Era uma questão de tempo até que a concorrência começasse a se movimentar em relação ao processo de recuperação judicial da Gol Linhas Aéreas. A empresa, liderada por Celso Ferrer, é uma entre três grandes companhias que detêm a maioria da demanda e oferta do setor aéreo do país. Do outro lado, Latam e Azul podem se beneficiar da crise da concorrente.

No início da semana, advogados da Gol afirmaram que alguns arrendadores receberam cartas da Latam dizendo que “diante dos eventos recentes” (uma clara referência à restrição da concorrência), teriam interesse em discutir a possível locação de 20 a 25 aeronaves Boeing 737, segundo informado pelo Valor.

O modelo 737 é ponto central na estratégia de frota única da Gol. Vale lembrar que a Latam não opera esse tipo de aeronave, o que chamou a atenção da empresa. O grupo chileno possui uma frota de 256 Airbus, utilizado em rotas mais curtas.

A movimentação da Latam vem em um momento em que a Gol tenta negociar seus contratos. A AWG (Aviation Working Group), entidade que reúne fabricantes de aviões e empresas de locação, voltou a destacar que o prazo em que os arrendadores podem começar a buscar aeronaves da Gol se encerra dia 24 de fevereiro.

Na época da reestruturação de dívidas da Azul com arrendadores concluída no ano passado, fontes destacaram que a Latam chegou a fazer o mesmo movimento para tirar aeronaves Airbus da concorrente em conversas.

Em nota, a Latam informou que está há meses em busca de aeronaves para reforçar sua oferta perante a crescente demanda por viagens. “O grupo Latam está em contato permanente com todas as partes interessadas relevantes em matéria de frota (arrendadores e fornecedores de equipamentos e manutenção) como parte de seu negócio. A companhia está ativa no mercado há vários meses com o objetivo de garantir a capacidade necessária para atender às necessidades contínuas e de longo prazo no contexto dos desafios globais da cadeia de suprimentos e da falta de aeronaves/motores”.

Contragolpe da Gol

Em contrapartida, a Gol estuda medidas para proteger suas aeronaves. Pelo fato da Latam não operar o modelo 737, advogados da companhia enxergam a iniciativa do grupo chileno como uma tentativa de interferir ilegalmente na reestruturação da concorrente.

De acordo com o Valor, Andre LeBlanc, da Milbank, em conversa com o juiz Martin Glenn, destacou que existem artigos na legislação norte-americana que impediriam a Latam de seguir com tais abordagens.

Possíveis desdobramentos

A Bloomberg Línea apontou possíveis fatores de desenvolvimento da recuperação judicial da Gol. A crise da companhia pode beneficiar outras concorrentes, como a Azul. De acordo com dados da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), a Latam encerrou 2023 na liderança do mercado doméstico com 37,8% de participação, seguida pela Gol (33,3%) e Azul (28,4%).

Stephen Trent, analista de Transporte do Citi, sediado em Nova York, avalia que a Latam possui mais sobreposição com a Gol em termos de rota do que a Azul. “Se a Gol hipoteticamente fosse tirada de muitas dessas rotas e a Latam se tornasse a única operadora em trajetos de alta densidade, é possível dizer que as autoridades antitruste vão querer ver pelo menos uma outra companhia aérea prestando serviço nessas rotas”, explica. “Isso implica que a Azul pode ter oportunidades de expansão”.

(*) Crédito da foto: Divulgação/Gol Linhas Aéreas