O impacto da pandemia no primeiro trimestre foi sentido pela população brasileira. Com a volta das restrições na maioria dos estados e as dificuldades no mercado de trabalho mantidas, a renda média domiciliar per capita (por pessoa) sofreu queda de 10%. O valor, ante igual período em 2020 (R$ 1.185), foi para R$ 1.065. É o quarto trimestre seguido que este indicador tem redução, quando comparado anualmente.

Os dados foram divulgados por Daniel Duque, pesquisador do Ibre-FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas). Em entrevista à reportagem do Hotelier News, Mariana Aldrigui, presidente da FecomercioSP e professora de Turismo da USP (Universidade de São Paulo), afirmou que a retração pode significar aumento na demanda reprimida da atividade turística.

Isso por consequência, pode ampliar o número de meses nos quais o setor verá alta ocupação nos segmentos no pós-pandemia. Na prática, em sua visão, significa que os índices maiores e positivos podem não ter a efetividade esperada no quadro da recuperação.

“É preciso analisar as questões de forma realista e técnica. O fato do consumidor médio ter sua renda reduzida faz com que previsões para o período de retomada se estiquem. Neste cenário, as viagens vão para o último lugar na fila de prioridades dessa classe média. As pessoas ficam mais pobres e priorizam-se os gastos de primeira necessidade, tais quais alimentação, moradia, locomoção etc”, explica a especialista.

Além da remarcação de viagens, Mariana afirma que pode existir redução no padrão das viagens em todos os quesitos. O que seria uma viagem de 15 dias, por exemplo, pode ser reduzido à metade. A hospedagem em hotel upscale é alterada para econômico. É um efeito dominó que começa na diminuição da renda individual e chega à queda do faturamento turístico em todas instâncias.

Viagens domésticas

Contudo, ainda existe luz no fim do túnel, mesmo que ainda distante. De acordo com Mariana, com a série de barreiras impostas ao turista brasileiro, é a chance do mercado doméstico trabalhar bem o Marketing dos destinos e reverter isso em fluxo de pessoas.

“O apelo dos aparatos turísticos nacionais deve ser ainda maior agora. As viagens internacionais estão paradas por tempo indeterminado e é uma imensa oportunidade de controlar preços e mostrar o potencial que temos. Isso inclui, principalmente, aqueles que não tem o costume de consumir o turismo brasileiro”.

Para ela, outro fator a favor do Brasil é o fato do país não exigir quarentena ou o viajante correr o risco de não ter voo de volta para casa. A situação flutuante preocupa turistas e pode captá-los para locais mais próximos de suas casas (staycation).

Segmento corporativo

A realidade ainda é complicada, apesar da Abracorp detectar o ímpeto para viagens das empresas em pesquisa recente. Mariana relembra que a maioria das empresas cortou custos de viagens e investiram em trabalho remoto. Por conta disso, a compensação disso e o retorno da atividade não é uma realidade para 2021, na visão dela.

“Não nos deixemos envolver pela euforia, pois o cenário é nebuloso. O momento é de estratégia e adaptação, principalmente em segmentos mais prejudicas do turismo. O setor corporativo ainda dependerá da saúde das companhias, que será gradativo”.

E o PIB?

Na visão da presidente, o crescimento retratado na previsão do PIB para 2021, registrado na última semana, não pode ser entendido como recuperação econômica à população. “O aumento na expectativa deste índice corresponde ao setor de commodities, que pouco interfere no bolso do população e, assim, no turismo. O desenho atual ainda traz empobrecimento e a reserva de férias (viagens) sendo consumida pelas famílias para tapar este rombo”, finaliza Mariana.

(*) Crédito da foto: Markus Winkler/Unsplash