIC

Desafios

Com diferentes marcas perpassando várias categorias e segmentos de hotéis, será que o consumidor sabe que a Fairmont pertence à Accor ou que a Le Meridien integra o portfólio da Marriott? “Isso não confunde a cabeça do cliente”, questionou Greenberg. Para todos os líderes presentes, uma estratégia multimarcas faz todo sentido, até porque os hóspedes têm diferentes necessidades.

“Sim, é muito difícil ter a companhia inteira focada em todas as marcas. Por isso, criamos as duas divisões. Assim, conseguimos ter times especializados para cada um desses segmentos, entregando um atendimento melhor para os investidores. Nosso foco é, independentemente da marca e da segmentação, entregar experiências boas para nossos clientes e os donos dos hotéis”, comentou Dubaere.

Outro desafio são os programas de fidelidade, que, embora tenham papel importante na geração de vendas diretas para as cadeias hoteleiras, vem sendo motivo de frustração dos consumidores. “Sabe quantas milhas não resgatadas existem nos programas de fidelidade de empresas aéreas nos EUA? Simplesmente US$ 34 trilhões. Como resolver isso e engajar os clientes”, questionou o editor da CBS News.

Wyndham, Marriott e Accor seguiram um caminho parecido, explicaram Dubaere, De Kousemaeker e Viescas, o que significou simplificar a maneira como os usuários dos programas resgatam os pontos. “Por exemplo, eles podem usar os pontos a qualquer momento, até mesmo para fazer um upgrade em sua hospedagem assim que realizam o check-in. Outro, é transferir os pontos do nosso programa para experiências em empresas parceiras, como comprar ingressos para o Rock in Rio”, explicou Dubaere.

“O segredo é mostrar ao usuário que se trata muito mais do que simplesmente resgatar pontos. O segredo é criar uma estratégia para engajar os participantes do programa. Experiência é um caminho para engajá-los, mas há outros também”, comentou O’Stean.

Oportunidades

Viescas, em sua fala no painel da SAHIC, focou mais nas oportunidades no mercado latino-americano, questionado por Greenberg como a instabilidade política da região afeta o crescimento das hotelaria nestes mercados. “Venezuela é um caso específico na região, com uma crise política econômica prolongada, mas definitivamente há muitas oportunidades na América Latina em geral. A Colômbia, por exemplo, apresenta uma recuperação da diária média robusta”, comentou.

“Precisamos entender que hotelaria é um negócio de longo prazo. Então, crises acabam passando, elas vêm e acabam em algum momento, e o setor já mostrou inúmeras vezes sua resiliência. Logo, oportunidades de crescer sempre vão existir. Temos unidades na Bolívia e no Paraguai, por exemplo, países com economias menores na região. É questão de encontrar o produto certo para o mercado mais adequado”, acrescentou Viescas.

“É melhor não olhar o noticiário, mas focar de verdade nos dados de performance do setor. As pessoas querem viajar e estão fazendo isso, o que reforça o tamanho da resiliência da nossa indústria. Há riscos econômicos e políticos? Sim, é claro, mas a América Latina sempre conviveu com isso e seguimos investindo apostando na região”, concluiu Viescas no painel da SAHIC.


Agenda financeira de projetos em pauta no SAHIC

Diante do contexto macroeconômico atual, marcado por um ciclo altista das taxas de juros globalmente, um necessário olhar sobre a estruturação de capital para projetos hoteleiros foi tema de uma das mesas-redondas temáticas da SAHIC Latin America & Caribbean. Representantes de diferentes elos da cadeia de desenvolvimento de hotéis participaram do debate, como executivos de agências de fomento, bancos tradicionais, fundos de investimentos e desenvolvedores imobiliários, além de operadoras hoteleiras.

A longa lista de debatedores contou a presença de Cristián Roberts, presidente da Prime e managing partner da Creo Capital; Rogério Basso, Head de Turismo do IDB Invest; Maria Clara Aristizabal, gerente de Negócios de Desenvolvimento Urbano do Grupo Argos; Joan Bertran, Head Comercial Global de Real Estate & Hotels do Banco Sabadell; Mauro Rial, COO da Accor para América do Norte e Países Hispânicos – Premium, Midscale & Economy Brands; Hernando Forero, sócio do Grupo Pegasus; Juan Gonzalo Flores, country manager do IFC no México; Alfonso Pero Costabal, presidente da A3 Property Investment; Daniel Cordova, diretor de Business Investment da PromPeru; e Felipe Iragorri, board member e head advisor de Investimentos da GHL Hotels.

Basso começou a conversa citando que, no contexto atual, a atratividade de projetos que incluem branded residences está elevada. Para ele, empreendimentos estruturado com esse modelo ampliam sua viabilidade por diferentes motivos. “Em toda região, vemos pessoas físicas interessadas em investir em uma segunda moradia. Então, no momento atual de juros mais altos, esse modelo de projeto ajuda a minimizar um pouco o elevado custo do capital”, observou. “Agora, é preciso criatividade, e quando falo isso me refiro à concepção do projeto, que deve mirar diferentes fontes de receita. Não basta ter branded residences”, complementa.

Em linha com Basso e detalhando mais o tema, Rial destacou que, para os desenvolvedores imobiliários, as branded residences representam dinheiro mais barato, mas, sobretudo, adiantamento de caixa. “Dessa forma, em países como Brasil, Argentina e Peru, que historicamente têm problemas de financiamento de longo prazo, o modelo faz bastante sentido, ainda mais no momento atual em que com o mercado de capitais está restrito para emissões de títulos de dívida”, comentou.

Modelos de financiamento

Já para projetos que, mesmo diante dessas circunstâncias, necessitam ir ao mercado de capitais em busca de funding, Joan Bertran disse que há alternativas para se proteger do ciclo de alta dos juros e da inflação. “Colocar um hedge na captação pode ser uma possibilidade e temos feito isso para apoiar os projetos de clientes aqui no Sabadell”, revelou. “Ainda assim, fica uma captação com custo elevado”, acrescentou Basso.

SAHIC - mesa-redonda finance

Debate informal reuniu diferentes elos da cadeia

Por isso, o executivo do IDB Invest ressaltou a importância dos projetos cada vez mais fazerem uso do project finance, modelo de financiamento de longo prazo no qual a dívida gerada pela captação é paga por meio do fluxo de caixa do próprio empreendimento. “Então, os desenvolvedores que vão bater na porta de bancos ou investidores em busca de capital precisam apresentar projetos mais completos e bem estruturados, que estimem com precisão esses recebíveis futuros.”

Diante desse contexto mais desafiador em busca de funding, Hernando Forero revela que uma alternativa analisada pelo Grupo Pegasus, que tem uma mescla de investidores institucionais e family offices na carteira, tem sido investir em hotéis já existentes. “Estamos em uma estratégia um pouco mais asset light, apostando em arrendamentos. Na nossa mira estão projetos hoteleiros lifestyle para aproveitar as maiores oportunidades de geração de receita desses empreendimentos, caso da gastronomia”, destacou.

Apesar de empresas como a Pegasus atuarem na região, ainda há poucos investidores institucionais aportando recursos em projetos hoteleiros no mercado latino-americano. “Temos que admitir isso”, pontuou Cristián Roberts, da Creo Capital. “Como atraí-los? Acho que a palavra é transparência e compliance. Afinal, quem vai investir no que não enxerga?”, finaliza.

(*) Crédito das fotos: Vinicius Medeiros/Hotelier News

(**) Crédito do infográfico: STR