Em qualquer situação em que existe um contrato, ou uma relação jurídica qualquer, sempre há espaço para conflito.

Quando se fala de relações hoteleiras, dependendo do tipo de disputa e da natureza do problema, o caminho para resolução será diferente, e vale a pena refletir um pouco sobre qual a alternativa que melhor funciona para cada um dos casos.

A relação entre um hóspede e o hotel normalmente será regulada pelo Código de Defesa do Consumidor, e estará sujeita à competência jurisdicional conforme regras do Código de Processo Civil e leis correlatas. Assim, para o hotel, fora buscar cumprir sempre as normas legais e regular, com detalhes, os casos que possam dar espaço para normas (como regulamento de uso de piscina ou academia de ginástica, termos de responsabilidade pelo uso de cofre, entre outros), não há muita discussão: o conflito vai ser sanado perante o PROCON ou o Poder Judiciário. O mesmo se aplica em relações trabalhistas ou tributárias: havendo disputa, a resolução se dará por meio administrativo ou nas cortes especializadas.

Agora, com relação às relações entre operador/bandeira e proprietário(s), a forma de resolução habitualmente estará prevista em contrato.

Historicamente, as bandeiras estrangeiras traziam a seguinte forma de solução: as questões técnicas/contábeis levavam-se a um perito e questionamentos mais complexos e jurídicos, à arbitragem.

Pois bem, mas vale pensar um pouco além. Depois de 20 anos revisando contratos de licenciamento de marca, administração, arrendamento e franquia hoteleiras, existem algumas considerações que acho que valem ser divididas:

Notificação e Negociação – Parece simples: busque um acordo antes de levar a disputa adiante. Mas saibam que uma cláusula expressa determinando que as partes façam notificações por escrito e busquem um acordo antes de escalonar a questão pode render bons frutos.
Isso porque determina-se um prazo, em que as partes devem trazer os responsáveis para analisar e buscar discutir os pontos de conflito, o que, por vezes, poderia não vir a acontecer na ausência de determinação expressa. Pelo sim pelo não, vale a pena incluir tal disposição.

Mediação – Essa opção alternativa de resolução de disputa vem ganhando espaço nas relações patrimoniais.
Enquanto em um primeiro momento a escolha de uma parte neutra acabou sendo bastante relacionada à conciliação, obrigatória nos juizados especiais e recomendada pela justiça, ou em casos de família, hoje este caminho vem-se mostrando cada vez mais interessante, visto que permite um grau de autocomposição quando a solução por negociação direta não foi alcançada.
Com um mediador, as partes ainda têm a possibilidade de juntas solucionar o problema e de certa forma preservar a relação. Os profissionais da mediação, por outro lado, estão mais experientes na área de direito imobiliário e relações empresariais, o que a torna uma opção recorrente e crescente no mercado.

Perícia – É inegável que existem questões técnicas, seja pela contabilidade própria, pela natureza em si da questão operacional, que demandam o know-how diferenciado e específico de um perito.Pois bem, se, tanto no Judiciário quanto na arbitragem, pontos técnicos vão exigir perícia e possivelmente assistentes técnicos, sendo possível ambas as partes acordarem com a contratação de um único expert para analisar o caso antes escalonar o conflito às cortes judiciais ou arbitrais, por que não se utilizar de tal opção?

A perícia, como antes mencionado, há décadas vem sendo uma opção presente em contratos com bandeiras internacionais e tem sua razão de ser. Há câmaras especializadas em resoluções de disputa que contam com um quadro de peritos, com expertises diferenciadas. Vale conhecer e acompanhar.

Entretanto, há bandeiras que acabam preferindo a arbitragem, como veremos a seguir.

Arbitragem – A arbitragem ainda é a forma alternativa de resolução de disputa mais comum em conflitos empresariais. Seja pela confidencialidade, pela qualidade dos laudos e pela relativa redução do tempo envolvido com o procedimento, é inegável se tratar da solução majoritariamente presente nos contratos entre bandeiras e proprietários.

Entretanto, ainda há alguns pontos que merecem trazer à discussão.

Uma opção, que veio a ser costumeira nos contratos hoteleiros, foi a disciplina das regras de arbitragem conforme o grau de complexidade – em especial quando não se contempla a opção de perícia para questões técnicas. Temas mais complicados ou que envolvam valores maiores contemplariam três árbitros, enquanto os mais simples poderiam ser confiados a um único árbitro.

Também é útil prever se poderão ocorrer a consolidação de procedimentos em caso de várias arbitragens concomitantes.

Câmara arbitral

Mas, vale periodicamente refletir sobre a escolha da Câmara Arbitral, sempre sem deixar de considerar os custos envolvidos com a arbitragem, que usualmente se figuram mais elevados dos que os demais meios de solução alternativa de conflitos.

Percebe-se a criação de novas câmaras que podem vir a se tornar opções interessantes. A CAMES (Câmara de Mediação e Arbitragem Especializada), por exemplo, inaugurou um núcleo de árbitros especializados em direito imobiliário e viu-se, há pouco tempo, a criação da CEMAI (Câmara Especializada em Mediação e Arbitragem Imobiliária) – câmara com expertise também em mediações e arbitragens no ramo do direito imobiliário.

Ainda é cedo para ter uma perspectiva mais ampla de tais novas câmaras e núcleos, mas certamente é uma novidade a ser acompanhada.

Até porque se há que haver briga, não necessariamente há que se ter muitos aborrecimentos. Estabelecer, com antecedência, as formas de resolução pode ser um meio de reduzir as dores do conflito.

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Já leu o artigo anterior da Ana… Como fica o meu Flat?

Ana Beatriz é sócia do Perez & Barros Advogados, Masters of Laws pela New York University, Presidente da Comissão de Hotelaria e Multipropriedade do IBRADIM e Membro da Comissão de Direito Urbanístico e Imobiliário da OAB/RJ. Professora dos Cursos de Pós-graduação da CEPED/UERJ, PUC/RJ e ABADI.

(*) Crédito da foto: arquivo pessoal