Contra a maré, Salinas investe com olhos no mercado doméstico
6 de setembro de 2011Apartamento do Salinas do Maragogi,
devidamente reformado
(fotos: Dênis Matos)
devidamente reformado
(fotos: Dênis Matos)
O cliente estrangeiro foi proscrito. O preço do aéreo fez com que o brasileiro cruzasse a fronteira em nome do turismo internacional. A valorização do Real afastou a entrada de hóspedes de outras nações. Há ainda uma campanha militar, espécie de cruzada no sentido original do século 11: os resorts caribenhos se tornaram bárbaros infiéis; e os hoteleiros brasileiros ergueram suas espadas e escudos nesta peleja.
São essas e outras especulações que têm fomentado a máxima nietzschiana da tragédia como criadora da forma e feito com que os hotéis brasileiros – principalmente os resorts – busquem alternativas à perda de turistas do mercado internacional. Remar contra a maré, ainda mais em se tratando de resorts de praia, é tarefa comum na hotelaria, a exemplo do caso do grupo Salinas.
A tábua de salvação para os resorts nordestinos tem sido o mercado doméstico. Neste cenário que se desenrola com ar vago, os dois resorts da rede – o Salinas do Maragogi All Inclusive Resort e o Salinas de Maceió Beach Resort, ambos localizados no litoral alagoano, em Maragogi e Maceió, respectivamente – passam por reformulações.
No primeiro ocorre reforma de toda uma ala de apartamentos, com investimentos que atingem os seis dígitos – R$ 300 mil – e vão dar outras linhas a 108 quartos – mais de 50% do total de 236 UHs. Caçula do grupo, inaugurada no final de 2008, a unidade Maceió abriu por este mês o Vida Mar Spa, que fica à beira da praia de Ipioca, e deve, até o final de setembro, cortar a fita da extensão da área de tratamento, com um espaço amplo de 113m², junto ao fitness center, congregando pilates, sala de banho, cabines para terapia e afins. O aporte foi de mais R$ 120 mil no spa.
As peças do repertório vão além do investimento, e há muitas ações voltadas à reestruturação de processos administrativos, como gostam de chamar nos manuais de Administração. Conforme o Hôtelier News apurou, são serviços agregados, projetos de Marketing, cautela quanto algumas medidas ainda pouco funcionais à hotelaria, melhor relacionamento com o mercado nacional e outros muitos pormenores que norteiam o grupo Salinas nesta atual conjuntura do mercado hoteleiro.
Por Dênis Matos*
O Vida Mar do nome não é ao acaso:
da área de espera é possível se
deslumbrar com a praia de Ipioca
deslumbrar com a praia de Ipioca
“Não sentimos a perda do internacional, pois suprimos com o mercado nacional”. A declaração de Ricardo Almeida, gerente geral do Salinas do Maragogi e do Salinas de Maceió, dá indícios de que as coisas têm caminhado. O titereiro dos resorts do grupo diz que, antes deste período de valorização da moeda brasileira, a balança cravava os números numa média de 85% do público doméstico e 15% vindos de outras nações. Mas o desenho agora é outro, e 100% dos hóspedes são provenientes do maior País da América do Sul.
A relação com o turista latino perdurou por muito tempo no Salinas. Nos apartamentos, inclusive, há canais em língua espanhola, voltados normalmente a programas jornalísticos que, num passado recente, atendiam a argentinos, chilenos, uruguaios e, usualmente, alguns europeus. Dada a natureza do mercado, as coisas se modificaram.
Parte disto foi o serviço de all inclusive agregado há três anos no resort de Maragogi, que ofecere de uísques nacionais a porções de camarão à beira da piscina. “O all inclusive“, diz Almeida, “mudou a percepção dos clientes”. Ele afirma ser um serviço dedicado à família, uma vez que os pais não se preocupam com os gastos dos pequenos com sorvetes, guloseimas e afins. “Isto virou a ocupação, que era de 42% e saltou para 70% na média anual”, garante.
Comprimindo os lábios quando questionado sobre a média de ocupação geral dos resorts no Brasil – na casa dos 49% em 2010, segundo a Resorts Brasil -, o gerente dá um sorriso aprazível ao felicitar-se por ter passado da barreira dos 60%. “O all inclusive contribui para isso. Claro que tivemos que adaptar algumas coisas, instalar bares no entorno das piscinas e estruturar a equipe”, comenta.
Com números que fazem sorrir, o grupo tem ambições de fazer o mesmo sistema no Salinas de Maceió? “O centro da cidade é muito próximo, as pessoas gostam de sair para comer fora, não há pretensão de fazermos o mesmo que em Maragogi”, rememora.
O equivalente à comilança desenfreada na unidade Maceió, inclusive, é um serviço pouco modesto, com seis refeições por dia. Sim, os adoradores da atividade gastronômica contam com café da manhã, almoço, jantar e mais três snack times.
Ricardo Almeida, gerente geral do
Salinas do Maragogi e do Salinas de Maceió
(foto: divulgação)
All inclusive e desperdício
Em meio à rotina alimentícia que chega a ser antidoméstica, notadamente, há desperdício. Ricardo Almeida diz ser cultural esta questão, coisa de brasileiro perdulário. “É algo difícil de controlar. As pessoas colocam no prato e não comem. Inevitavelmente, alguém vai ter que pagar essa conta”, rememora o gerente.
As bebidas na unidade da capital alagoana não estão inclusas na diária. Fernando Santos, gerente Operacional do Salinas de Maceió, explica que, por isso, o preço da tarifa é um pouco menor. “A receita da bebida acaba sendo pouco representativa pelo fato de as refeições estarem inclusas”, esclarece. Ainda assim, Santos diz que cerca de 40% da receita oriunda da diária do hóspede é destinada à área de A&B.
Em se tratando de números, os do resort de Maceió têm se mostrado positivos. Segundo o gerente Operacional, a ocupação só faz crescer. Em 2009, ano de debute na contagem, já que o hotel foi inaugurado em dezembro de 2008, a média chegou aos 40%. Em 2010, pulou para a casa dos 50% e, para este ano, a previsão é que o percentual atinja os 58%. Até agora, contabilizando os sete primeiros meses de 2011, o acumulado já chega aos 52%.
Fernando Santos, gerente Operacional do Salinas de Maceió
Mais atrativos
O cenário, que vem como um crescendo, fez com que a gestão tomasse algumas medidas – além do já citado spa. Em janeiro último, uma nova ala com 20 apartamentos foi inaugurada, e a unidade agora contabiliza 151 UHs. Fernando Santos conta que um terreno ao lado foi comprado recentemente e o intuito é que, no primeiro semestre de 2012, uma quadra poliesportiva se materialize no espaço.
É evidente que as peripécias para atrair mais clientes estão alinhadas à área de Marketing do grupo Salinas. Ricardo Almeida diz que uma empresa especializada foi contratada para fomentar as vendas, juntamente com as equipes mantidas em outras praças do País – Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Brasília e região Sudeste. E ele dá o laço: “Temos nos dedicado muito ao trabalho com as redes sociais. Ferramentas como o Booking.com também têm viabilizado muitas vendas”.
Todavia, a outra espécie de quimera do novo milênio – leia-se, compras coletivas -, parece não passar aos olhos do departamento de Marketing do Salinas. Almeida, com olhar reprovadoramente notório, faz uma leitura de que o mercado continua muito centralizado nas operadoras, o que ele vê como impeditivo à difusão de outros canais de distribuição.
“É tudo muito incipiente ainda, vejo algumas armadilhas aí”, destaca o gerente geral, referindo-se ao fato de o preço da diária média comercializado nas compras coletivas estar muito aquém do valor real, o que pode vir a denegrir o produto.
A essa altura da vida, Ricardo Almeida precisava deixar de lado o quórum de jornalistas que ali o interpelavam. Passa por um gato rajado na soleira da porta do restaurante e some corredor à frente.
Fernando Holanda, gerente de
Marketing do grupo Salinas
Marketing do grupo Salinas
Mais tarde, coisa de nove da noite, era Fernando Holanda, gerente de Marketing do grupo Salinas, que continuaria a dardejar contra os sites de compras. Para ele, buscar alternativas nas compras coletivas é uma medida errônea, argumentando que os turistas estrangeiros bandearam-se para outros mercados há tempos – e, notadamente, planos para minimizar este cenário vêm sendo desenvolvidos de outras épocas.
“Hoje nosso mercado é o doméstico”
“A valorização do Real, a crise econômica mundial de 2008, tudo isso já vêm refletindo uma mudança no perfil do hóspede. Na década de 1990 existiam muitos estrangeiros, hoje, fundamentalmente, nosso mercado é o doméstico”, assegura. “O Brasil é um País continental, por que não ser um país onde seu próprio povo viaja por ele?”, indaga Holanda.
E o jargão de que a classe C iria suprir este buraco? “É uma incongruência sem tamanho esta leitura. Uma família que ganha R$ 2 mil por mês não consegue pagar uma tarifa de resort por quatro dias, é complicado”, avalia o gerente de Marketing. Sob seu óculo, o “erro” reside em tentar vender para a classe cuja renda familiar varia entre quatro e dez salários mínimos, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), sem ao menos entendê-la. “Vender para a classe C virou modismo”, ataca, fazendo menção de que, por enquanto, o resort continua sendo produto mais próximo das classes A e B.
Salinas de Maceió
Febre caribenha
Outro tema que desperta a aura de antipatia dos hoteleiros nos resorts é a questão do Caribe. Num outro momento, o debate é retomado com Ricardo Almeida, que articula seu o raciocínio sobre o tema apondo evidências empíricas irrefutáveis: “Nós podemos enxugar tudo para tentar competir apesar de ser quase impossível competir, eles têm carga tributária menor, mão de obra mais barata e hotéis com no mínimo 500 apartamentos, tudo facilita”.
O gerente geral diz que as unidades Salinas são organismo imune à febre caribenha – haja vista as ações que tem fomentado o mercado doméstico. Os cruzeiros também, segundo ele, ocupavam o lugar de concorrentes dos resorts, o que não ocorre mais com muita frequência – ao menos no grupo. “O resort é um navio fincado na terra, mas com muito mais opções”, opina com ar de quem descansa à sombra de uma mangueira.
Mais do que deleites gastronômico, estratégias de vendas, acomodações confortáveis, piscinas climatizadas e, presumivelmente, o desconcertante mar alagoano são necessários para manter os bons níveis de ocupação nesta nova fase. Almeida menciona que serviços têm sido agregados para que a procura pelos resorts continue. Cita os shows musicais que acontecem copiosamente nos hotéis, com apresentações folclóricas, forró pé de serra e os tradicionais encontros de violão e voz.
Outro ponto é que os pacotes somente têm sido comercializados com estadia mínima de três dias, para que se chegue num preço mais atrativo tanto para o cliente quanto para o hotel.
Vilma Stimer, nutricionista que administra o Spa Vida Mar, e
Rosiane Venâncio, terapeuta que elaborou o menu de tratamentos
Rosiane Venâncio, terapeuta que elaborou o menu de tratamentos
Sustentabilidade
Bate continência nesta lista a questão da sustentabilidade – ferramenta primeira do empresariado nos últimos anos. Ricardo Almeida diz que todo um trabalho tem sido desenvolvido, coisa que ele afirma ser até “ideológica” para os investidores.
Bate continência nesta lista a questão da sustentabilidade – ferramenta primeira do empresariado nos últimos anos. Ricardo Almeida diz que todo um trabalho tem sido desenvolvido, coisa que ele afirma ser até “ideológica” para os investidores.
O óleo de cozinha – espécie de cicuta na contaminação de córregos, rios e mares – é reciclado por uma empresa especializada. O lixo é separado, sendo que a parte orgânica é retirada e utilizada na alimentação de porcos – que residem numa fazenda próxima à unidade Maragogi e que é de propriedade dos investidores. “A questão da preservação agrega valor ao produto”, discursa o gerente geral.
À direita da imagem, bloco com 36 apartamentos
que está em reforma e deve ficar pronto nesta quinzena
que está em reforma e deve ficar pronto nesta quinzena
Na lista, figura também um projeto para a construção de creche na cidade, voltada a atender crianças carentes da região. Há na pauta ainda a reforma de igrejas locais, para que se mantenha a arquitetura original do entorno.
A reutilização da água ainda é tratada com certa truculência nos resorts Salinas. Almeida diz que o processo ainda não é feito, mas adianta que estudos já estão sendo feitos para que se levante o custo do projeto.
Serviço
*A equipe do Hôtelier News viajou a Alagoas a convite do Grupo Salinas.