Ele é – e sempre foi e será – a cara do Hotelier News. E, óbvio, não poderia ser diferente. Por isso, de início, Peter Kutuchian hesitou em fazer parte da sessão Três perguntas para, mas acabou vencido pela persistência do escriba que vos fala. Alegava, em parte com razão, que não fazia sentido o CEO de um veículo ser entrevistado pelo próprio canal que liderava. Agora, veja bem, Kutuchian não é “apenas” dono de um meio de comunicação que fala sobre um determinado setor. Ele, de fato, tem bastante propriedade para falar e opinar sobre o assunto. E sabe por que? Bem, porque ele é um hoteleiro de coração!

Sim, pouca gente sabe, mas o fundador do Hotelier News trabalhou bastante tempo na hotelaria. “Comecei no Maksoud Plaza como recepcionista, em 1991. Depois, fui para o antigo Sheraton Mofarrej (atual Tivoli Mofarrej São Paulo) para ser caixa da Recepção, indo trabalhar, na sequência, com time sharing“, relembra Kutuchian. “Por último, atuei na Meliá Hotels International, inicialmente como gerente noturno do atual WTC para ser, na sequência, gerente geral e implantar o antigo TRYP Itaim, que hoje é um Double Tree by Hilton administrado pela Atlantica. Por fim, implantei e abri o atual Slaviero Essential São Paulo Moema, que era Meliá na época”, completa.

Após um período trabalhando com turismo receptivo, foi diretor comercial de uma empresa da então novidade chamada reservas online. Ali, mesmo que ele não admita, foi germinada a sementinha que deu origem a essas linhas, páginas e milhões de fotos que vocês já viram e leem diariamente por aqui ao longo de quase 18 anos. “Oficialmente”, a motivação principal para criação desse portal é outra: “Tudo tem relação com o empreendedorismo e a vontade de ver a hotelaria crescer no Brasil”, alega.

Bem, como amigo e parceiro de negócios, não tenho motivos para duvidar. Agora, o que não tenho nenhuma resistência em admitir é sobre seu grande conhecimento do setor hoteleiro. E é justamente por isso que ele é nosso convidado na sessão de hoje (20). Então, recomendo lerem até o fim. Há bons insights para hoteleiros de todas as idades e fases na carreira. Boa leitura!

Três perguntas para: Peter Kutuchian

Hotelier News: A pandemia impactou bastante a hotelaria a praticamente obrigou o setor a fazer uma série de adaptações. Na sua visão, e pensando nos diferentes departamentos de um hotel, quem mais ganhou com isso?

Peter Kutuchian: Na verdade temos, sempre que possível, olhar à frente. Acredito que esse seja um grande diferencial para se obter o sucesso no ato de empreender. Antes de responder à pergunta, entretanto temos que analisar o seguinte: no momento, toda a hotelaria está passando por um momento difícil, uma crise sem precedentes. Já temos em nosso histórico, contudo, um aprendizado importante dessa crise: o lazer veio com tudo e, assim que as restrições caírem definitivamente, esse segmento é o que precisa ser trabalhado. Com isso, em consequência, muitas das experiências no segmento precisam ser revistas. A gastronomia, sem dúvida alguma, é uma das que devem ser melhor trabalhadas pela hotelaria.

Até aqui, salvo algumas ações de poucas unidades, o departamento de A&B sempre foi visto como um mal necessário. Os hotéis sempre pensaram em seus restaurantes para atender à necessidade do café da manhã e dos possíveis eventos atendidos pelos empreendimentos. Quando a pandemia chegou, o delivery teve crescimento significativo e as dark kitchens se proliferaram pelas grandes metrópoles. De acordo com o site Statista, o Brasil foi destaque em 2020 no segmento, na América Latina. Nosso país foi responsável pela metade do mercado (48,77%). Em seguida, México e a Argentina, com cerca de 27,07% e 11,85%, respectivamente. Uma diferença de quase 100% do primeiro ao segundo colocado. Os hotéis por sua vez, se tivessem também o DNA da gastronomia em vez de apenas se preocuparem em vender quartos, teriam com certeza se aproveitado melhor dessa situação. Ainda há tempo para virar essa chave. Basta apenas focar na gastronomia tanto quanto se foca na hospedagem.

HN: E para os hoteleiros, quais os principais ensinamentos que ficam?

PK: Levando-se em conta que a experiência é o alvo do público consumidor (já há algum tempo), os hoteleiros precisam mais do que nunca preparar seus produtos para atender à demanda, que vai voltar. Neste sentido, é fundamental capacitar as equipes, que na maioria dos casos serão refeitas, sempre entendendo que delegar em vez de centralizar as decisões são premissas básicas da nova hotelaria que está por vir. Sim, sem dúvida o setor vai mudar, principalmente a categoria midscale, cuja percepção de experiências oferecidas sempre foi a mais achatada. Se pensarmos no segmento corporativo então, sua sistêmica sofrerá grandes alterações. Outro ponto importante é a digitalização, que caminhou 100 meses em 10. Os empreendimentos que não investirem no digital, sucumbirão suas hospedagens às formas das antigas pensões da época que nossos avós viajavam à praia. RM (Revenue Management) se tornou uma obrigação, assim como o pricing. Nesse sentido, não poderia deixar de citar a Escola para Resultados, criada há quase dois anos e que vem oferecendo cursos e workshops sobre esses e diferentes temas. É o momento de se aperfeiçoar e entrar de vez no século 21.

HN: Você enxerga alguma tendência ou oportunidade que a hotelaria pode aproveitar para ter uma retomada mais acelerada? Qual?

PK: Como disse acima, as experiências precisam ser revistas. Os hotéis podem, por exemplo, entrar no segmento das tematizações. Todo o Brasil é riquíssimo na cultura em suas diversas regiões. Se vou para a Nordeste, não desejo ficar em um hotel cuja decoração me faz lembrar de um quarto de outra cidade da região Sul, por exemplo. Quero experimentar sabores e cores, viver a experiência do destino o tempo todo. Em São Paulo, por exemplo, já poderíamos ter um empreendimentos com o tema do rock, do samba, da moda, da gastronomia. Falamos do Sul e lá existem poucos hotéis com o tema do vinho. No Rio de Janeiro, o Fairmont Copacabana utilizou o tema da Bossa Nova e tem feito muito sucesso, principalmente para o público internacional, na época pré-pandêmica. Além disso, existem os segmentos da música, da diversidade sexual e dos apaixonados por esportes, automobilismo, brinquedos, coleções… Tem tanto segmento para trabalhar. É só ser criativo, não é? O momento é esse, de estar preparado e dar a volta por cima.

(*) Crédito da foto: Arquivo pessoal/Luiz Vendramini