Talvez essa seja a pergunta mais difícil de se responder, e a mais importante para os negócios em turismo pelo mundo. Quanto da ocupação atual dos nossos hotéis deve-se a uma demanda reprimida nos últimos dois anos e quanto à normalização estrutural do consumo de viagens pelo país?

Com as restrições impostas pela pandemia, muitas pessoas deixaram de viajar. E, uma vez controlada a Covid-19, é natural que as viagens voltem a crescer. Porém, este processo não ocorre de forma única e constante. Gosto de pensar na recuperação em dois momentos:

  1. “A recuperação do tempo perdido”: uma tentativa de compensação das viagens não realizadas. O famoso “como não viajei nos últimos dois anos, agora mereço (lazer) ou preciso (negócio) viajar. Uma visão imediatista, em curto prazo e não duradoura.
  2. “A volta à vida normal”: passada a euforia do poder viajar novamente, o consumo em turismo tende a diminuir. Mas até que ponto? Aqui, o ambiente macroeconômico e os novos (ou velhos) hábitos de consumo são pontos centrais para a nossa análise.

Primeiro, até onde chegamos? Controlada a pandemia, não há dúvida que o turismo e a hotelaria reagiram e seguem em recuperação. Alguns destaques:

  • Ocupações e diárias em cidades globais aproximam-se dos valores pré-pandemia.
  • O valor de mercado de redes hoteleiras norte-americanas segue acima de 2019.
  • No Brasil, lazer continua forte, com receitas no pico histórico.
  • E destinos de negócios nacionais já superam 60% de ocupação em diversas praças.

Comemoremos, mas também saibamos que ainda estamos na fase da “recuperação do tempo perdido” das viagens. Com a “volta à vida normal”, os volumes de desempenho se intensificarão ou perpetuarão?

O que vem pela frente? No detalhe, nunca sabemos. Mas algumas leituras de mercado me parecem relevantes. Vamos a elas:

  1. Viagens internacionais voltarão a crescer: hoje, apenas uma parcela do volume de viagens internacionais foi normalizada. Com a abertura das fronteiras, é natural que esse processo se intensifique e parte dos brasileiros volte ao exterior.
  2. Dólar e lazer seguirão fortes: mercado de lazer nacional continuará aquecido em curto prazo, especialmente o de classe média. No segmento de luxo, o retorno das viagens internacionais pode reduzir parte do excelente desempenho atual.
  3. O novo normal parece tender ao velho normal: tempo de antecedência para reservas, período de estadia, sazonalidade e presença dos canais diretos estão voltando a padrões naturais. A maior dúvida ainda está na substituição parcial de viagens por reuniões virtuais.
  4. Sentimento de incerteza em grandes centros urbanos: a ocupação cresceu, mas sua perpetuação ainda não é clara. E o sinal mais evidente da falta de confiança do mercado é a dificuldade em subir tarifas, ainda deprimidas, abaixo dos valores pré-pandemia.
  5. Novos modelos de negócios entrando em operação: a nova oferta hoteleira convencional é baixa e não preocupa. Mas como os imóveis residenciais disponíveis em plataformas online e as multipropriedades impactarão a hotelaria tradicional?
  6. Segundo semestre será de “emoções” no Brasil: hoje, temos pressão de custos, estagnação econômica, juros em alta e incerteza política. Sem uma sinalização clara de melhoria do ambiente de negócios, a volatilidade seguirá presente.
  7. Cenário internacional não ajuda: além da guerra e seus efeitos sociais e econômicos, o mundo vive uma desaceleração de crescimento com aumento de custos. Para remar contra a maré internacional, reformas no Brasil são fundamentais.

Ok, mas e o desempenho hoteleiro? Vai se sustentar?

Em curto prazo, acredito que em breve chegaremos ao topo da fase que defini como “a recuperação do tempo perdido”, em todos os segmentos, com exceção de eventos e de hotéis dependentes de demanda internacional, que viverão nos próximos meses uma intensificação de consumo. No geral, estamos na iminência da fase da “volta à vida normal”. E, daqui por diante, a continuidade do bom desempenho dependerá dos fundamentos de cada negócio e da capacidade de realização de cada organização. Portanto, os próximos passos do Brasil e a estratégia de sua empresa são fundamentais.


“Quando o ambiente é desafiador, seguir em crescimento requer visão, mão na massa e suor. A fase de evolução orgânica ficou para trás.”


Para finalizar, deixo as seguintes palavras para reflexão:

LAZER – Otimismo | Resiliência | Pujança | Oportunidades
NEGÓCIOS – Incerteza | Volatilidade | Mudança | Cautela

Para mais análises sobre o tema, confira o 9º episódio do Hotel Trends: Potencializando receitas, com Ricardo Souza, da OTA Insight. O programa já está disponível nos canais de YouTube, Apple Podcast e Spotify do Hotelier News.

Pedro Cypriano é especialista em investimentos e estratégia em turismo e hotelaria. Ao longo dos últimos 18 anos, liderou centenas de projetos junto a consultorias hoteleiras globais, na Europa, no Oriente Médio, na África e na América Latina. Autor do livro Desenvolvimento Hoteleiro no Brasil, pela editora Senac, e professor em cursos de pós-graduação em investimentos hoteleiros no país e no exterior.