Está aí uma pergunta difícil de responder de bate-pronto. Em 2020, na primeira onda, havia muitas dúvidas, desconhecimento sobre a doença, desesperança, efeito manada e, claro, o medo da morte. Ao mesmo tempo, a hotelaria nacional acabara de encerrar um 2019 positivo, com as propriedades que trabalharam bem com caixas relativamente saudáveis. O ano virou, o otimismo estava renovado, mas a doença se descontrolou, tornando alguns meses mais letais do que trimestre e semestres inteiros. Hotéis e resorts voltaram a fechar, alguns para sempre. Você certamente já tem sua avaliação, mas, na sessão Opinião de hoje (26), convidamos Orlando Souza, presidente executivo do FOHB (Fórum de Operadores Hoteleiros do Brasil), para compartilhar também a dele. Leia até o final!


Gosto sempre de assumir uma postura racional para se analisar cenários. O primeiro requisito é, sem dúvida, nunca julgar o passado com o olhar do presente. Ou seja, o que nos parece óbvio hoje não nos era em outro momento. O segundo critério é sempre aprender com as experiências vividas, evitando-se repetir erros e, por fim, trabalhar sempre em cima de números. Afinal, especulações não podem ter a mesma relevância que dados.

Ainda que a possibilidade de uma pandemia e seu efeito dramático na economia global já tivesse sido aventada por economistas, cientistas e até empresários, como Bill Gates, não se mostrava viável criar protocolos detalhados para tal fatalidade. Um exemplo recente e preciso de que nem sempre uma operação bem desenhada pode ser colocada em prática se viu com a morte do Duque de Edinburgh. Seu funeral, planejado e até ensaiado por anos, não pôde ser posto em prática no momento de seu falecimento.

Não se pode esquecer que o planeta tivera em anos anteriores as ameaças da gripe aviária, do ebola e outros vírus letais. Todas muito bem controladas. Do mesmo modo, quando se anunciou as primeiras vítimas fatais da Covid-19, governos e empresas, em maior ou menor grau, buscaram agir. É claro que ações desarticuladas em várias instâncias, segmentos econômicos e nações prejudicaram o combate inicial.

Mas tal desorganização não ocorreu na hotelaria brasileira. Assim que o sinal amarelo foi acionado, uma série de reuniões diárias com as associações de turismo foram realizadas. Os objetivos eram os mais diversos: desde troca de informações a partir de grandes redes hoteleiras que tinham operações na China, até a criação de protocolos de segurança para hotéis no Brasil, passando por planos de contingência para preservar empregos e a saúde financeira das empresas.

No caso do FOHB (Fórum de Operadores Hoteleiros do Brasil), as reuniões com todos os CEOs das redes associadas também eram praticamente diárias. Não havia concorrentes, apenas aliados. Todos juntos pensando no segmento como um todo. Eram convidados também lideranças das maiores agências de viagens e operadoras para entender como caminhava a demanda. Ficou claro para todos que a hotelaria corporativa sofreria mais rapidamente o efeito da pandemia e sua recuperação seria mais lenta, ao contrário de crises anteriores, em que empreendimentos de lazer sempre eram mais afetados.

 

Orlando Souza - Opinião_ primeira ou segunda onda

“Primeiramente porque ela foi mais letal. Em segundo lugar, porque muitas pessoas, com a possibilidade de vacinação próxima, preferiram a reclusão maior no espírito ‘já que falta pouco, melhor evitar toda e qualquer viagem’ e por fim, os hotéis cujas finanças já estavam depauperadas sofreram um novo golpe.”

Orlando Souza, presidente executivo do FOHB

 

Houve cartas abertas ao governo cobrando ações, pressão para desoneração temporária dos hotéis, flexibilidade nos contratos de trabalho para se evitar demissões e solicitação de facilidade de acesso ao crédito para que não houvesse quebradeira. De toda maneira, havia na primeira onda uma esperança de que a situação seria passageira com melhoria no início de 2021. No segundo semestre de 2020 muitos hotéis de lazer, em um raio de 300 quilômetros dos grandes centros urbanos começaram, a partir de rígidos protocolos de segurança e redução da oferta (a ocupação máxima possível girava em torno de 75% da ocupação total dos empreendimentos), a apresentar resultados muito favoráveis. Certos hotéis, inclusive, tiveram os melhores resultados financeiros da história.

A segurança dos hotéis levou muita gente a retomar, inclusive, as viagens de avião. A promessa da chegada das vacinas, a reabertura gradual dos comércios e dos escritórios criou uma sensação de retomada e esperança de que o retorno à normalidade estava próximo. É claro que a hotelaria corporativa seguia combalida, com recursos escassos, uma vez que as viagens de negócios ainda não seguiam o mesmo ritmo de recuperação e os eventos, como grandes feiras, congressos e seminários, que são indutores importantes de demanda, não se dariam mais em 2020.

No entanto, as novas cepas, muito mais contagiosas e mortais, o descuido da população, sobretudo das populações mais jovens, no final de ano promoveram uma explosão de casos gerando a segunda onda, muito pior que a primeira.

Primeiramente porque ela foi mais letal. Em segundo lugar, porque muitas pessoas, com a possibilidade de vacinação próxima, preferiram a reclusão maior no espírito “já que falta pouco, melhor evitar toda e qualquer viagem” e por fim, os hotéis cujas finanças já estavam depauperadas sofreram um novo golpe.

No entanto, os dados dos hotéis mostram que a recuperação poderá vir mais rápida do que se imagina, mesmo com uma segunda onda próxima de um tsunami. Isso porque números internacionais apontam uma capacidade reativa acelerada a partir das vacinações e porque houve um aprendizado que custou caro mas que aponta um futuro mais seguro.

(*) Crédito da capa: geralt/Pixabay

(**) Crédito da foto: Divulgação/FOHB (Fórum de Operadores Hoteleiros do Brasil)