Com avanço da crise pelo Brasil, o segmento hoteleiro se viu obrigado a inovar e pensar em soluções para aumentar o caixa. Alternativas como o day use para hóspedes que buscam escapar da quarentena vêm auxiliando no processo de retomada. Nesse contexto, surgiu ainda a ideia dos room offices, quartos de hotéis adaptados em formato de escritório.

Pioneira na adoção do modelo por aqui, a Accor lançou pacotes com diferentes possibilidades de uso. “Temos três possibilidades: day use, semanal e mensal. Não temos um que se sobressaia ao outro, vai mais da característica de cada cliente e da sua necessidade”, conta Olivier Hick, COO das marcas midscale e econômicas da Accor no Brasil.

Para o lançamento, Hick conta que o produto foi analisado por colaboradores e ainda houve uma pesquisa com clientes para avaliar a aceitação do público. O levantamento foi feito com mais de 530 hóspedes de São Paulo e região metropolitana.

Quando questionados se preferiam trabalhar fora do ambiente doméstico, 67,33% dos entrevistados responderam que sim. Já 47,16% afirmaram que o motivo de sair de casa para trabalhar seria contar com uma estrutura adequada de escritório. Quando perguntados se considerariam usar um quarto de hotel adaptado como escritório privativo, 87,22% deram feedback positivo. Para 61,36% ter um alto padrão de higiene e sanitização é o diferencial mais importante. Outros 56,25% colocaram o wi-fi de alta velocidade como item de maior relevância. “Ou seja, o produto é uma necessidade do nosso cliente”, ressalta o COO.

A marca hoje disponibiliza o serviço em 43 hotéis de São Paulo e em outros 150 endereços, incluindo no litoral e interior paulista, além de outras regiões do Brasil. Com o sucesso dos room offices, outros hotéis também recorreram a alternativa.

É o caso da Guest Urban, que percebeu uma queda nas reservas a partir de março e, com o decreto da quarentena, registrou muitos cancelamentos. “Nesse momento estávamos zerados em termos de ocupação em abril, tudo que tínhamos estava cancelado. Foi quando começamos a pensar e entender o que era a pandemia, visto que ninguém nunca passou por isso antes. Começamos a pensar em produtos que poderíamos trazer. Foi quando surgiu a ideia do room office, em meados de maio. Começamos com o investimento e iniciamos ao fim de junho”, explica Demian Figueiredo, co-fundador e CEO da empresa.

E o retorno veio rápido. Em julho, a venda do serviço já representava 30% do faturamento. “Apesar de a receita do mês ser baixa, devido à pandemia, sem o room office seria ainda pior”, comenta Figueiredo.

room office - medida paliativa ou a longo prazo - olivier hick

COO da Accor afirma que a rede avalia manter o serviço mesmo após a pandemia, dada a aceitação

Room Office: vale o investimento?

Pensando em metas a curto e longo prazo, o projeto aparece primeiro como um método turbinar os machucados caixas dos hotéis. “É uma reação inteligente e oportunista, para combinar espaço deixado ocioso em função da pandemia (quartos de hotéis), e necessidade de ambiente próximo do domicílio de profissionais sem acesso ao seu local habitual de trabalho”, analisa Roland Bonadona, sócio-fundador da Bonadona Hotel Consulting.

O executivo ainda destaca que a vantagem é que, se realmente “pegar”, o produto ajudará a aumentar a renda e reduzir prejuízos dos donos de hotéis. Caso o contrário, não terá consequências graves, pois o custo de transformação é limitado e sobra espaço para demanda hoteleira convencional. “Ainda é cedo para dizer se vai funcionar ou não, porque ainda existem mudanças e transformações em curso. Não tem como tirar conclusões categóricas”, avalia o ex-presidente da Accor.

Com o êxito do produto, a rede francesa avalia manter o serviço mesmo após a pandemia. “Estudamos no momento a possibilidade de incluir esse serviço para todas as novas aberturas, com um novo padrão de nossas marcas” revela Hick.

Já a Guest Urban ainda não definiu qual será o futuro dos room offices. “Como não sabemos o que é o novo normal, estamos em stand-by. Se ele se provar viável, mantemos. Se demonstrar que a hospedagem vai voltar mais forte do que ele, volto para hospedagem. Vamos acompanhando mês a mês”, pontua o CEO.

Se há ainda dúvidas se vale a pena o investimento, Bonadona recomenda um cálculo simples. “A margem bruta sobre a receita de aluguel do escritório deve ser na faixa de 85%. Diante de uma taxa de ocupação limitada, acredito que já deve compensar o custo de transformação. Como a receita varia segundo o prazo de locação, e não há um número exato de diárias, é bem fácil de calcular caso a caso”, explica.

room office - medida paliativa ou a longo prazo - roland bonadona

Bonadona afirma que a solução é inteligente; cálculo sobre efetividade do investimento é simples

Perfil do consumidor

Em relação ao público que procura esse tipo de serviço, existem perfis variados. “Hoje a demanda para office é o que a gente tinha imaginado: o executivo, o freelancer que vem fazer um trabalho, uma apresentação, mas também temos outros tipos de clientes”, relata Figueiredo. “A exemplo de professores que vêm dar aula online e precisam de um lugar mais tranquilo, que não seja interrompido. Ou até mesmo porque precisa de uma internet mais potente”, complementa.

O executivo relata que há ainda médicos que atendem remotamente, agendamentos de reuniões para quem precisa de encontros presenciais e acaba recebendo as pessoas no hotel. “E também pessoas com canais online como YouTube e IGTV do Instagram, que vêm gerar conteúdo utilizam o room office para isso”, comenta o CEO da Guest Urban.

No caso da Accor, também há uma diversidade no público que está aderindo ao produto. “Temos desde uma pessoa que mora perto de um hotel e precisa de uma solução rápida e de curto prazo por algum motivo específico, até quem está neste período de home office, mas não tem um bom ambiente em casa para trabalhar, e escolheu nossos hotéis. Também temos recebido viajantes que, além de se hospedarem, alugam os espaços durante a estadia”, finaliza Hick.

room office - medida paliativa ou a longo prazo - demien figueiredo

Figueiredo conta que os offices passaram a representar 30% do faturamento da Guest Urban

(*) Crédito das fotos: Divulgação