Nas últimas semanas, muito se discutiu sobre a importância da diária como driver de recuperação da hotelaria. Desde a HotelInvest, participamos de mais de 10 eventos, desde encontros associativos a convenções com executivos das principais redes do país. E no último evento, na Reunião Gerencial da Atrio, ouvi uma expressão que gostei e me “apropriarei” para este texto: #ForçaNaSubida.

E para turbinar essa subida, outra expressão que gosto muito: #DiáriaÉoCaminho. Esta última, abordada no episódio 4 do #HotelTrends, promovido pelo Hotelier News, e disponível nas plataformas abaixo:

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Mas bem, avancemos nas análises também por aqui. Por que a diária é o caminho para ganharmos mais força na subida e como pisar no acelerador? Abaixo, alguns dos elementos que considero fundamentais.

Primeiro, por que precisamos recuperar a diária?

1. Potencial de geração de caixa superior à estratégia de aumento de ocupação. Já considerando impostos, taxas, a remuneração do gestor e a retenção do fundo de reserva, a margem de contribuição de aumentos de tarifa é próxima a 70%. Ou seja, a cada R$ 10 de aumento, R$ 7 vão para o caixa. Quando a estratégia é de aumento de ocupação, a incidência de custos variáveis e muitas vezes o aumento do custo fixo (como de FOPAG) corroem o potencial incremental de resultado.

Vejamos dois exemplos práticos de orçamento para 2022 de um hotel econômico de 350 UHs com índice de RevPAR idêntico: um com diária mais alta e o outro com a ocupação.

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No cenário em que a diária média é mais alta (+30%), apesar da ocupação modesta, o EBITDA é maior (+10%). Em estratégias de volume (cenário B), a ocupação alta gera custos incrementais, o que corrói parte dos resultados, além de desgastar mais o ativo e manter a equipe sob maior intensidade de trabalho.

2. Além do resultado operacional, precisamos remunerar o capital do investidor. Para um hotel midscale, por exemplo, o custo de implantação por apartamento é próximo a R$ 400 mil. E no pré-pandemia, muitos desses hotéis distribuíam em média R$ 2 mil por mês, um retorno anual de 6% sobre o capital investido. Mas se as taxas de juros do Brasil de longo prazo estão superiores a 10%, é razoável receber 6%? Investidores qualificados exigiriam um prêmio de remuneração para compensar o risco do negócio, o que levaria a expectativa de ROI mais para 15% e representaria distribuições de R$ 5 mil mensais por UH. Já estávamos muito longe do ideal antes da pandemia e a recuperação de tarifa seria o principal driver de valorização no setor.

3. Até 2020, as diárias médias estavam até 60% abaixo do pico histórico. Isso em valores reais, corrigidos pelo IPCA, e essa distância só se intensificou em 2021. E como “pico histórico” entendam o ano de 2013, quando o resultado hoteleiro era compatível com as expectativas de retorno mencionadas na mensagem anterior.

4. A correção das tarifas também é fundamental para a renovação dos hotéis. A maior parte do parque hoteleiro nacional tem quase uma década ou mais de operação. E por ser intensivo em uso, renovações para manter o empreendimento atrativo são fundamentais. Há cada 10 anos, ao menos 20% do investimento inicial precisa ser alocado em retrofit. Com ativos já “cansados” e os fundos de reserva consumidos, de onde sairão os recursos para o reinvestimento em seu hotel se não recuperarmos as diárias?

5. Desde o início da pandemia, as receitas despencaram e os custos dispararam. Não temos um índice de custo hoteleiro no Brasil, mas quem opera um hotel não tem dúvida que ele seria alto, muito acima da média do IPCA, que durante a pandemia já chegou a 13%, enquanto o IGP-M atingiu 43%. Abrindo alguns componentes de custo típicos em hotéis, apenas a folha salarial subiu 10% e para 2022 novos aumentos são previstos, com destaque a utilidades, que podem aumentar 20%.

Mas é possível melhorar a tarifa em 2022? Sim! Quebremos alguns mitos.

1. Apesar da pandemia, outros países já recuperaram as diárias ou estão próximos aos valores de 2019. O exemplo mais claro são os Estados Unidos, que em junho deste ano já superaram as tarifas do pré-pandemia segundo dados da STR. E os drivers de tarifa não são apenas o lazer, mas também segmentos corporativos de pequenas e médias empresas. Regiões como a China, a Oceania, e a América Central também estão com tarifas no máximo 5% abaixo de 2019.

2. A intensificação de recuperação da diária não depende apenas de ocupação. A pandemia trouxe ociosidade em todo o mundo, não apenas no Brasil. E se diversos outros países estão com diárias acelerando, por que aqui não acompanhamos a mesma tendência?

3. Hotéis mais resilientes em tarifa tiveram resultados melhores durante a pandemia. A HotelInvest analisou dados de ocupação e diária de centenas de hotéis vinculados ao FOHB desde o início da pandemia e os comparou com a performance de 2019. Em média, os empreendimentos mais agressivos em diária não conseguiram induzir demanda adicional e no acumulado de abril a dezembro de 2020 em comparação com o mesmo período de 2019 tiveram RevPAR 13 p.p. abaixo dos hotéis que conseguiram manter ou subir tarifas. Estudos internacionais, como da Cornell University, também reforçam essa tese.

4. A fragmentação da hotelaria no Brasil tampouco é um impeditivo para readequar os preços. Quer segmento mais fragmentado que o de bares e restaurantes ou o comércio de forma geral? E os estabelecimentos sim corrigem seus preços, não apenas em função de pressão de demanda, mas também por CUSTOS. Mais uma vez, a precificação na hotelaria não pode ser apenas reativa, em momentos de alta ocupação.

5. A demanda que viaja a negócios o faz por necessidade, não porque as tarifas estão baixas. “Tá, mas a demanda a um hotel específico é influenciada pela tarifa”, alguns comentarão. Sim, verdade, mas com efeitos apenas em curto prazo, até que o hotel vizinho também reposicione suas diárias e um efeito cascata leve a tarifa de todo o mercado para baixo. Já vimos este filme, certo?

Mas como acelerar na prática a recuperação das tarifas?

1. Sensibilização, coragem e direcionamento estratégico. Na prática, primeiro as lideranças das redes precisam comprar a necessidade de corrigir as tarifas e então os orçamentos para 2022 refletirem essa expectativa. Precisaremos de metas arrojadas, para além de um crescimento orgânico, se realmente buscamos retomar os resultados de 2019 antes de 2024 na hotelaria urbana de grandes cidades. E além de técnica, um exercício de coragem é fundamental para comprar o “risco” de correção tarifária.

2. Pensar em números absolutos, não em aumentos percentuais. Historicamente, representamos os orçamentos com um percentual de crescimento sobre o ano anterior. Mas para 2022, em razão da base baixa em 2021, dizer que cresceremos 20% talvez não signifique muito. Em São Paulo, por exemplo, hotéis que tinham diária média de R$ 300 chegaram a menos de R$ 200. Os tais 20% de aumento levariam as tarifas a R$ 240, ainda bastante abaixo de 2019. Discutamos o potencial de subir R$ 30, R$ 50 ou mais as diárias, e sobre os resultados dos últimos meses, não na média do ano.

3. Mudança de cultura e visão estratégica também na ponta. No Brasil, tornou-se cultural a crença de que primeiro vem ocupação e depois a tarifa, além das correções indexadas ao IPCA. Quebremos esse ciclo enganoso e estejamos preparados para justificar os novos aumentos às nossas contas corporativas. Ou estaremos fadados ao sucateamento do parque hoteleiro nacional.

4. Reposicionamento das tarifas públicas para ontem. As quedas de tarifa pública foram tão acentuadas que hoje as contas corporativas pedem descontos de ao menos 20% sobre os preços em canais abertos. Esta é a primeira distorção tarifária que precisa ser corrigida.

5. Olhar para dentro, mas também para fora do hotel. O lado “bom” das crises é que buscamos nos reinventar e questionamos o status quo dos nossos negócios. Avançamos em eficiência operacional e o próximo passo é em gestão de receitas. Para isso, rever processos, sistemas e treinamentos dentro das empresas é importante. Mas também “olhar para fora” é fundamental. Como a economia impactará o nosso negócio? E os novos modelos de negócio de hospedagem? Como os meus concorrentes estão performando? A oferta reduziu, subirá? Para citar alguns exemplos.

Inteligência de mercado é o próximo passo para acelerarmos a recuperação

De forma simples, entendamos inteligência de mercado como uma estratégia de coleta e análise de dados e informações para obter insights e balizar tomadas de decisões, tanto referentes aos nossos clientes como do mercado em geral. E não se trata apenas de um processo mecânico. Precisamos saber o que analisar, como coletar os dados e, principalmente, como interpretá-lo e fazer deles um instrumento de tomada de decisão.

Mas deixemos este tema para aprofundarmos em outro momento. Por ora, uma “provocação”: o que a sua empresa está fazendo para melhorar a inteligência de mercado?

(*) Crédito da capa: Divulgação/HotelInvest

(**) Crédito do infográfico: Divulgação/HotelInvest