Como consequência da disparada de preços e redução no número de imóveis no mercado, o governo de Lisboa, em Portugal, enfrenta plataformas de aluguel por temporada. A decisão, aprovada pela Assembleia Municipal, suspendeu temporariamente autorizações para novas unidades da modalidade, como o Airbnb, em 14 das 24 freguesias da cidade.

Segundo Carlos Moedas, prefeito da capital portuguesa, a medida é muito negativa para o turismo e empreendedorismo da cidade. ‘Como assim autorizações?’ Você deve estar se perguntando. Na legislação portuguesa, os municípios podem exigir que os proprietários obtenham licenças especiais para a operação de unidades de alojamento local, forma como é chamado aluguel por curta temporada no país. Com a decisão, Lisboa deixou de conceder o documento em abril.

A suspensão vale apenas para regiões em que a proporção de unidades em aluguel por temporada supera os 2,5% do total de habitações, abrangendo basicamente todos os bairros mais valorizados. A medida, que tem validade de seis meses com possibilidade de renovação por igual período, tem como objetivo responder à crise habitacional na capital portuguesa.

Segundo dados da consultoria especializada Confidencial Imobiliário, o preço de venda dos imóveis aumentou 13,5% no primeiro trimestre de 2022, em comparação ao mesmo período de 2021. Levantamento recente do Instituto Nacional de Estatística, referentes ao terceiro trimestre de 2021, indica que o preço dos imóveis chegou a um patamar nunca antes visto, com o valor mediano de 3,6 mil euros (cerca de R$ 18,4 mil) por metro quadrado. Fora isso, o mercado português vem observando redução gradual na oferta de imóveis para venda e aluguel.

Não é a primeira vez que o governo de Lisboa tenta limitar a oferta de aluguéis por temporada na cidade. Em 2018, a Câmara Municipal (equivalente à Prefeitura) criou as chamadas zonas de contenção: bairros com maior proporção de casas na modalidade ficam proibidos de emitir novas licenças.

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Airbnb: com decisão, atuação da plataforma na capital portuguesa fica limitada

 

Segundo o estudo O Mercado Imobiliário em Portugal, coordenado pelo economista Paulo Rodrigues, a medida reduziu em 9% o preço das casas nessas regiões. Por outro lado, o número de imóveis vendidos nessas zonas caiu cerca de 20%.

Também não é a primeira vez que o Airbnb sofre derrotas em mercados europeus. Recentemente, a Espanha implementou regras que atingiram em cheio a plataforma de aluguéis por temporada. Pouco tempo depois, o TJUE (Tribunal de Justiça da União Europeia) ratificou a obrigatoriedade desta e outras empresas do tipo comunicarem as transações efetuadas aos órgãos fiscais nacionais.

Decisão tardia

Para Ana Gago, pesquisadora do Instituto de Geografia e Ordenamento do Território da Universidade de Lisboa, o poder público demorou para agir. “Começou-se a olhar para o problema da regulamentação tarde demais. Agora, já é uma questão tão instituída que é muito difícil de mudar”, avalia ela, que considera que as novas regras em Lisboa não devem ter muito efeito, uma vez que não agem para reduzir o número de licenças que já existem.

“O problema é que agora já há áreas em Lisboa em que a proporção de unidades de alojamento local supera os 50%. Metade de uma freguesia ser um hotel é um absurdo”, acrescenta Ana.

Uma dessas freguesias é a de Santa Maria Maior, que abrange Alfama, Baixa, Chiado, Castelo, e Mouraria, onde a proporção de aluguel por temporada chega a 52%.

Já a Alep (Associação do Alojamento Local em Portugal), principal entidade que representa o setor, criticou a decisão de suspender novas unidades em Lisboa. “Esta aprovação é uma mensagem preocupante aos lisboetas ao sinalizar que os interesses dos jogos políticos vão ficar acima dos verdadeiros interesses e debates sobre o futuro da cidade”, declarou a associação, em nota.

Segundo a entidade, a oferta verdadeira de alojamento por temporada é menor do que a quantidade de licenças existentes na cidade, que verificou redução de 2 mil unidades do total, desde 2019. “A proposta ataca mais uma vez e desestabiliza sem justificação todo um setor que representa hoje quase metade das dormidas turísticas da cidade e que gera rendimento e emprego a milhares de famílias lisboetas”, completam.

Impacto nos brasileiros

Para Flávia Motta, sócia da Lisboa à Beça, consultoria imobiliária e migratória especializada no público do Brasil, os brasileiros que buscam comprar um imóvel na cidade já devem sentir os efeitos.

“Afetou principalmente o cliente brasileiro que mora mais distante, normalmente ainda no Brasil, e que busca um imóvel em Lisboa como um investimento que também possa ser usufruído de tempos em tempos. Para esses, a flexibilidade de ter as casas no Airbnb sempre foi muito valorizada”, avalia.

Em busca de contornar a situação envolvendo o Airbnb, o mercado tem apresentado outras soluções para os brasileiros que querem investir em um imóvel em Lisboa sem abrir mão de passar alguns dias do ano na propriedade.

“Os aluguéis de média duração, apenas por alguns meses, têm sido a principal escolha. Lisboa é uma cidade com muitos estudantes e é cada vez mais procurada por nômades digitais. Então, esse tipo de arranjo tem bastante demanda”, diz Flavia.

“Já existem plataformas especializadas em aluguel de média duração, onde é simples que os proprietários deixem algumas datas reservadas para uso próprio. É algo que os brasileiros têm procurado bastante”, finaliza.

(*) Crédito da capa: Reprodução/Folhapress

(**) Crédito da foto: Mahrous Houses/Pixabay