Na reta final da corrida eleitoral, o crescente número de famílias endividadas ganha destaque entre as pautas de campanha. Apesar da última projeção do BC (Banco Central) apontar que a inflação deve recuar, o endividamento segue em alta. De acordo com um levantamento mensal da CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo), o indicador chegou a 79%, impulsionado por serviços em geral, como contas de luz, telefone e internet, carnês e prestações, segundo divulgado pela CNN Brasil.

Neste ritmo, muitas famílias se encontram incapazes de pagar suas contas em dia, levando a inadimplência a atingir níveis recordes em agosto. Atualmente, o número de pessoas com contas atrasadas é de 67 milhões, enquanto o valor total dessas dívidas supera os R$ 289 milhões. Desses, 28% estão relacionados a pendências com bancos e cartões de crédito, e o resto, a serviços em geral.

Por este motivo, a reportagem do Estadão procurou as equipes de campanha dos presidenciáveis Jair Messias Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para detalhar seus planos de ação sobre a questão, caso vençam a disputa no segundo turno das eleições, no dia 30 de outubro.

Planos de governo

Batizado de “Desenrola”, o plano do petista é criar um programa de renegociação das dívidas – predominantemente as atreladas a serviços – de famílias e de pequenas e médias empresas, com apoio de bancos públicos e parcerias com bancos privados. No caso de Bolsonaro, o foco é incentivar a geração de empregos para reaquecer a economia, ampliando o poder de compra. Não há, porém, nenhuma proposta clara do atual presidente que envolva diretamente a renegociação de dívidas.

Para o economista Guilherme Melo, coordenador do Núcleo de Acompanhamento de Políticas Públicas da Fundação Perseu Abramo, que atua na elaboração da proposta de campanha de Lula, o programa “Desenrola” mira na quitação de dívidas da população mais vulnerável. A princípio, a proposta prevê ações voltadas para famílias que ganham até três salários mínimos (R$ 3.636), mas depois ampliar o acesso para famílias com rendas mais elevadas.

“Estamos falando dessas dívidas não bancárias, que são a maioria, cerca de 73% do volume total”, afirma Melo. “O plano é criar birôs de crédito no país, que serão espaços de centralização de informações, porque essas dívidas são muito dispersas, hoje você não tem esses dados centralizados. Esses birôs seriam organizados em parceria com os bancos e, também, com o SPC (Serviço de Proteção de Crédito), Serasa, Banco Central, para fazer a negociação dessas dívidas”, explica o economista.

Segundo ele, a ideia é se concentrar inicialmente em clientes que foram “negativados”, cujos débitos já são tratados como “perdidos” pelas empresas. “O plano é oferecer grandes descontos nessas negociações, até porque grande parte dessas dívidas é de juros e multas”, alega Melo. “Hoje, isso acontece em algumas situações; mas, muitas vezes, as empresas querem receber o valor todo de uma vez, e as famílias não têm condições de pagar”, completa o coordenador.

Quanto ao documento de 48 páginas referente ao plano de governo de Bolsonaro, entregue ao TSE (Tribunal Superior Eleitoural) não há qualquer menção ao endividamento familiar. A reportagem enviou questionamentos aos ministros Paulo Guedes (Economia), Fabio Faria (Comunicações), Ciro Nogueira (Casa Civil), além do próprio comando da campanha. Não houve resposta até a publicação desta matéria.

(*) Crédito da foto: Dylan Gillis/Unsplash