Transações financeiras: a hora e a vez do e-commerce hoteleiro
3 de agosto de 2023Imagine a cena: você escolheu um destino, gastou horas procurando um meio de hospedagem e, no momento de finalizar a reserva, o site falha. O abandono de carrinho em função de problemas com meios de pagamentos é uma realidade no setor hoteleiro, o que levou a indústria a repensar o modo como lida com suas transações financeiras e qual seu real impacto nas vendas.
Na jornada de compra, as dificuldades com pagamentos prejudicam a experiência do hóspede, gerando incertezas para o consumidor e perdas para os hotéis. Com o inexorável avanço das transações digitais, a indústria de viagens busca reduzir o gap em relação a plataformas de e-commerce tradicionais, colocando uma missão para meios de hospedagens, operadoras e demais elos da cadeia produtiva: é necessário investir mais e mais em tecnologia para atender às necessidades do cliente.
A mudança de comportamento de compra era um caminho natural perante o avanço da transformação digital, mas é inegável que a pandemia teve sua relevante contribuição para acelerar esse movimento. Ou seja, adaptar processos e acompanhar a evolução das transações financeiras online não é mais questão de competitividade, mas de sobrevivência.
O Relatório Varejo 2023, desenvolvido pela Adyen em parceria com a Opinium Research LLP e a Censuswide, reúne respostas de 36 mil consumidores em 26 países, além de mais de 12 mil comerciantes de 24 países. A coleta de dados do estudo conduzido pela empresa de pagamentos sediada na Holanda aconteceu de fevereiro a março de 2023 (ou seja, fresquíssima) e, no Brasil, 2 mil pessoas e mais de 500 varejistas foram entrevistados.
O levantamento aponta que 84% dos dos consumidores dizem que pagam suas compras feitas online com cartão de crédito ou débito, enquanto 72% utilizam o Pix. Já 74% dos respondentes afirmam adquirir itens relacionados a férias online e 30% alegam reservar suas viagens via tablet ou celular.
Levando o recorte para o segmento de hospitalidade, 54% das empresas estão considerando investir em comércio unificado e outras 16% já estão desenvolvendo um sistema próprio de compras. Outros 62% das marcas do setor acreditam que as vendas online são mais importantes do que as realizadas em lojas físicas.
Quando falamos do turismo como um todo, 26% das empresas estão considerando investir em comércio unificado, 42% estão em fase de investimentos e 69% acreditam que as vendas online são mais importantes para a empresa do que as efetuadas em lojas físicas.
Do problema à solução
No mercado brasileiro, existem incontáveis sistemas utilizados por estabelecimentos que operam com credenciadores. Já no offline, a necessidade de gestão de terminais e fornecedores demanda um trabalho operacional nada otimizado por parte das empresas.
“É preciso facilitar para quem está operando pensando na experiência de compra e na fidelização do cliente sem precisar de planilhas, CPFs, etc. A pandemia acelerou a necessidade de bons processos de compras online, pois não existia outro canal, mas ainda havia certa resistência por parte dos consumidores em comprar por meios digitais”, analisa Maria Isabel Noronha, vice-presidente de Contas da Adyen.
Felizmente, o receio de incluir dados de cartão em meios de pagamentos digitais cessou, enquanto o consumidor passou a confiar mais em transações financeiras online. Essa mudança é creditada, principalmente, a um mercado que trabalhou a educação da compra segura.
“Com o aumento das tentativas de fraudes, os estabelecimentos tiveram que se preparar para receber essas transações financeiras com o auxílio de ferramentas. É preciso garantir uma compra segura, transparente e sem fricção para o cliente, pois o consumidor passa por muitos pontos em sua jornada até o momento do pagamento”, destaca a executiva.
E quando falamos em facilitar a jornada de compra, leia-se “quanto menos cliques, melhor”. Reduzir etapas enxuga a possibilidade de fricção e, consequentemente, um possível abandono de carrinho.
“É um trabalho muito grande, porém é possível oferecer diversas experiências bacanas ao longo da jornada. Um exemplo é o uso do token aleatório, utilizado para mascarar os dados do cartão. Parece algo simples, mas não oferece o acesso aos dados e deixa o cliente mais seguro”, explica Maria Isabel.
A tokenização das transações financeiras também possibilita outras facilidades, como experiências contactless no check-in, quando o hóspede encosta o cartão e o sistema puxa todos os dados atrelados na reserva, como categoria do apartamento e número de diárias.
“Vai além da segurança, mas ajuda a proporcionar boas experiências, seja no check-in, consumo interno e check-out”, enfatiza a vice-presidente da Adyen.
Elevando a experiência
Ana Carolina Carminatti, especialista de Plataformas da Letsbook, diz que o cada vez mais o usuário tem optado pela praticidade e conveniência das transações financeiras mobile, uma vez que pode ter acesso rápido, e a qualquer momento, à compra que deseja. “Esse comportamento também tem ligação com uma forte tendência do social commerce, visto que as redes sociais estão ainda mais presentes dentro do ciclo de engajamento do usuário, sendo natural que as vendas por meio deste canal também sejam impulsionadas”, comenta.
A executiva explica que, na venda de viagens, esse comportamento não é diferente e o crescimento do mobile também é implacável. No comparativo entre o primeiro semestre de 2023 com o mesmo período do ano anterior, a Letsbook registrou aumento de 134% nos acessos de usuários via plataformas móveis, enquanto no desktop a alta foi de 51%, na mesma base de comparação.
“Já analisando as transações, podemos destacar o aumento de 26% nas vendas mobile na mesma comparação, enquanto que, no desktop, a alta foi de 22%. Então, esse número demonstra o forte potencial do canal, que ainda é timidamente explorado por boa parte do setor”, ressalta, em entrevista ao Hotelier News.
O que priorizar
Ana Carolina pontua que, diante deste cenário, alguns pontos precisam ser valorizados nas plataformas mobile, frente ao aumento da demanda neste canal.
- Boa experiência do site: ter uma versão mobile do site bem feita é essencial. O usuário já espera que o e-commerce se adapte ao device que será utilizado, e não o contrário. Também é importante estar atento à velocidade de carregamento da página, para que não gere desistência do usuário final.
- Estratégia de social integrada: utilize as redes sociais a favor da marca. Além de funcionar como boa ferramenta de atração e engajamento, também pode proporcionar um novo canal de aquisição e de vendas. Faça links inteligentes entre suas redes e canais de atendimento para facilitar a jornada de compra. Invista em parcerias com perfis que tenham um público em comum ou novo que deseja atingir e ofereça links com vantagens exclusivas para impulsionar as reservas.
- Ofertas exclusivas: crie estratégias exclusivas para o canal mobile, seja por meio de descontos ou outros diferenciais na tarifa. Isso com certeza fará diferença na decisão de compra do usuário.
- Atendimento facilitado: para o cliente que busca a praticidade do mobile, é importante a facilidade na interação com o atendimento do negócio, para que possíveis dúvidas sejam rapidamente sanadas.
“Essas são apenas algumas reflexões”, avalia a executiva da Letsbook. “Agora, o mais importante é buscar entender, por meio dos dados, as mudanças de comportamento do seu usuário de forma contínua. Isso deve ser colocado em prática diariamente”, conclui Ana Carolina.
Segurança como base da relação
No mundo digital, existe a dicotomia entre obter mais compras e evitar fraudes. Talvez este seja o principal desafio das transações financeiras online atualmente. Maria Isabel recomenda o uso de ferramentas antifraude com etapas de autenticação, seja via senha ou biometria.
“Oferecer essa segurança reduz o risco de perder transações e garante maior conversão de compras. Transações autenticadas, soluções antifraude e tokenização são soluções disponíveis no mercado para garantir uma compra segura”, pontua a executiva.
Grandes redes e hotéis que trabalham com programas de fidelidade podem aproveitar a tokenização em outras frentes, desenvolvendo benefícios para os clientes. “O hotel pode guardar os dados da primeira reserva, transformando essa informação em uma chave que pode ser utilizada para tudo”, diz Maria Isabel. “Os processos são muito mais fáceis se o empreendimento construir dados unificados.”
Tais informações também servem para a criação de estadas personalizadas, com dados de preferências e restrições alimentares, por exemplo. “Os hotéis podem consumir isso ao longo do tempo. Os pagamentos não deveriam ser uma commodity, mas uma forma de trazer experiência. É preciso um olhar mais holístico”, avalia a executiva.
E na prática?
Rafael Couto, diretor Financeiro da Slaviero Hotéis, comenta que a rede tem incentivado o uso do Pix, tanto com fornecedores, quanto com os clientes. “As vantagens passam por menor custo nas transações em relação às operações com cartão de crédito, além da questão de segurança, diminuindo consideravelmente a retenção de dados dos hóspedes”, salienta.
“Estamos investindo na experiência digital completa de toda a trajetória do cliente antes, durante e depois da hospedagem”, complementa o executivo da Slavieiro.
“Sem dúvidas, um Pix integrado ao processo de check-out está criando uma percepção de agilidade e modernidade ao setor”, continua Couto.
Ele acrescenta ainda que a Slaviero atualizou recentemente seu site e as ferramentas de venda online, com maior interação com a versão mobile. Segundo ele, o setor vem se estruturando cada vez mais para atender a essa demanda do canal móvel, proporcionando uma jornada digital com menos fricção e muito mais satisfatória aos hóspedes.
“Algumas barreiras ainda precisam ser superadas, como alguns dispositivos legais, mas estamos no caminho certo”, finaliza Couto.
*Colaborou Lucas Barbosa
(*) Crédito da capa: Unsplash
(**) Crédito das fotos: Divulgação