Servir é lidar com diferentes perfis de clientes todo santo dia. Na hotelaria, essa sentença é ainda mais verdadeira, visto que o hotéis recebem pessoas 365 dias por ano, 24h por dia. Somando servir com conviver, o setor é especialmente propício para momentos e histórias inusitadas. Com isso em mente, o Hotelier News compilou alguns dos mais curiosos relatos de hoteleiros e suas experiências no ramo.

Cliente difícil 

Carlos Jacobina, gerente geral do Novotel Itu, conta que estava no restaurante do hotel quando viu um senhor abordando duas moças e um rapaz sentados em uma mesa almoçando. “A cena fazia parecer que eram amigos íntimos, pois estava em pé com as mãos nos ombros de uma das moças. Com a reação enérgica do rapaz, o senhor se afastou e saiu do restaurante”, alega. “Ao me aproximar para entender o ocorrido, informaram-me que ele havia deixado todos desconfortáveis na mesa ao solicitar que uma das moças ficasse hospedada com ele, pois escutou que estavam para fazer check-out em seguida”, relata.

“Era uma típica cena de cantada ou assédio de um senhor de idade avançada que perdeu a noção”, pontua Jacobina. “Quando localizamos o apartamento dele e verificamos que seu check-out também era naquele mesmo dia, pedimos para que se retirasse do hotel, pois não renovaríamos sua reserva. Tudo ia normal, até percebermos que havia deixado para trás uma enorme mala trancada com chaves. Após ser acionado, disse que não queria nada da bagagem, entrou no carro e foi embora”, continua.

Sob a preocupação de se tratar de drogas ou outros itens ilegais, o hotel chamou a polícia. Após arrombarem a mala, encontraram somente algumas roupas e três conjuntos de canetas de uma marca famosa, que são avaliadas em mais de R$ 30 mil. “Estamos até hoje aguardando o senhor retornar para retirar as canetas e as roupas deixadas para trás. E lá se vão mais de dois anos desse infeliz episódio”, completa Jacobina.

Tubos de desodorante

Quando Amauri Morais, atual gerente de Vendas do Novotel Itu, trabalhava no Quality Goiânia, em 2019, a governanta adentrou sua sala com 15 tubos de desodorante spray vazios. “Todos os dias a camareira recolhe essa quantidade do apartamento do hóspede Fulano de Tal, que está hospedado conosco há três dias!” reportou ela a Morais. Assustado e preocupado com o que poderia estar acontecendo, Morais descobriu, pelos dados da reserva, que se tratava de um piloto de avião privado de uma empresa aérea importante, e que ficava pela primeira vez na unidade. 

“Alinhei todos os tubos em minha mesa, bloqueei a chave do hóspede e orientei à recepção que quando ele chegasse para revalidar a chave, fosse direcionado à minha sala”, conta Morais. “Ao entrar em minha sala, o piloto não conteve seu espanto ao ver todos os frascos e me confessou que era viciado em aspirar esses sprays de desodorante. Segundo ele, só conseguia dormir depois de aspirar e pediu que eu não contasse à empresa”, continua. 

“Falei-lhe dos riscos, que nosso hotel também poderia ter problemas caso ele sofresse algum acidente, como parada respiratória, e convidei-lhe, gentilmente, a fazer seu check-out, o que fez prontamente”, narra Morais. “Depois, pesquisei no Google e descobri que não é um vício mais comum do que eu imaginava e que pode, inclusive, levar à morte!”, completa.

Casamento improvisado

Nem toda história precisa ser triste ou estranha. É o caso do Meliá Brasil 21, que oferece o pacote Casa comigo?. Nele, o noivo pede a mão da pretendente no heliponto do empreendimento. “Muitas vezes, as produções chegam a ser hollywoodianas. Nesse caso, em uma época de seca na cidade, o noivo trouxe sua banda para tocar no evento e um painel de três metros de altura, além de flores e toda parte de A&B”, relata Jacques Bezençon, gerente geral do Meliá Brasil 21.

Jacques-Bezencon

Bezençon: tudo aconteceu em menos de 40 minutos

“Apenas 40 minutos antes da noiva chegar, uma chuva torrencial e inesperada desabou sobre Brasília, podendo levar os planos do noivo por água abaixo, literalmente”, conta Bezençon. “O noivo já estava desesperado, achando que os meses de preparação para a surpresa não dariam certo. Enquanto isso, a equipe foi agilmente transferindo o evento para um lounge exclusivo para hóspedes VIPs”, continua.

“No fim, a noiva chegou quando estava tudo pronto, a grande pergunta foi respondida com um sonoro ‘sim’, e a festa, que poderia não ter saído como planejado, transcorreu a mil maravilhas como se tivesse sido programada naquele lounge desde o início”, finaliza Bezençon.

A bruxa do 666

Algumas histórias, no entanto, chegam a ponto de compartilhar semelhanças com enredos de filmes de terror. “Uma senhora de idade, muito bem vestida e maquiada, foi direcionada de uma clínica de emagrecimento para o hotel em que eu trabalhava”, narra Jacobina. “Chamaram-me, pois ela carregava muitas bagagens e, então, fomos levando tudo ao quarto do hotel super econômico. Ela se acomodou, foi pagando as primeiras diárias, até que apareceram os primeiros problemas…”, continua.

Além de comer compulsivamente, a ponto de chamar atenção de todos os hóspedes do restaurante e levar comida escondida ao quarto, a senhora era acumuladora e levava até os talheres do café da manhã. “Ela se apresentava como condessa e filha de um desembargador, falava algumas palavras em francês e ficou íntima de todo mundo do hotel. O problema é que ela começou a incomodar os hóspedes corporativos do hotel, de tal modo que até foi expulsa do spa”, conta Jacobina.

“Ela arrumava tanta confusão por onde passava, que o gerente do Banco do Brasil fazia questão de levar o dinheiro para ela não entrar na agência. Isso valia para lojas e outros serviços como cabeleireiro, que preferiam atender no quarto do hotel do que lidar com ela nos estabelecimentos”, exemplifica. “Nisso, ela ficou mais de seis meses conosco até que começamos a procurar familiares dela. Conversei até com o filho, que disse que não queria nada com ela, pois já havia sofrido o bastante”, acrescenta.

Carlos Jacobina

Jacobina: a senhora arrumava confusão onde quer que passava

Juridicamente, o hotel não podia expulsá-la sem algum BO (boletim de ocorrência). Então, Jacobina apenas insistiu que ela se retirasse do empreendimento, o que rendeu uma série de xingamentos. “Nessa época, estava passando por um período complicado, pois minha esposa da época tinha perdido o bebê – o que a senhora eventualmente ficou sabendo por conhecer toda equipe do hotel”, continua.

Com o BO, o hotel chamou a polícia para, gentilmente, solicitar que ela se retirasse. Segundo Jacobina, a senhora tentou se passar de coitada para o policial, alegando que o pessoal do hotel era como se fosse sua família. Jacobina, então, reforçou que não queriam mais ela ali, o que ela respondeu: “Jacobina, meu querido, pela alma do seu filho que acaba de morrer!”. “Quase voei pra cima dela. O policial teve que me segurar de tão furioso que fiquei”, conta o gerente geral.

“Nesse dia, o policial finalmente a convenceu a sair do hotel. Enquanto isso, a equipe ia descendo as coisas dela e colocando tudo em um táxi. Então, mandamos ela para outro hotel, como se fosse uma hóspede normal, da mesma forma que o clínica de emagrecimento fez conosco”, completa Jacobina. Assim, a maldição da “Bruxa do 666” – que era de fato o número do quarto em que ela ficou hospedada – seguiu para importunar outro empreendimento.

(*) Crédito da capa: neshon / Unsplash
(*) Crédito da foto¹: Divulgação / Meliá
(*) Crédito da foto²: Peter Kutuchian