Tenho estudado muito no último ano sobre transformação digital. Meu objetivo é entender como esta mudança da cultura e de ciclo de negócios de grandes empresas vem, de fato, transformando o mundo e a forma como vemos as organizações do futuro.

Para esclarecer sobre o cenário da transformação digital, primeiramente precisamos entender que a tecnologia é um meio e não o fim. No fim da linha, portanto, esse processo se trata, principalmente, de transformação humana, cultural e comportamental.

Depois de entendido que realizar esse processo em uma empresa não se trata apenas em “digitalizá-la”, vamos compreender quais são os pilares que permitirão com que as organizações consigam pensar em escalar seus negócios de maneira exponencial.

Quando falamos desta Pirâmide Digital, temos os seguintes atributos:

  • Estratégia de negócios: como topo da pirâmide está o repensar novos modelos de negócios. É necessário avaliar oportunidades, riscos e impactos no seu modelo atual e definir metas de negócios e corporativas. Gosto de citar o exemplo do Zé Delivery, startup criada em 2016 pela Ambev com o intuito de entregar bebidas a qualquer momento e em qualquer lugar. A nova proposta funcionou sem que a Ambev tivesse que abrir novas fábricas ou contratar muitos funcionários para escalá-la. Basicamente, o pontapé de tudo foi notar que em seu modelo tradicional (de distribuidor) muitas vezes não atendia a todos os clientes em todos os momentos por diferentes motivos, como horários de funcionamento. O que motivou a empresa a criar uma plataforma que acrescentava mais um intermediário (App Zé Delivery Distribuidor e Entregador) e, inclusive, a vender produtos que não são os seus próprios? Resposta clara: a Experiência do Usuário (UX). Este foi a real motivação e não apenas em ser mais um app para venda de bebidas.
  • Execução Corporativa: nada mais é do que atingir os seus objetivos definidos por meio da execução dos processos. Aqui, é importante ter um núcleo de operações direcionado a entrega do produto/serviço com processos e ferramentas bem definidos.
  • Tecnologia: facilitar a execução do negócio por meio de soluções tecnológicas. Habilitar ferramentas para escalar com mais agilidade o negócio. Ex. Inteligência Artificial, Big Data, Smart Machines, CRM, chatbot… são várias alternativas.

Antes ainda de pensar na Experiência do Cliente (pós), a transformação digital vem com um mindset de saber o que a clientela pensa em toda a sua jornada pré-consumo. Cada vez mais, empresas estão investindo recursos e analisando dados sobre comportamento e hábitos dos consumidores no geral, entendendo que, com todas as mudanças que estamos vivendo, estamos criando novos hábitos que não existiam há dois anos. É a partir disso que novas organizações estão sendo criadas e ganhando valor de mercado de uma forma exponencial.

Aproximadamente seis anos atrás, estávamos entrando no ciclo evolutivo da transformação digital, no qual empresas estavam começando a entender a importância do tema. Em 2020, mesmo sendo um ano de crise, muitas empresas enxergaram oportunidade em repensar seus modelos de negócios e estão passando por este processo.

Quando olhamos para as empresas que mais que quadruplicaram seu valor de mercado nos últimos anos, não por coincidência elas são organizações que nasceram, cresceram ou se desenvolveram por meio dos conceitos de business agility e de transformação digital.

Trago aqui dois cases interessantes de empresas que repensaram suas estratégias de negócios baseado em User Experience, e usando Inteligência Artificial.

  • Target: gigante americana do segmento de varejo. Analisou os 35 principais produtos que uma mulher grávida procurava nas suas lojas físicas e virtuais. Quando identifica em sua base de dados algum usuário procurando cinco ou mais desses itens na sua plataforma digital, envia um cupom de desconto para os demais 30 produtos dessa cesta.
  • Walmart: loja americana de departamento. Por meio da análise de hábitos de consumos, identificou que a maioria dos clientes que entrava nas suas lojas procurando pão e leite comprava, no mínimo, outros sete ou oito produtos a mais. Então, começou a trabalhar com margem negativa nestes dois produtos, pois sabia que compensaria no volume de compras dos demais itens. Desta forma, tornou-se o lugar mais barato para comprar leite e pão e, adicionalmente, consegue vender mais outras coisas.

Realizar a transformação digital não é uma tarefa fácil, ainda mais quando a alta gestão do negócio possui mindset fixo, modelos de estruturas matriciais e não engaja todas as unidades de negócios da companhia.

Quando olhamos para as principais razões às quais empresas não conseguem emplacar a transformação digital, elas dizem mais sobre pessoas do que sobre tecnologia. Está aí a validação do início do texto, quando disse que ferramentas tecnológicas são um meio e não o fim. Não são essas soluções que farão a mudança, mas, na verdade, a criação de uma nova cultura organizacional.

Você sabia que:

  • 45% das empresas que não escalam a transformação digital possuem multi-prioridades e não viram o foco do negócio para este fim.
  • 35% das empresas não possuem unidades de negócios integradas. Ou seja, cada estrutura quer ir em uma direção, enquanto uns falam em demasiados processos e estruturas verticais, outras falam em autonomia e novos experimentos.
  • 32% das empresas dizem não receber suporte devido da alta gestão para que o processo aconteça.

Empresas de sucesso estão repensando seus negócios baseado em como agregar mais valor ao usuário, aos hábitos do dia a dia. Foque em conhecer o cliente, mesmo que ele ainda não esteja neste momento em sua base.

O mesmo exemplo que usamos e estudamos em outras indústrias, podemos validar (com as devidas proporções) também para os hotéis. O segmento de hotelaria tem um enorme potencial para inovação, já que não inova há décadas. Está nas nossas mãos, “personas” do setor, iniciar o processo de transformação dentro dos nossos negócios.

Tudo que abordamos aqui se aplica ao nosso dia a dia na hotelaria. Falando sobre hábitos e experiência do consumidor, então, mais ainda. Temos grandes oportunidades de mudança.

Karol Garrett é especialista em distribuição, revenue management, transformação digital e inovação em hotelaria. Possui certificações internacionais na área de pricing e no decorrer dos 18 anos de sua carreira se dedicou a expansão de novos negócios de brokers da Europa, atuou como hoteleira e possui sua própria empresa de consultoria em RM há 15 anos.

(*) Crédito da capa: Arquivo pessoal