Três perguntas para: Henrique Campolina
3 de agosto de 2023Mineiro, natural de Belo Horizonte, Henrique Campolina não nega suas raízes, seja cozinhando para a família ou na torcida pelo Cruzeiro, seu time do coração. Com ampla expertise em diferentes áreas do setor hoteleiro, é impossível não falar de sua carreira sem citar a Accor, onde permaneceu ao longo de 22 anos.
Campolina entrou na rede francesa como mensageiro e, até sua saída, em maio deste ano, foram 19 promoções, oito áreas, seis cidades e três países. “Passei por todos os departamentos operacionais de um hotel até a gerência em 2008”, conta o executivo.
Formado em Administração e Gestão em Hotelaria, Campolina ainda conta com dois MBAs. O primeiro focado em Gestão de Negócios pela Fumec, já o segundo em Gestão de Marcas (Branding) pela FIA. Para completar, o profissional também possui formações em Pricing e RM (Revenue Management) pela Cornell University.
“Estive entre os primeiros revenue managers contratados no Brasil em 2009, quando trouxemos a metodologia para as operações midscale até assumir e implantar todo processo e cultura nos então 155 hotéis ibis na América do Sul, que até 2012 possuíam preços fixos”, relembra.
Em 2016, quando a Accor comprou a empresa de tecnologia Fastbooking (hoje D-Edge), Campolina assumiu a operação brasileira como country manager. “O principal objetivo era criar e lançar um marketplace abrindo o site da Accor para hotéis independentes. Construímos absolutamente tudo do zero, assinamos mais de 300 contratos em pouquíssimo tempo até um momento em que, por uma definição global, o projeto deixou de existir”, explica.
Com o fim do projeto, o profissional se juntou ao time de Desenvolvimento, com foco na expansão do portfólio da rede nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Em 2019, Campolina foi para Santiago, no Chile, com a missão de acelerar os resultados nos países sul-americanos.
“Assumi as áreas de Vendas, Pricing, RM Loyalty e Customer Experience. Tinha um time de 115 pessoas no Chile, Colômbia, Peru, Argentina, Bolívia, Equador, Paraguai e Uruguai. Nos primeiros meses, ajustamos muitos temas técnicos e, em seguida, nos dedicamos às pessoas. Foi um trabalho lindo formando equipes”, acrescenta.
Paralelo a tudo isso, Henrique Campolina foi professor de cursos de graduação e pós-graduação no Senac Minas, Senac São Paulo e na Fumec.
Três perguntas para: Henrique Campolina
Hotelier News: A diária média seguirá direcionando a rentabilidade dos empreendimentos, mesmo com uma possível desaceleração do setor. Como os hotéis podem manter sua recuperação baseada em tarifas de forma estratégica?
Henrique Campolina: Muita calma nessa hora! Depende. Não nos esqueçamos que preço deve ser visto como a tática e o volume como estratégia. Esta indústria precisa ser mais técnica, profissional e profunda, não somente surfando uma onda passageira quando o mercado se auto precifica.
Não é errado abaixar, negociar ou ceder. Paremos com isso! O errado está em como fazer. Com frequência ainda vemos em todos os tipos de segmentos (do eco ao luxo) e empreendimentos (independentes ou de redes), pessoas brincando de preços. Aumentam quando o vento sopra forte e abaixam quando o vento some. Tudo sem muito embasamento.
É preciso analisar muito mais, usar modelos matemáticos de elasticidade e investir em sistemas. A herança de todo esse efeito de consumo pós-pandemia que culminou na inflação é a dificuldade do consumidor em ter referências reais. Mas isso não quer dizer que tudo pode.
Tenha muito claro e atualizado os custos fixos e variáveis para usá-los como tática. Do outro lado, esteja obcecado pela percepção de valor do cliente sendo realmente guestcentric. Na maioria dos casos, o serviço está muito aquém do que deve ser. Entendemos o fato da falta de mão de obra, entretanto, nem o básico está sendo entregue. Ainda pouquíssimo se faz em pós-venda para criar relações de fidelidade.
Seja hóspede do seu hotel. Você pagaria o que você cobra? Depende? Por fim, a estratégia principal estará no mindset de gestão de receita.
HN: O que deve ser priorizado no desenvolvimento de conteúdo para as redes sociais? E como os programas de fidelidade entram na estratégia dos hotéis?
HC: Hoje em dia o que mais vemos são em empresas que não conseguem entregar o básico, isto é, mal conseguem entregar o que se promovem e se propõe a fazer. O que é muito ruim, pois gera frustração ao cliente que tinha um mínimo de expectativas. Desta forma, o que deve se priorizar no desenvolvimento de conteúdo para estas plataformas é a verdade.
Precisamos lembrar que as redes sociais são só o topo do iceberg em uma estratégia de distribuição, o que o pessoal da área gosta de chamar de topo do funil. Não adianta nada tentar usá-las se por trás os canais de atendimento não funcionam, os meios de pagamentos são falhos, o site é ruim, o channel manager não está integrado e a entrega do produto é confusa.
Não prometa com imagens e vídeos maravilhosos o que não irá cumprir porque cedo ou tarde tudo desmoronará. A estratégia deve ser calcada em um mindset onde toda cadeia está integrada.
Por mais que o Brasil seja referência em loyalty, nem toda empresa precisa de um programa de fidelidade. O que todo negócio precisa é de uma estratégia de relacionamento com o cliente.
O que significa fidelidade? Constância nos compromissos assumidos com outrem, o que demonstra zelo, respeito por algo, lealdade, que é confiável, honesto, verdadeiro. Alguém é fiel com quem não possui relações? Difícil! Entenda, converse, aprenda, construa relações fortes, surpreenda, favoreça, reconheça. Isso pode ser feito de várias formas e complexidades diferentes. E, independente de como, trará vínculo entre sua marca e o cliente.
Existem inúmeras empresas que oferecem todo tipo de soluções e serviços em loyalty. Gestão e tecnologia de pontos, sistemas de CRM, ferramentas de cashback, criação de subscription programs, negociações para co-branded credit cards, formatação de experiências exclusivas, formação de alianças entre empresas, etc
Um hotel pequeno não precisa da mesma estratégia de uma rede, mas ambos precisam de um mindset realmente guestcentric.
HN: Você está confirmado como participante no Hotel Trends Orçamentos. Qual a relevância do debate para o setor?
HC: Gostaria de acrescentar algo para finalizar nossa conversa. Nas perguntas acima, mencionei uma palavra que para mim resume no que pessoas e empresas precisam focar: mindset.
O maior problema de empresas e pessoas não está no acesso à informação ou no uso de tecnologia como talvez acontecesse no passado, mas sim, está na pouca coerência em gestão, o que faz com que tudo seja raso e superficial.
Perde-se muito tempo em situações que não vão agregar muito, decisões que podem ser simples são complexificadas, falam uma coisa e fazem outra. É necessário criar cultura de desempenho e competitividade para negócios através de concepções claras e objetivas. Revisões críticas são fundamentais. Tem que gostar do processo e não somente do resultado.
Eventos como o Hotel Trends Orçamentos 2024 são positivos justamente para acrescentar visões e pontos de vista para os profissionais.
(*) Crédito da foto: arquivo pessoal