Construir e manter um bom relacionamento com investidores no mercado hoteleiro é fundamental para o sucesso e crescimento sustentável da propriedade. Não podemos desconsiderar que a base do desenvolvimento da hotelaria de bandeiras no Brasil se desenvolveu – e segue avançando – por meio da incorporação imobiliária, aparecendo a figura dos donos de flats, condo-hotéis e, nos últimos anos, de multipropriedade. E essa via de desenvolvimento se dá pela falta de incentivo ou subsidio em financiamento imobiliário para esse tipo de ativo.

Obviamente, não e só o acesso a melhores condições de crédito que justifica o desinteresse do investimento patrimonial. Agora, esse não é a pauta desse artigo. Enfim, a motivação desse novo texto é para ressaltar a importância do investidor hoteleiro e deixar algumas observações que entendo ser importantes na busca do melhor relacionamento possível com esse stakeholder.

Na sua grande maioria, o investidor hoteleiro não tem um conhecimento da nossa indústria e muito menos da complexidade da operação de hotéis. E isso exige de nós, gestores, muita paciência e transparência. Ouso a dizer que, além de administradores, devemos também desempenhar papéis de conselheiros e orientadores, sempre com humildade e sem soberba ou deboche. No entanto, só conseguimos desempenhar esses papéis quando temos a confiança e o respeito deles. Neste sentido, na minha avaliação, quatro fatores são fundamentais para criar laços sólidos nessa relação: entendimento das expectativas, transparência, presença e a comunicação eficaz.

É importante construir uma estratégia de relacionamento e estar disposto a personalizar sua relação de acordo com o perfil de cada empreendimento. Acredito que não devemos engessar ao padronizar a relação de prestação de contas e informações. Afinal, pode ter certeza que o gerente do XP Investimento não se reúne com seus diversos clientes com o mesmo discurso e formato de apresentação de resultados das respectivas aplicações…

Reuniões periódicas e atualizações detalhadas sobre o desempenho do hotel, bem como planos estratégicos futuros (constantemente revisados), devem ser compartilhados de maneira transparente. Informações objetivas, menos romantismo e mais números são dicas que entendo ser válidas. Muitas vezes, destacamos em reuniões valores de marca, reputação de administradora, estruturas corporativas e deixamos em segundo plano, ou pouco desenvolvemos, o empreendimento em questão, a rentabilidade desse investimento para esse negócio, sem falar de outras questões como a manutenção predial e a reputação do hotel.

Assim como muitos dos investidores desconhecem – e não querem saber – a complexidade e o risco inerente que o negócio hoteleiro que ele mesmo investiu possui, é também verdadeiro que muitos dos gestores não sabem ou ignoram o valor do patrimônio que estão administrando. Sempre falo que o nosso compromisso como gestor vai além do famoso GOP (Lucro Operacional Bruto, na tradução livre), inclusive indo mais além ainda do ano fiscal em questão, afinal a hotelaria é um dos poucos negócios que permitem a perpetuidade imobiliária de um ativo. E fica aí mais essas dicas!

Também é verdade que a gestão hoteleira profissional no Brasil, com exceção da Accor, começou no final dos anos 1990. Ou seja, talvez, só agora temos realmente um benchmark, um track record que permita ter uma geração de executivos realmente especializados atuando nessa indústria – toda ela sendo formada no mercado de trabalho dos últimos trinta anos. Arrisco a dizer que esse início deixou muito dos investidores arredios e desconfiados com esse negócio, vide o aparecimento do modelo de franquia e o surgimento de administradoras pequenas, regionais e locais.

Então, sim, operadoras levam práticas mais profissionais à gestão de hotéis. Agora, trata-se de um mercado novo. Os primeiros condo-hotéis, por exemplo, datam do final dos anos 1990. Ou seja, ainda vivemos uma curva de aprendizado (das duas partes) nesta relação e na entrega final propriamente dita.

Por isso, dou uma dica valiosa aos investiores. Não deixe de contratar um asset ou um conselheiro para ajudar a pensar fora da caixa e a trazer discussões saudáveis para o desenvolvimento do negocio. Preferencialmente, busque alguém especializado, que possa estar presente para ajudar no melhor entendimento, reduzir erros e potencializar acertos. E, veja, isso vale tanto para os bons, quanto para os maus momentos, quando é muito mais comum pensar nessa possibilidade. Isso porque um olhar externo especializado pode ajudar seu hotel a surfar melhor ondas positivas.

Enfim, maturidade e evolução sempre é bem-vinda – e para os dois lados. Agora, é fato que, sem o investidor, mesmo o leigo e desinteressado na complexidade dessa indústria, não teríamos 50% da oferta hoteleira existentes nos grandes centros e, consequentemente, centenas de milhares de empregos não seriam realidade hoje.

Para concluir, veja como os dois lados precisam ter muita paciência, respeito e confiança. Não é fácil para o gestor planejar nesse nosso Brasil com tanta insegurança jurídica, fiscal e contábil. Por aqui, essas condições mudam, vide a indefinição recente relacionada ao Perse, que gera insegurança e obriga hoteleiros a trabalhar com mais de um orçamento.

Que possamos ter dias melhores – e relacionamento mais sólidos entre as partes – para o bem da nossa indústria. Dessa forma, acredito que possamos perder menos profissionais talentosos que abandonam a nossa indústria e vão se desenvolver em segmentos mais consolidados que permitem um trabalho a médio e longo prazo. Mais ainda, quem sabe, possamos encorajar mais investidores qualificados para projetos de perfil patrimonial, permitindo trabalhos a médio e longo prazo.

Com mais de 20 anos de experiência em gestão hoteleira, Mateus Cabau acumula passagens por Marriot e Atlantica Hotels. Em 2013, mudou-se para os EUA, onde, entre outros projetos e posições profissionais, atuou como co-desenvolvedor da primeira unidade da Red Collection: o Spot X, que fica na região de Lake Buena Vista, em Orlando. Atualmente, por meio de sua empresa brasileira de consultoria, é responsável pela gestão da franquia do Comfort Hotel Santos, em Santos (SP). Cabau ainda realiza palestras e consultorias para hotéis.

(*) Crédito da capa: Arquivo pessoal