No último mês, fiquei sabendo de um suicídio de um gestor geral de um hotel por um colega que atua no setor. Infelizmente, este tipo de notícia não é inédita nem novidade, mas também lamento não poder afirmar se muito ou pouco, pois temos pouquíssimos estudos sobre o tema no setor. Neste caso, quando soube dos detalhes, lamentei ainda mais, pois os sinais mostravam que poderia ser evitado. Devido à pressão por resultados, o gestor trabalhava muitas horas a mais, cada vez mais apresentando sinais de burnout e depressão. Na hotelaria, ainda é “silenciosamente” valorizado pelas gestões este comportamento, sendo considerado normal para a maioria. E me levou a refletir porque as ações focadas na saúde mental no trabalho são ainda raras na hotelaria.

O cuidado com a saúde mental deveria ser uma das prioridades no setor, visto que é uma atividade desgastante para a maioria dos trabalhadores. A maioria que identifica o problema e busca ajuda, faz na sua vida pessoal, ainda sofrendo críticas se precisar de um afastamento do trabalho para se cuidar. E sendo bem sincero, como geralmente sou nos meus textos, não seria difícil identificar, principalmente nas grandes redes, comportamentos preocupantes, como troca de e-mails, mensagens de WhatsApp com frequência em horários inadequados ao horário de trabalho, queda da performance no desempenho de bons trabalhadores, etc.

Claro que o setor terá momentos de exceção para trabalhar a mais, mas a exceção não pode virar regra. E outra crítica que faço é que nos grandes eventos da hotelaria não se fala sobre o tema , os temas são na maioria das vezes ligados a economia, performance, resultados e poucas vezes a pessoas, aos cuidados com os trabalhadores e ainda ficam no “looping eterno” de tentar entender a falta de talentos e mão de obra no setor.

Para quem leu este texto até agora pode estar se perguntando o que tem a ver com diversidade e inclusão, tema dos meus textos aqui no Hotelier News, e eu afirmo que tudo. É praticamente impossível ter inclusão e diversidade bem sucedida de mulheres, negros, LGBTQ, PCD’s, indígenas e outras minorias sociais sem um ambiente saudável mentalmente para trabalhar. E não adianta ações superficiais, pois o problema de os ambientes na hotelaria serem tóxicos devido à pressão por resultados já existe, portanto é preciso construir um local saudável e seguro para todos trabalharem, com ações de curto, médio e longo prazos, em parceria com consultorias especializadas, com acompanhamento constante e principalmente o letramento da média e alta gestão. Os gestores e lideranças são fundamentais para construir e transformar o ambiente de trabalho, pois eles lidaram no dia a dia com os desafios desta construção e consolidação do mesmo.

Preciso reforçar também que manutenção de lideranças ou gestores tóxicos na maioria das vezes é o verdadeiro motivo do prejuízo, já que ele é o principal causador da tão debatida “falta de talentos”. Este perfil de gestor gera rotatividade constante de trabalhadores, atrasa processos devido ao excesso de demanda de trabalho para os liderados, é permissivo, omisso ou até cúmplice de assédios ou agressões, o prejudica diretamente na performance da equipe.

Poderia colocar diversos dados, estudos, análises dos benefícios do verdadeiro investimento na saúde mental dos trabalhadores no mercado corporativo, sendo que nas empresas com maior investimento já existe o cargo de CHO (Chief Happiness Officer), em tradução livre, ” Chefe de Felicidade no Trabalho” , porém na hotelaria precisamos focar em começar a fazer o básico neste tema para chegar neste ponto. Ainda se confunde cuidado com o trabalhador uma placa de funcionário do mês, um bolo para aniversariantes, as famosas avalições de desempenho ou de clima do trabalho que geralmente são apenas com foco para ganhar o Great Place To Work, que é importante, mas precisa acontecer por verdadeiramente refletir o que é o ambiente de trabalho e não por trabalhadores sofrerem uma ” pressão velada ” para avaliar bem a empresa.

A reflexão que desejo fazer neste texto é para olharmos para saúde mental na hotelaria com humildade e sinceridade. Ouço muitas lideranças do setor repetindo que o mais importante são “pessoas” , mas eles têm cuidado bem delas? Fica a pergunta. Só ações efetivas trarão respostas.

Hubber Clemente é fundador da startup Afroturismo HUB, focada na inclusão e diversidade racial no turismo, atuando a mais de três anos com o tema. Hoteleiro , com mais de 25 anos de carreira no setor, com atuação profissional na Accor, Blue Tree Hotels , Maksoud Plaza, Decolar e outras grandes empresas do turismo, hospitalidade. Especialista em vendas e marketing, com formações em Gestão de Viagens e Eventos Corporativos, Big Data, Design Thinking, Diversidade & Inclusão e LinkedIn Creator Acelerado.

(*) Crédito da capa: Arquivo pessoal