Ao longo desses mais de 25 anos de carreira, já estive gerenciando hotéis, condo-hotéis e apart-hotéis para muitos investidores e administradoras. Por isso, posso dizer com tranquilidade que, assim como outras centenas de profissionais que já estiveram nessa mesma posição, essa relação entre administradora e o(s) investidor(es) é, na maioria das vezes, conflituosa e desgastante.

E sabe por quê? Porque praticamente todo relacionamento que envolve dinheiro, lucratividade, necessidade de valorização, independentemente de que tipo for, envolverá conflitos potenciais. Não tem jeito, não tem para onde fugir. Ainda assim, no caso da hotelaria, a formatação e a estruturação da modelagem do negócio contribuem para um desgaste maior entre as partes.

Para desenvolver melhor essa linha de raciocínio, arrisco-me a fazer uma analogia entre condo-hotéis e apart-hotéis com os clubes de futebol. Na sua grande maioria, os três têm seus representantes legais e conselhos alterando a cada dois anos. E, pode acreditar, não existe negócio hoteleiro no mundo que aceite tantas mudanças de estratégias, posições e opiniões nesse intervalo de tempo.

Fora isso, de um lado ou de outro (condomínios ou clubes de futebol), faltam profissionais com experiência administrativa e com conhecimento genuíno do negócio. No caso da hotelaria, os conselhos de condomínios e das SCPs (Sociedade em Conta de Participação), na sua grande maioria, olham esse produto imobiliário como se um simples condomínio residencial fosse, o que não é verdadeiro.

Acredito que essa talvez pode ser a grande dificuldade de uma administradora para um caminho mais sólido dentro das melhores práticas de gestão hoteleira. Mais ainda, penso que talvez essa situação tenha acabado se transformando no melhor álibi para as operadoras se justificarem pelo insucesso do empreendimento e não se dedicarem na busca por uma administração mais transparente e com ações mais assertivas em prol do negócio hoteleiro.

Mateus Cabau

A empresa de Cabau faz atualmente a gestão do Comfort Santos, em Santos (SP)

 

Em relação aos hotéis patrimoniais, mesmo considerando que a maioria dos investidores não tem no empreendimento hoteleiro sua principal atividade, entendo que a relação costuma ser menos turbulenta, mais empresarial e, potencialmente, mais longa e duradora.

Outro importante alerta que faço, independentemente do perfil da propriedade (condo-hotel ou patrimonial), a interferência direta do investidor nas atividades operacionais cotidianas do hotel não é recomendada. Ao mesmo tempo, o investidor / proprietário não deve também se apartar do seu investimento, passando unicamente a aprovar ou não orçamentos. Não é isso que quero dizer.

Dessa forma, para colaborar na busca de uma relação longa e duradora entre investidor e administrador, a contratação de uma empresa de auditoria contábil independente e de uma empresa para relatórios técnicos de manutenção é de grande valia.

Afinal, tão ou mais importante quanto ter números confiáveis e bons resultados é a realização de um bom trabalho de manutenção predial, que proporcionará a perpetuidade do negócio imobiliário hoteleiro. Inclusive, é esse caminho que sigo na minha empresa e é assim também que está sendo pautada minha relação com esse empreendimento patrimonial que tenho o privilégio de administrar nesses últimos 18 meses, o Comfort Santos.

Outro tópico que considero importante nessa relação é o seguinte: para mim, o hóspede é o cliente do hotel, enquanto o investidor e a propriedade em si formam a clientela da administradora. Mais ainda, entendo que é vital para o gestor hoteleiro ter isso bem claro em sua mente. São stakeholders diferentes, mas ambos vitais para o negócio, obviamente.

Sempre recomendo também que o investidor vá se hospedar um dia no seu próprio hotel. Se não quiser fazer isso, posso te garantir que, com a internet, hoje está muito fácil averiguar se o empreendimento está bem gerido e cuidado. Plataformas como Booking.com e TripAdvisor permitem saber como o hotel está avaliado pelo consumidor em poucos cliques. Ou seja, o investidor tem acesso rápido e instantâneo sobre a reputação do empreendimento do ponto de vista de quem se hospeda.

Então, para finalizar, a mensagem final: sim, operadoras levam expertise e práticas mais profissionais à gestão de hotéis. Agora, trata-se de um mercado novo. Os primeiros condo-hotéis, por exemplo, datam do final dos anos 1990. Ou seja, ainda vivemos uma curva de aprendizado (das duas partes) nesta relação e na entrega final propriamente dita.

Por isso, acredito que pequenas administradoras hoteleiras como a minha têm um importante mercado para atuar no Brasil. Digo isso porque existem bons produtos hoteleiros patrimoniais a procura de gestoras que entregam um trabalho personalizado, quase que exclusivo, proporcionando uma relação muito próxima com a equipe do hotel e, principalmente, o investidor. No fim da linha, forma-se uma equação mais fácil de fechar, com administradores e proprietários imbuídos em interesses e necessidades comuns.

Com mais de 20 anos de experiência em gestão hoteleira, Mateus Cabau acumula passagens por Marriot e Atlantica Hotels. Em 2013, mudou-se para os EUA, onde, entre outros projetos e posições profissionais, atuou como co-desenvolvedor da primeira unidade da Red Collection: o Spot X, que fica na região de Lake Buena Vista, em Orlando. Atualmente, por meio de sua empresa brasileira de consultoria, é responsável pela gestão da franquia do Comfort Hotel Santos, em Santos (SP). Cabau ainda realiza palestras e consultorias para hotéis.

(*) Crédito da capa: Arquivo pessoal