O centenário será celebrado em agosto, mas o presente para o Rio de Janeiro, para a hotelaria carioca e, claro, para os hóspedes, só chega no ano que vem. Ícone arquitetônico da cidade, o Belmond Copacabana Palace prepara uma grande renovação, e não estamos falando da cuidadosa reforma de sua fachada histórica que está atualmente em curso. Pelo que apurou a reportagem do Hotelier News, as novidades que estão sendo preparadas deverão reposicionar a já muito bem posicionada propriedade no mercado de luxo carioca e brasileiro. O plano é unir o atendimento impecável do bem treinado time do empreendimento com uma infraestrutura chique, luxuosa e, claro, instagramável. Então, vamos ao que interessa!

Centenário - exemplo piscina na varanda

Exemplo do que pode ser feito no Anexo

Inaugurado em 1948, o edifício Anexo será fechado no ano que vem para uma ampla e completa renovação. Com as obras, o número de quartos será reduzido no prédio, com a junção de algumas dessas UHs para criação de penthouses. Apesar do desafio de engenharia existente, estuda-se também a construção de piscinas nas varandas dos apartamentos frente mar (a exemplo da foto ao lado), mas muito mais sofisticadas, garantem as fontes ouvidas.

Com isso, o clássico restaurante Cipriani, que fica no andar térreo do Anexo, também terá sua operação paralisada por um período não confirmado pela reportagem. Em relação ao projeto como um todo, a expectativa é que as intervenções se prolonguem até 2026. No período, obviamente, o inventário do Belmond Copacabana Palace cairá dos atuais 220 para 160 apartamentos, todos concentrados no edifício principal.

Procurada, a Belmond negou a informação, mas a reportagem do Hotelier News confirmou com fontes de fora e de dentro do hotel a notícia. Inclusive, pelo que foi apurado, a administração do Copacabana Palace – liderada por Ulisses Marreiros – já está em posse dos recursos para tocar a renovação, que será bancada pela LVMH, maior conglomerado global do segmento de luxo, que comprou a Belmond por US$ 3,2 bilhões em 2018. Abaixo a nota enviada pela assessoria da rede hoteleira:


“O Copacabana Palace está permanentemente avaliando possibilidades de modernização de sua estrutura. Neste momento, a prioridade do hotel é a obra de reestruturação da fachada, que preservará elementos originais de sua construção, em 1923. Nenhum outro projeto está definido ou sequer confirmado, inclusive porque quaisquer intervenções a serem realizadas na estrutura do hotel necessitam da aprovação prévia do Patrimônio Histórico Nacional.”


O Belmond Copacabana Palace é tombado tanto pelo Iphan (Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional), quanto pelo Inepac (Instituto Estadual do Patrimônio Cultural), que é vinculado ao Secec-RJ (Secretaria Estadual de Cultura e Economia Criativa do Rio de Janeiro). Ocorre que, por ter características arquitetônicas diferentes do edifício principal (inaugurado em 1923), o Anexo não é tombado, segundo informações do Inepac. Mesmo assim, qualquer pedido de realização de obras que envolva bens edificados tombados e nas respectivas áreas de entorno precisa passar por escrutínio dos dois órgãos. Agora, nada é tão complexo como a nota tenta indicar.

De acordo com o artigo 16 da portaria Nº 420 do Iphan, que dispõe sobre os procedimentos a serem observados para a concessão de autorização para realização de intervenções, uma vez protocolado o requerimento, o órgão terá o prazo de 45 dias para concluir a análise e disponibilizar a decisão ao requerente. Caso ajustes sejam solicitados no projeto, o instituto terá mais 45 dias para concluir sua avaliação, a partir do momento que o novo protocolo chegar. Ou seja, a administração do Belmond Copacabana Palace tem tempo de sobra para apresentar a solicitação antes do fim de 2023 para deixar tudo pronto para começar as obras em 2024.

História e curiosidades

No auge das transformações pelas quais passavam o bairro na virada dos anos 1940/1950, o Copacabana Palace vibrava como o centro nervoso dessa região em ebulição. Passagem do livro Copacabana Palace: um hotel e sua história, escrito pelo finado jornalista Ricardo Boechat como parte das comemorações dos 80 anos da propriedade, conta que, diante da alta demanda, o Copa se via obrigado a recusar hospedagens por falta de acomodações.

Centenário - reforma da fachada

Fachada do prédio principal está sendo restaurada

“Octavio Guinle (fundador do hotel) decidiu então ampliá-lo, construindo um anexo de onze andares no terreno ocupado pelas quadras de tênis. As obras se iniciaram em 1946. Inaugurado dois anos depois, o Anexo se caracterizava por oferecer exclusivamente apartamentos com quarto e sala”, escreve Boechat.

“Para frustração dos preservacionistas, o projeto não copiou a arquitetura neoclássica do hotel. Ao contrário: modificou-lhe as linhas externas para aproximá-las do estilo contemporâneo que surgia. A opção pelo novo, mais que estática a funcional, era motivada pelo desejo de atualidade, conforme exigia a fervilhante Copacabana do pós-guerra”, continua.

A obra de Boechat conta ainda algumas curiosidades, dizendo que, com o Anexo e seu novo jeito de hospedar, “surgiram várias histórias que não tem sentido buscar versões precisas”. “Não foram poucos os misteriosos encontros vividos no Anexo, logo transformado em fonte de um inesgotável folclore de amores proibidos, aventuras inconfessáveis e traições ilustres”, diz um trecho. O jornalista revela ainda que o edifício contava com caminhos secretos que, cortando cozinhas, depósitos, pátios internos e corredores pouco iluminados, permitiam “a entrada e saída de senhoras que não podiam ser vistas”.

A despeito dessa visão mundana sobre o novo edifício, o Anexo desempenhou também um papel político vital até a construção de Brasília, conta o livro de Boechat. Isso porque o Copa dividia com o Palácio do Catete – então sede do governo na antiga capital – a condição de grande ninho de tramas políticas nacionais. “O restaurante Bife de Ouro, seu bar e o Anexo formaram naquela época um triângulo onde segredos de Estado, acertos partidários e conspirações golpistas estavam na ordem do dia ou, mais ainda, da madrugada.”

“Em 1955, por exemplo, uma dessas muitas articulações ajudou a depor o presidente Carlos Luz e anular o golpe de Estado que impediria a posse de Juscelino Kubitschek, o sucessor eleito. O deputado Vítor Issler residia então na suíte 53 do Anexo. Na noite de 10 de novembro, dois coronéis e um grupo de congressistas ligados a Kubitschek redigiram ali a moção de impeachment que, na manhã seguinte, destituiria Luz da presidência da República por encontrar-se em ‘lugar incerto e não sabido’. Seu paradeiro, entretanto, era de conhecimento geral. Com apoio da Marinha, ele e vários aliados haviam embarcado no cruzador Tamandaré e estavam a caminho de Santos para rearticular forças e iniciar uma reação”, conta o livro.

“O plano foi frustrado quando o navio recebeu ‘tiros de advertência’ do Forte de Copacabana, fiel às ordens do ministro da Guerra, marechal Teixeira Lott, que Luz tentara demitir na véspera. Da varanda do Copacabana Palace, repleta de hóspedes curiosos, os garçons que haviam servido café e bebida aos participantes do encontro no apartamento de Issler puderam acompanhar, tapando os ouvidos, os disparos dos projéteis de 305 milímetros da fortaleza”, continua.

Ou seja, o Copacabana Palace tem muita história. O Anexo tem muita história. A partir de 2024, com as obras de renovação, começa um novo capítulo desse ícone (histórico, arquitetônico, turístico e hoteleiro) da Cidade Maravilhosa.

* Colaborou Nayara Matteis       

(*) Crédito da capa: Divulgação/Belmond Copacabana Palace

(**) Crédito da foto: Divulgação/Essenza Hotel

(***) Crédito da foto: Márcia Foletto/O Globo