Nos dois últimos finais de semanas, por meio da história de funcionários, clientes e até do arquiteto que o construiu, o Hotelier News reconstituiu emoções que o Maksoud Plaza foi capaz de gerar ao logo dos seus 41 anos de atividades. No entanto, para além de quem trabalhou ou foi cliente do mítico hotel, há muitas outras pessoas com memórias afetivas relacionadas ao cinco estrelas paulistano. Hoje, vamos contar algumas delas.

Certo é que o Maksoud Plaza proporcionou momentos memoráveis para muita gente, seja por meio de shows antológicos, das agitadas noites no 150 Night Club ou pelas experiências gastronômicas no La Cuisine du Soleil, inaugurado pelo chef Roger Vergé. Houve ainda visitas ilustres, avant-premières de lançamentos do cinema, peças teatrais marcantes, gravações de programas de TV, confusão com astro do rock e até mesmo lutas de vale tudo.

Ou seja, mais do que um lugar para se entreter, dançar, comer, beber e, claro, hospedar-se, o Maksoud Plaza é um ponto de encontro de pessoas na cidade. Dali pode-se partir para um dia de compras pelos shoppings centers de São Paulo ou para visitar o MASP (Museu de Arte de São Paulo) ali do lado. Happy hours podem ter se transformado em baladas madrugadas adentro ou pedidos de casamentos virarem relações sólidas, entre tantas outras coisas – malucas ou não – que esse empreendimento testemunhou. Essa linha do tempo, mostra algumas delas.

Em resumo, quase todo paulistano tem uma história com o Maksoud Plaza. Mesmo sendo um carioca da gema, daqueles com sotaque inconfundível, tenho a minha e ela vai muito além das visitas constantes que fiz recentemente para a apuração dessa série de reportagens. Meu último Réveillon foi lá, por exemplo, um suspiro necessário em meio à dureza da pandemia, sem minhas filhas gêmeas Gabriela e Maria e apenas ao lado da minha amada esposa Carolina. Leitores, não pensem besteiras, hein? Já tenho filhos suficientes, mas, sim, foi ótimo para relaxar, comer e beber bem, ser bem atendido e, claro, namorar.

Abaixo, contamos a história de três personagens com o Maksoud Plaza.

Maksoud Plaza - memórias afetivas_capa

Entrem, seja bem-vindos, acomodem-se e, claro, não deixem de ler até o final

Caio e a noite perto do ídolo

Você pode ter sua ocasião especial no cinco estrelas paulistano, e guarde-a com carinho mesmo na memória. Completamente justo! Agora, não me leve a mal, absolutamente nada supera as noites entre 13 e 16 de agosto de 1981. Nessas datas, um dos maiores cantores da história por lá se apresentou. Um ano depois das apresentações em um Maracanã lotado até a tampa, Frank Sinatra veio novamente ao Brasil para seus únicos shows em São Paulo.

Matéria da Folha de São Paulo ajuda a reconstruir essas noites no Maksoud Plaza. “Se em 1980 Frank Sinatra precisou do Maracanã para cantar I’ve got you under my skin, em agosto de 1981 ele acomodou sua voz no minúsculo teatro do Maksoud Plaza. Entre 13 e 16 de agosto daquele ano, Sinatra se apresentou para uma plateia de apenas 700 pessoas por noite. Ver Sinatra tão de perto fez dessa série de shows o evento do ano em São Paulo”.

“Nas quatro noites, Sinatra subiu ao pequeno palco às 23h. Porque às 21h iniciava-se o jantar, preparado por Roger Vergé. Do extenso cardápio, lia-se: Lagosta cozida com pouco sal; fundo de alcachofra com creme sofisticadamente rosado e gostoso; filé mignon com molho repleto de azeitonas sem caroço e alguns cogumelos; doce recheado de chantilly (tipo mil folhas)”.

O artista norte-americano, que posteriormente deu nome ao bar do cinco estrelas paulistano, recebeu um cachê de US$ 1 milhão para as quatro apresentações. Para bancar tudo isso, ingressos vendidos a 62 mil cruzeiros. Quase 40 anos depois, é até difícil calcular quanto isso custaria atualmente, mas, acredite, era uma verdadeira fortuna. Coisa para poucos.

“Fiz uma tremenda irresponsabilidade”, relembra Caio Calfat, um dos consultores mais reconhecidos da hotelaria nacional e fã incondicional de Frank Sinatra, gosto herdado do pai. “Em 1954, meus pais assistiram a dois shows dele em Miami. Sinatra estava recomeçando a carreira, após alguns revezes profissionais. Minha mãe me mandou um cartão postal dessa viagem descrevendo o show e me garantindo: o Frank continua com tudo”, conta Calfat, que à época pouco seguia o intérprete norte-americano.

Maksoud Plaza - Caio Calfat e Frank Sinatra

Calfat já esteve mais perto, e em carne e osso, com o ídolo

“Quando jovem, não era tão fanático pelo Sinatra. Curtia MPB e Bossa Nova, além de um pouco de rock. O estalo aconteceu em 1969, quando ele lançou My way. A partir daí segui meu pai, que tinha uma discografia impressionante dele – e eu também tenho a minha.”

Mas voltemos à irresponsabilidade de Calfat, então com 26 anos, na noite de 14 de agosto de 1981. “Não tinha grana para pagar o ingresso. Sessenta e dois mil cruzeiros era muito dinheiro. Era recém-formado e tinha acabado de montar a minha construtora. Só tinha 40 mil cruzeiros na poupança, mais nada”, conta.

Como os jornais anunciaram que nem todos os ingressos haviam sido vendidos, Calfat resolveu se arriscar. Colocou seu melhor terno e correu até o Maksoud Plaza para ver o que conseguia com seus 40 mil cruzeiros na poupança. “Já tinha ido ao Maracanã um ano antes, mas não dava para perder o Frank na minha cidade, ali tão de pertinho”, relembra.

Os portões fechavam às 20h30, quando começava a ser servido o jantar. O recém-formado engenheiro chegou um pouco mais cedo e começou a negociar com os funcionários da bilheteria. “Falava para eles: ‘20h30 ninguém mais poderá entrar e vocês ainda têm lugares vazios. Ou pegam meus 30 mil cruzeiros ou nada’. Voltei um pouco depois, subi para 35 mil cruzeiros a oferta e, faltando 1 minuto para começar, dei a cartada final: ofereci todas as minhas economias. Eles aceitaram!”

Calfat diz que é capaz de falar todo o repertório cantado por Sinatra naquela noite, que começou com o clássico Fly me to the moon. “Fui ao show no mesmo dia do Roberto Carlos. Fiquei numa mesa bem central, a poucos passos do palco, e ao lado de completos estranhos. Nessa mesma noite, uma mulher levantou do seu lugar e foi até o Frank entregar flores. Ele tirou o lenço do paletó e deu a ela. Inesquecível”, relembra.

Após uma hora e meia de boa música, Calfat foi embora extasiado contar à namorada da época a noite inesquecível que tivera – e, claro, sem um centavo no bolso. “Sabe, acredito que o dinheiro é para essas coisas mesmo. Lá se vão 40 anos, mas parece que tudo isso aconteceu no mês passado. Segue vívido em minha lembrança. Mesmo hoje, ainda considero inimaginável que o Henry Maksoud tenha conseguido trazer o Sinatra para cantar para 700 pessoas”, afirma.

“Fui sem esperanças de conseguir o ingresso, mesmo sabendo que ainda havia lugares vazios. É aquilo: o não eu já tinha. Fui e tive uma noite memorável. Valeu cada centavo.” Abaixo você vê o troféu de Calfat, guardado com carinho até hoje!

Maksoud Plaza - Caio Calfat e os ingressos

Calfat raspou tudo que tinha na poupança para ver o ídolo e jamais esqueceu essa noite

Guilherme e o melhor jabá do mundo

Não fazia muito tempo e Guilherme Meirelles vivia zanzando pelas proximidades do Maksoud Plaza em função das aulas de Jornalismo na Cásper Líbero. Ainda no início da carreira, com 20 e poucos anos, trabalhava na rádio Metropolitana FM, onde fazia de tudo um pouco, aliás como todo e qualquer foca, lá pelos idos do ano de 1985.

“Redigia textos, entrevistava, entrava ao vivo… bons tempos”, conta Meirelles, hoje aos 61 anos e com passagens por Folha de São Paulo, Agência Estados, Valor Econômico, entre outros veículos. “Sou apaixonado por música e tenho uma bela coleção de LPs de jazz e de blues, mas nunca fiz cobertura de cultura. Aliás, nem me julgo capaz de escrever para o público sobre isso”, completa.

Apesar de iniciante na carreira, Meirelles tinha uma função que todo foca gostaria: era ele quem recebia os ingressos e convites enviados para a redação. “A verdade é que pouca gente se interessava, então sobrava para mim. A assessoria de imprensa do Maksoud Plaza sempre enviava e, veja bem, a programação do 150 Night Club era demais”, relembra.

De ingresso em ingresso, o então foca conseguiu ver muitos shows marcantes no Maksoud Plaza. “Vi Buddy Guy em sua primeira apresentação no Brasil; Benny Carter, então um saxofonista já veterano, que havia tocado com Miles Davis e Billie Holiday; Zimbo Trio e o também saxofonista Hector Costita…”, enumera. “Além dos convites, fui também umas quatro ou cinco vezes na boate, bem como nos eventos que ocorriam no piano bar do saguão onde ficava o 150 Night Club. Era um ambiente muito legal, nada ostentatório de novo rico.”

Entre todas essas visitas ao cinco estrelas paulistano, Meirelles elege uma em especial: a apresentação do guitarrista Buddy Guy. “Na época, não conhecia muito as músicas, até porque a indústria fonográfica brasileira não lançava nada dele. Acompanhava mais BB King e John Lee Hooker”, relembra.

Maksoud Plaza - memórias Guilherme Meirelles

Meirelles presenciou o primeiro show de Buddy Guy no Brasil e a cena impagável do banheiro

 

As apresentações do Buddy Guy entraram mesmo para os anais da história do Maksoud Plaza. Fenômeno do blues, endeusado por guitarristas como Eric Clapton e Jimi Hendrix, além de autor de solos e reefs de guitarra inesquecíveis, o bluesman passou uma temporada no 150 Night Club, em 1985, proporcionando passagens curiosíssimas.

Em entrevista à Folha de São Paulo, em 2009, o próprio músico relembrou uma delas. “Na primeira noite, atravessei a plateia do clube, tocando minha guitarra com um fio bem longo. Achei que iria sair num corredor, mas quando percebi já estava dentro do banheiro feminino, cheio de garotas. Eu me diverti muito”.

Meirelles acompanhou tudo isso de perto – estava lá em uma mesa com vista privilegiada para toda essa movimentação. “Era mais ou menos o final do show. Primeiro, ele desceu do palco e começou a circular entre as mesas. Ele se empolgou e foi andando pelo 150, sendo seguido por algumas pessoas. Quando reparou, estava dentro do banheiro feminino. Fingiu que não era com ele e seguiu a apresentação”, diverte-se.

Segundo o jornalista paulistano, logo depois o staff do Maksoud Plaza abriu a portão de entrada do 150 Night Club e Buddy Guy não se fez do rogado: deu uma canja no saguão de entrada da boate. “Ele tocou o bis por lá mesmo. Sem exagero, foi apoteótico!”, relata Meirelles.

“Olha, houve muitos shows na vida que paguei bem caro para assistir. Não foi o caso desse, até porque era um jovem em início de carreira e muito provavelmente não teria dinheiro para isso, mas foi muito marcante. São lembranças assim que ajudam a construir nossa trajetória. Você nunca esquece!”

Peter e a primeira vez

Além de CEO e fundador do Hotelier News, Peter Kutuchian foi também um hoteleiro. “Comecei justamente no Maksoud Plaza como recepcionista, em 1991. Depois, fui para o antigo Sheraton Mofarrej (atual Tivoli Mofarrej São Paulo) para ser caixa da Recepção, indo trabalhar, na sequência, com time sharing“, relembra Kutuchian, em entrevista recente.

Em 2003, abandonou a profissão, mas não a hotelaria, que segue como paixão. E ele também tem sua passagem marcante no cinco estrelas paulistano. Então, vamos deixar ele mesmo relembrar, a partir de um texto escrito em 2008:


Lembro como foi a primeira vez. Fiquei ofegante quando a vi. Sua áurea emanava um mistério e glamour indescritíveis. Em pouco tempo estaria ali e essa sensação era muito boa. A música ambiente era um tema famoso da Bossa Nova. Tudo isso aconteceu há 30 anos. E essas foram as sensações que tive quando vi a Recepção do Maksoud Plaza pela primeira vez, do mezzanino. Foi lá que comecei na hotelaria, como recepcionista júnior.

O glamour era pleno. Nossos uniformes impecáveis. O meu jaquetão demorou para chegar. Eu já era fortinho e não tinham meu número. A solução foi colocar uns botões dourados a mais e mudar outros de lugar. Ficou engraçado e os hóspedes perguntavam se era o chefe da recepção, pois tinha mais botões que os outros. Respondia que sim – quando o chefe não estava, é claro! E me divertia. Trabalhávamos em seis ou sete recepcionistas, isso em cada turno. Sem contar os caixas, que trabalhavam em lugar separado e não podiam conversar (muito) conosco.

Se não me engano, no total éramos 18 e, para um hotel com cerca de 350 apartamentos, era uma maravilha. De segunda-feira a quinta-feira, a ocupação era sempre acima dos 90%. O lobby vivia cheio. O bar vivia cheio. Os cinco ou seis restaurantes viviam cheios. O hotel parecia uma cidade.

Uma das primeiras observações que me fizeram quando comecei foi: preste muita atenção quando tocar o telefone. Se aparecer o número 2113, além de outros dois que já não me lembro mais, atenda o mais rápido que puder, porque o dono do hotel estará na outra linha. Pensei comigo mesmo: ‘que legal, quem sabe vou falar com o Henry Maksoud e poder parabenizá-lo pelo magnífico hotel que havia erguido.’

No terceiro dia de trabalho, um sábado, tinham me largado sozinho na recepa. O telefone tocou, olhei para o painel vermelho onde apareciam os números e nada. Como tínhamos que atender ao chamado até o terceiro toque, porque senão cortavam um de nossos dedos, peguei o fone e disse: ‘Recepção do Maksoud Plaza, Peter, boa tarde!’

Do outro lado uma voz taciturna perguntou: ‘Peter, o que está tocando na estação número 5 do rádio?’. ‘Um momento senhor’, foi minha resposta e, no instante que afastava o fone do meu ouvido para olhar na tabela de estações de rádio, escutei a voz chamando novamente… ‘Peter?’ Prontamente respondi com a expressão que não podia ter dito: ‘Oi?’

Maksoud Plaza - memórias afetivas_Peter

Primeiro emprego na hotelaria de Kutuchian foi no Maksoud, assim como o primeiro esporro

 

Do outro lado escutei quase aos berros, ao mesmo tempo que olhava para o bina, e constatei: putaquepariu é ele! A sequência foi ainda pior. Ele me perguntou: ‘como você tem a coragem de falar oi? Quando teu pai te chama você responde oi?’

Desconsertado, respondi, ‘sim, respondo, senhor!’. ‘Quem está de supervisor na recepção?’, ele perguntou na sequência. ‘O Marcelo Pretti, senhor!’, respondi de pronto. ‘E no hotel?’, ele replicou. ‘O senhor Benjamin, senhor!’, informei-o na sequência. ‘Avise-os para subirem para minha suíte imediatamente!’

Avisei os dois que subiram e desceram meia hora depois com cara de vaselina. Quando a Vera Campacci, gerente da Recepção, ficou sabendo da história na segunda-feira… ‘Ai meu Deus, ainda bem que eu não estava aqui’, falou.

Sete meses depois saí do Maksoud Plaza. Não concordei com a suspensão que o Roberto Maksoud, gerente geral na época, aplicou-me sem ao menos escutar a minha versão. Ainda me lembro do Daniel Malevergne, então gerente de Operações, tentando me convencer a ficar: ‘No, Piterrr, pense bem, você deve ficarrrr, isso passa….’

Hoje, o Marcelo Pretti é um grande amigo. Na semana passada sua esposa deu à luz ao segundo filho deles, o Francisco. O Daniel, depois de passar magnificamente por vários cinco estrelas paulistanos, está de volta ao Maksoud. E a Vera…? Chamei-a pelo Nextel há cinco minutos e ela me respondeu: já te chamo! Estou falando com Nova York!”


E aí, quer nos contar a sua? É só ligar na redação… Até sábado que vem!

(*) Crédito da capa: Divulgação/Maksoud Plaza

(**) Crédito das fotos: Arquivo pessoal/Caio Caltaf

(***) Crédito da foto: Filó Silva

(****) Crédito da foto: Hotelier News