Um novo mundo bateu à porta do setor hoteleiro, catalisado por drásticas transformações impulsionadas por uma crise sem precedentes nos últimos dois anos. E o que antes era tendência se tornou realidade em poucos meses. Na era digital, a indústria de hospitalidade vive um momento de profundas mudanças, oriundas de hábitos de consumo que se consolidaram como regra aliado ao avanço voraz da tecnologia. E são estas catarses mercadológicas que Paulo Mélega, vice-presidente de Operações da Atrio Hotel Management, explora em seu artigo Desafios da operação hoteleira na era da hospitalidade digital.

O conteúdo, publicado originalmente no e-book A Gestão da Jornada do Viajante: novo contexto, transformações dos negócios e soluções digitais, fruto da parceria entre a Resorts Brasil e a FGV (Fundação Getulio Vargas), traz uma reflexão sobre como os principais aspectos do universo virtual vem promovendo alterações no modo de fazer, pensar e entregar hospitalidade.

Pós-graduado em Gestão de Turismo e Hotelaria pela FGV, com especialização em Investimentos Hoteleiros na Cornell University, Mélega compartilha insights sobre expectativas e necessidades que moldaram as operações hoteleiras nos anos anteriores e como isso se consolidará no futuro.

Buscando se manter competitivas em um mercado em reabilitação, empresas vem se adaptando às novas necessidades de um cliente conectado, exigente e ávido por inovação. Em contrapartida, o executivo pondera que nem tudo é sobre tecnologia, visto que o diferencial ainda se encontra no atendimento humanizado, personalizado e empático por parte dos colaboradores.

“É o tema da vez. A transformação digital já estava acontecendo, mas a pandemia trouxe de vez a aceleração desse processo, principalmente após as mudanças de comportamento dos viajantes”, pontua o autor do artigo em entrevista ao Hotelier News. “Todos estamos aprendendo a lidar com esse novo mundo. É algo que está em andamento e é importante entender que algumas tendências vieram para focar” continua.

Paulo Mélega - artigo - interna

Mélega: é preciso equilíbrio entre tecnologia e pessoas

High tech x high touch

“A hospitalidade está associada à forma como as pessoas se sentem e se lembram de como foram tratadas, até mais do que elementos tangíveis a que teve contato. Mesmo que a tecnologia possa estar cada vez mais presente na vida das pessoas, as relações humanas ainda estão no núcleo da hospitalidade”, diz o artigo. Aqui, Mélega destrincha que a inovação veio elevar a experiência do cliente, em maior parte em processos que não agregam valor, como etapas burocráticas como o check-in e check-out.

No texto, o vice-presidente da Atrio cita Danny Meyer, CEO da Union Square Hospitality, que traz o conceito de hospitalidade como estratégia de negócios, baseada no diálogo. Ou seja, na troca entre escuta e fala. E dentro de um entendimento individualizado, robôs e ferramentas não substituem o bom e velho olho no olho.

“Entendo que o uso da tecnologia é bem-vindo e necessário, mas é necessário estabelecer limites. Na otimização de processos administrativos e operacionais, que não geram valor a experiência, faz sentido a automatização. Mas acolher está relacionado a uma troca humana. É difícil ter uma experiência de hospitalidade completa sem interação entre pessoas, sem toque, sem emoção. Temos que tomar cuidado para não oferecer uma entrega robotizada”, declara o executivo.

Na busca por equilíbrio, Mélega explora a visão de Claudemir Oliveira, ex-professor da Universidade Disney e atual presidente da Seeds of Dreams Institute, que afirma que o êxito no setor de hospitalidade está no uso moderado do high tech (tecnologia) e high touch (toque humano). E definir papéis dentro desse contexto é desafiador.

“Existe a tecnologia que substitui trabalhos braçais e repetitivos e é preciso realocar as pessoas que estavam nessas funções. Esses profissionais precisam ser capacitados e desenvolvidos para assumir novos cargos de acordo com o perfil de cada um de forma que não sejam subaproveitados”, acrescenta o vice-presidente.

E aqui, existe um resgate do comportamento do gerente geral, que retoma seu papel como principal anfitrião do hotel, em contato direto com o cliente e dividido entre atendimento e processos burocráticos. “Em algum momento, o gestor deixou de cuidar do hóspede para se voltar aos procedimentos administrativos apenas. Mas é fundamental que ele conheça o cliente”, pontua.

Hierarquia de valores

Outro conceito abordado por Mélega foi desenvolvido por Karl Albrecht e fala sobre hierarquia de valores, dividido em:

Valores básicos: atributos essenciais como limpeza e segurança.
Valores esperados: associados à experiência do cliente, como preços justos e internet disponível.
Valores desejados: aquilo que o hóspede não espera, mas gostaria que estivesse presente, como um restaurante temático, por exemplo.
Valores inesperados: aqueles que não estavam na lista de desejos e expectativas, mas encantam quando oferecidos.

“Na hierarquia de valor, é preciso resolver os básicos e esperados, que fazem sentido a automatização. Desta forma, as equipes terão tempo para trabalhar os demais. E isso engloba hotéis de todas as categorias, uma vez que o viajante moderno é conectado, valoriza o local e as trocas. Ele quer interagir, participar e entender o propósito das coisas”, avalia Mélega.

Novo perfil do viajante

Além da entrega, os desafios operacionais passam pelas mudanças de comportamento do consumidor. De acordo com o guia The Future 100: trends and changes to watch in 2022, algumas transformação ditarão a hospitalidade do futuro:

  • Viajante conectado
  • Valorização do local
  • Comportamento nômade
  • Experiências autênticas
  • Consumo intenso
  • Turista antenado
  • Cuidados com e mente

Para atender a nova demanda, se faz necessário um novo conceito de hospitalidade, seguindo uma cultura organizacional alinhada ao momento. “Os hotéis ibis, por exemplo, saíram do convencional, com restaurantes temáticos e pontos de encontro dentro das unidades. Muitos empreendimentos estão implementando espaços de coworking como forma de trazer pessoas de fora e não apenas viajantes”, exemplifica o executivo.

E de nada adianta promover espaços interativos sem uma mão de obra que permita uma experiência genuína. Dito isto, o setor vive uma virada de chave no que diz respeito ao perfil de colaboradores, com maior valorização de soft skills.

“Antes, o conhecimento técnico era o divisor de águas na tomada de decisão. Hoje, a hotelaria preza por profissionais que consigam estabelecer relações. Ser criativo, surpreender o cliente e ser analítico nas percepções também são pontos valorizados”, diz Mélega. “Mas vale ressaltar que ainda precisamos de profissionais qualificados e com nível técnico”.

Por fim, o executivo da Atrio disserta sobre a fidelização na estratégia, que nada tem a ver com programas e benefícios. “O que fideliza o cliente é o atendimento, o relacionamento e as relações humanas. Nunca podemos perder isso de vista”.

Para acessar o artigo de Paulo Mélega na íntegra, acesse o link.

(*) Crédito da capa: Divulgação/Atrio Hotel Management

(**) Crédito da foto: reprodução da internet