* O jornalista viaja a convite da organização do Adit Share

Como as lideranças enxergam o futuro do setor?

Uma visão de futuro sobre o setor de viagens compartilhadas, mas a partir do olhar de lideranças do segmento, foi o foco da plenária que marcou a volta do almoço na Adit Share 2023, aberta hoje (17). Participaram do painel Gustavo Rezende, CEO do GR Group; Alessandro Cunha, CEO da Aviva; e Manoel Vicente, sócio e presidente da GAV Resorts. Vice-presidente de Desenvolvimento de Negócios da Wyndham Hotels & Resorts para América Latina, Maria Carolina Pinheiro mediou o debate.

O painel teve um formato diferente dos anteriores, com uma série de convidados enviando vídeos com perguntas às lideranças participantes. Atração e retenção de talentos, lições e aprendizados do mercado, plano de expansão, evolução das práticas comerciais e sustentabilidade foram alguns dos assuntos abordados pelos profissionais que enviaram as questões, entre eles nosso editor-chefe Vinicius Medeiros.

Base de clientes:

  • Aviva: 33 mil
  • GR Group: 40 mil
  • GAV Resorts: 55 mil

Veja abaixo os melhores momentos do painel:

Por que o segmento cresceu no Brasil?

Rezende trouxe a histórica dificuldade de funding no mercado imobiliário-turístico brasileiro. “A lei veio anos depois para pavimentar e regulamentar o segmento, mas sem o arrojo e inovação dos empreendedores brasileiros, o setor não teria se desenvolvido tanto. Para nós, portanto, foi uma oportunidade grande para avançar e desbravar esse oceano azul, fomentando ainda o turismo em diferentes destinos”, comentou o CEO do GR Group.

Já Cunha relembrou que a introdução do mercado de viagens compartilhadas começou em Rio Quente Resort, em 1999. “Essa nossa inquietude em estudar novos modelos de negócios nos trouxe até aqui enquanto empresa. Hoje, para nós, as viagens compartilhadas representam um mercado de R$ 1 bilhão. Erramos muito ao longo do tempo, mas aprendemos que o maior gargalo está na governança. Isso porque os recursos chegam antes da entrega do produto e, sem gestão eficiente, problemas podem aparecer lá na frente”, comentou.

Atração e retenção de talentos

Para Aviva, que tem 4 mil funcionários, o grande ponto em favor da empresa é sua cultura organizacional, comentou Cunha. “Só quem está lá pode entender. Conseguimos construir uma cultura de muita liberdade, mas com suporte. Por meio disso, eles podem inovar com segurança de poder errar, o que leva a um desenvolvimento profissional mais acelerado. Agora, temos ferramentas de atração e retenção, como avaliação de desempenho anual e programas de capacitação, entre outras iniciativas, que ajuda na atração e retenção de profissionais. No fundo, contudo, é nossa cultura organizacional que faz a diferença”, comentou Cunha.

maria carolina pinheiro

Maria Carolina Pinheiro foi a mediadora do debate

Práticas comerciais

Quem nunca foi abordado por vendedores de programas de timeshare? Aquela abordagem agressiva ou mesmo a ânsia por venda a qualquer custo geram não só desconforto com o cliente, mas muitos distratos. Então, o que deu errado? Quais os principais ensinamentos neste sentido? Segundo Rezende, um aprendizado relevante foi não ouvir o cliente no início dessa jornada.

“Além disso, prometíamos rendimento, só que estamos, na verdade, vendendo férias. Outra coisa importante foi entender que o nível de conversão é muito mais baixo em salas de venda de rua afastadas do empreendimento”, explicou Rezende. “Ao mesmo tempo, o perfil do consumidor mudou bastante e, gradualmente, vamos nos ajustando a esse novo tipo de cliente. Agora, nossa mudança principal foi realmente colocar o cliente no centro, sem ter um foco exclusivo em bater meta de vendas. É vender o produto correto para atender às necessidades do cliente”, continuou.

Já Vicente disse que errar ao longo dessa caminhada era inexorável. “Agora, depois de tanto tempo e projetos entregues, sabemos que a grande questão é entregar o melhor produto possível. É isso que garante uma boa experiência aos nossos clientes, sendo a receita para reduzir os distratos. A sustentabilidade dos projetos envolve um ecossistema amplo de coisas, mas a entrega final e a qualidade do empreendimento são questões vitais.”

Funding

Questionado pelo nosso editor-chefe sobre as condições de acesso atuais ao mercado de capitais para emissão de títulos de dívida como CRIs (Certificados de Recebíveis Imobiliários) e se esse cenário poderia desacelerar o crescimento do mercado de multipropriedade nos próximos anos, os três executivos disseram que grupos com boa governança seguiram avançando.  

“No GR Group, ao longo de todos esse anos, emitimos CRIs para empreendimentos específicos. Nunca tivemos problemas. Agora, já aprendemos que fazer emissão para projetos com um número gigantesco de unidades no mesmo empreendimento talvez não faça sentido”, comentou Rezende. “Além disso, quando vemos 80 destinos mapeados no estudo setorial do Caio Calfat, acredito que há muitas propriedades menores. Para nós, escala e velocidade guiam nossa direção, mas não tem certo e errado. É importante analisar bem os projetos e, sobretudo, formatá-los de forma adequada para assumir essa dívida”, acrescentou.

Já Vicente disse que a GAV Resorts deu início aos seus projetos com recursos próprios. Posteriormente, emitiu um CRI e uma Nota Comercial (outro título de dívida) para projetos já entregues, o que reduz o risco dessa captação. “Então, nossa recomendação é que os desenvolvedores estudem bastante as condições antes de assumir esse endividamento. Na GAV, por exemplo, limitamos, a valor presente, a dívida a 8% dos recebíveis. Agora, se tiver problemas de venda, não há dinheiro que resolva”, complementou.

Já Cunha fez questão de ressaltar que o problema não está no modelo de negocio, mas na gestão de quem assumiu essas dívidas. “Hoje, a dívida liquida da Aviva é negativa. Mais ainda, nosso programa de timeshare foi essencial durante a pandemia. Agora, ressalto, governança é fundamental. Não pode errar na formação de preço, por exemplo. O problema não é emitir um CRI. No fim da linha, acho que os grandes players do setor vão continuar crescendo assumindo endividamento. Na verdade, levando em conta as condições de funding atuais, espero que reduza a irresponsabilidade no nosso mercado”, finaliza.


Desafios da operação hoteleira-condominial em destaque

Como mostra o estudo Cenário de Multipropriedades no Brasil 2023, só no ano passado mais de 20 empreendimentos de multipropriedade entraram em operação no país. Este cenário abre muitas oportunidades para operadoras hoteleiras se inserirem neste mercado. Agora, se gerir condo-hotéis já é uma tarefa complexa, imagine ter que lidar com milhares de proprietários? Pois é exatamente sobre isso que o painel Desafios de uma operação hoteleira-condominial discutiu.

Participam do painel Alexandre Zubaran, CEO da Enjoy Hotéis & Resorts; Armando Ramirez, diretor de Desenvolvimento de Negócios para o Cone Sul da Wyndham Hotels & Resorts; e Rafael Delgado, head de Operações e Implantação da Livá Hotéis, com mediação de André Bekerman, fundador da Trul Hotéis.

Logo no começo do debate, Zubaran destacou que, independentemente do elevado número de proprietários (50 mil famílias no caso da Enjoy), a oferta de multipropriedade hoje em funcionamento no país envolve um grande volume de UHs, o que naturalmente demanda uma operação complexa e custosa para a operadora.

“Então, isso dá a dimensão do desafio de gestão das operadoras nos empreendimentos”, ressalta. “Ainda assim, continuo achando que é um modelo de negócio vitorioso, e o setor vem amadurecendo e se adaptando às mudanças do comportamento do consumidor e do mercado. É uma jornada de aprendizado contínua para o setor seguir avançando”, completa.

Na visão do CEO da Enjoy, o desafio de gestão diminui se o projeto for efetivamente concebido para o cliente certo, com fit exato com o mercado onde está localizada a propriedade. “Precisamos aprimorar o empreendimento para o consumidor que está comprando, não balizá-lo pelo número de semanas mirando um VGV (Valor Geral de Vendas) mais alto. No fim da linha, não se pode normalizar o distrato, embora ele faça parte do modelo de negócio”, disse Zubaran.

Ramirez concordou com a visão de Zubaran, acrescentando outro fator relevante. “O produto tem que entregar a experiência que se promete da sala de vendas. Se isso não ocorre, naturalmente o distrato cresce. Já passamos por isso em outros projetos geridos pela Wyndham, e procuramos orientar nossos clientes neste sentido. Se há cancelamentos maiores do que o estimado, pode haver impacto na conclusão da obra, por exemplo. Então, este é um ponto que merece bastante atenção”, destacou.

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Executivos debateram os desafios da gestão hoteleira-condominia

Veja abaixo outras questões debatidas no painel:

Melhor momento para a operadora entrar?

Na avaliação de Delgado, quanto mais cedo melhor. “Isso porque podemos contribuir na formação e concepção do produto”, disse o executivo da Livá, que deu um exemplo prático. “A depender do dia de semana estabelecido para o check-in dos condôminos, pode haver impacto na escala dos colaboradores, por exemplo, aumentando os custos. Enfim, entrar no começo possibilita formatar o produto e gerar economias perenes, pois não podemos esquecer que operação nunca vai acabar”, completou.

Comunicação com proprietários?

Ramirez comentou que, no Wyndham Gramado, a empresa criou um jornal mensal. “Temos que cuidar do nosso condômino sempre, fazer com que ele, que ainda está pagando a incorporação, não cancele. Então, comunicação é vital. No nosso jornal, além de dizer o que está acontecendo no condomínio, destacamos acontecimentos das cidade que podem interessá-los”.

“Obviamente, há também prestação de contas dos resultados do hotel, mostrando dados de ocupação, custos fixos e variáveis… Enfim, como prestadores se serviço e uma empresa de capital aberto, temos que buscar a maior transparências possível”, continuou Ramirez.   

Já Delgado fez uma contribuição interessante. “Acredito muito na tecnologia. Há um desafio de atender a todos os proprietários na nossa central de serviços aos proprietários. No entanto, e aí pensando nos resultados finais do empreendimento, recomendo fazer isso com o custo mais baixo possível, e aí que entra a inovação”, comentou.

Indicadores

Agora, os três participantes foram unânimes em um ponto: não é possível tocar bem a operação e a relação com os condôminos sem medir os resultados das diferentes ações implementadas. Agora, quais são esses KPIs?

Delgado conta que a Livá busca ir além dos indicadores tradicionais da hotelaria. “Gostamos de medir principalmente coisas que podem gerar cancelamentos. Após primeiro uso, por exemplo, qual a porcentagem de distratos? Será que poderíamos ter evitado de alguma forma?”, indicou.

Enfim, como bem disse Zubaran no painel, os distratos não podem ser normalizados.


México e seus ensinamentos valiosos para o Brasil

Logo após a abertura do Adit Share 2023 e apresentação do estudo Cenário de Multipropriedades no Brasil 2023, a programação seguiu com o painel Propriedades de férias e lições do mercado mexicano, que contou com a participação de Francisco Costa Neto (Beta Advisory) e Gerardo Rioseco, vice-presidente de Vacation Properties do Grupo Posadas.

É inegável que, na comparação com o Brasil, o mercado mexicano de viagens compartilhadas está alguns passos à frente. Dados da RCI, por exemplo, mostram que o país concentrou parte expressiva dos US$ 10 bilhões movimentados em vendas de timeshare na América Latina no ano passado. Por isso, Rioseco veio à Adit Share para compartilhar boas práticas e tendências observadas por lá.

O executivo iniciou o painel fazendo um breve histórico da indústria de hospitalidade no México e como o timeshare ganhou escala no país. E a explicação é simples: a legislação mexicana proibia os estrangeiros de adquirirem imóveis, o que naturalmente levou o mercado local para o modelo de direito de uso. “Esse contexto, e dado o grande número de norte-americanos que visitam o México, facilitou e acelerou a atração de marcas de grandes operadoras hoteleiras internacionais para os empreendimentos construídos nas zonas turísticas, caso de Cancún”, relembrou.

Ele citou também a mudança, ao longo dos anos, do perfil dos consumidores que compram as semanas dos programas ofertados pela indústria de timeshare no México. “Certo é que, hoje, há milhões de clientes em potencial e, para atraí-los, adaptamos também os processos comerciais ao longo dos anos. Hoje, temos um modelo mais intuitivo, centrado no consumidor, que oferece mais flexibilidade e transparência do que no passado”, comentou Rioseco.

Adit-share-cobertura

Costa Neto debateu os ensinamentos do mercado mexicano

Apesar de destacar os estragos proporcionados pela pandemia no setor, Rioseco disse que a crise sanitária acelerou novas tendências no mercado de timeshare, entre elas a transformação digital. “Outra tendência são os resorts all inclusive, que ofertam uma experiência com um fit grande com as necessidades desse novo perfil de consumidor. Isso, somado ao entretenimento e aos atrativos turísticos do país, tem mantido a atratividade do setor, seja para os clientes finais ou para desenvolvedores imobiliários”, explicou.

Para encerrar, o executivo do Grupo Posadas deixou alguns pontos-chaves para o avanço da indústria:

  • Comunicação permanente com os clientes, equipes e parceiros;
  • Melhora nos processos comerciais, que devem estar centrados nos clientes;
  • Foco no produto: sempre unir com entretenimento para o consumidor melhor entender o valor da experiência;
  • Capitalizar as próprias forcas competitivas: ter compreensão exata dos diferenciais da marca e explorá-los para atrair e fidelizar clientes;
  • Estabelecer alianças: há grandes oportunidades para todos os players.

(*) Crédito das fotos: Vinicius Medeiros/Hotelier News