Bernal é autor do livro "Para uma Trajetória de Sucesso na Hotelaria"

 

Na minha carreira, tive oportunidade de viajar por vários países, conhecendo outras culturas e, na hotelaria, consegui aprender um pouco sobre como funciona a “mentalidade” de outros países. Hoje abordarei um pouco sobre como eu vejo a hotelaria nos Estados Unidos.

Começo direcionando este artigo para aquelas pessoas que querem e pretendem trabalhar nos Estados Unidos, ou que apenas tenham curiosidade de como funciona a hotelaria americana, ou melhor, como é a gestão por lá e como são os funcionários deste país.

Cultura: é você que se adapta
Primeira recomendação: não vá para a América pensando que aquele país vai se adaptar à sua cultura. Muito pelo contrário, esteja preparado para se adaptar às leis, hábitos e cultura daquele local.

Na minha visão, no que se refere à prestação de serviços e atendimento, o brasileiro é mais hospitaleiro, sabe receber bem e tem mais empatia com as pessoas, clientes, hóspedes, funcionários.

Nos Estados Unidos, por ser uma cultura mais racional e pouco “sentimental”, o atendimento tende a ser um pouco mais “frio”.  

Dos meus 25 anos dedicados à indústria da hospitalidade, atuei em todos os segmentos de produtos hoteleiros, de executivo até resorts (hotelaria econômica, midscale , upscale , luxo , resorts).

Diferenciação pela produtividade
A hotelaria americana oferece “benefícios diferenciados” se comparado com a hotelaria no Brasil. Difere de garantias, mas há grande vantagem e incentivos para aumentar a sua remuneração. Em resumo: quanto mais você trabalha, mais você ganha, e quanto mais você produz,  mais recompensado financeiramente você se torna.

Hotel para o público em geral
Outro exemplo: no Brasil, não se tem a cultura de se hospedar em hotéis nos finais de semana, pois achamos caro e não temos essa prática no entendimento geral. Hotel é só para quem está hospedado. Mas hotel é aberto ao público, ou seja, você pode frequentar o hotel sem estar hospedado, tomar café, almoçar, jantar, frequentar o bar, etc.
Nos Estados Unidos, é comum funcionários se hospedarem nos hotéis que trabalham pagando uma diária bem acessível.

Inglês é pré-requisito
Trabalhar com hotelaria em outro país, em especial nos Estados Unidos, recomendo fortemente que você fale o idioma local – você precisa de fato saber falar inglês. Se você quiser crescer nos Estados Unidos, desenvolva sua carreira para cargos de maior responsabilidade, fale inglês e, acima de  tudo,, mesmo que você tenha uma carreira sólida no Brasil e queira iniciar em outro país, seja humilde, esteja disposto a recomeçar e tenha resiliência. Trabalhe duro, pois terá que provar do “zero” suas competências e qualificações. Lembro que você não está no seu habitat natural, está em outro país. Por isso, adapte-se – e rápido – para “sofrer” menos.

Trabalho é a identidade do americano
Para muitos, os americanos parecem ser grosseiros nas tratativas. Em particular, não vejo dessa forma. e, claro, falo só por mim.

O americano médio fala muito de trabalho, inclusive no bar. Ele adora contar e reviver sua rotina de trabalho, ou seja, é muito workaholic. Por isso, o trabalho é a identidade do americano. Em geral, você vai ouvir perguntas como “what are you doing?” referente a questões de trabalho.

Já o brasileiro não fala tanto assim de trabalho e prefere usar o tempo de lazer para relaxar e esquecer um pouco de trabalho.

Facilidade em dizer não Americano tem mais facilidade para dizer não, ao contrário do brasileiro que dá voltas gigantescas para dizer não. É por isso que brasileiro tem atitudes como marcar compromisso e não comparecer ou então não cumprir prazos. Muito disso pode ser por receio de decepcionar alguém.

Workaholic
Americano almoça trabalhando, já que normalmente fazem 30 minutos de almoço. Já no brasil, sabemos: no mínimo 1 hora e ainda há gente que reclama ser pouco e isso faz parte da cultura do brasil.

Se você, brasileiro, não gosta tanto assim de se dedicar somente ao trabalho, uma observação importante antes de escolher a América. O americano vive para o trabalho, adora trabalho e fala muito sobre trabalho. Exemplo disso é que lá as férias são de 1 a 2 semanas, enquanto no Brasil 30 dias.

Formalidade
O cumprimento do americano é normalmente mais formal, sendo que um aperto de mão já é o suficiente. Já no Brasil percebe-se de cara a diferença: um beijo, dois ou três, dependendo da região do país. Aqui, o acolhimento é bem maior, as pessoas são mais próximas.

Gorjeta  
Não economize na gorjeta, que lá eles chamam de tip – normalmente 20% é justo. Se você não pagar a gorjeta, essa atitude é vista como muito grosseira, um verdadeiro insulto para os americanos. 

Restaurantes com alto giro 
Nos restaurantes, é uma prática comum o garçom levar a conta sem você pedir. Portanto, não fique muito tempo num ambiente sem pedir algo nem demore para fazer seu pedido..
O negócio precisar girar e existem outras pessoas para serem atendidas. Se ficar parado sem pedir nada, será mal visto, pois repito, o garçom vive disso. Outro cuidado: não assovie para o garçom nos Estados Unidos, que é considerado grosseiro e será mal visto. Você não está no Brasil e, mesmo estando aqui, é falta de educação, mas muitas vezes fazemos isso sem perceber. 

Intimidade
Outra diferença que notamos nos Estados Unidos é com apelidos, porque é delicado tomar essa iniciativa com quem você não tenha intimidade. Americano estranha isso no trabalho e até pode se ofender.
 
Pontualidade
Horário é muito sério nos Estados Unidos. Portanto, evite se atrasar, porque um pedido de desculpas dificilmente é visto como justificativa para o atraso. É sua responsabilidade chegar na hora. Já. no Brasil, me parece ser mais flexível a tolerância quanto a atrasos, mas mesmo assim é falta de respeito com o outro.

Postura em reuniões
Nas reuniões nos Estados Unidos, seja formal. Ninguém gosta de saber do seu final de semana, das suas viagens ou de comentários sobre os resultados no futebol. Lembre-se que um dos lemas do americano é “time is money” (tempo é dinheiro). Por isso, seja objetivo. Trabalho e mais trabalho. Americano é focado no assunto em pauta e não quer perder tempo com outras coisas que não são, de fato, o assunto do momento. Aos brasileiros que querem atuar nos Estados Unidos eu aconselho: evitem isso na hotelaria de lá e sejam objetivos, diretos e foquem no que realmente importa.

Comunicação instantânea
No Brasil, usar WhatsApp é comum, enquanto nos Estados Unidos as pessoas preferem usar SMS, que lá é gratuito. 
Brasileiro adora falar muito, contar tudo e de tudo, enquanto o americano é mais comedido. Fica a dica para os brasileiros saberem transitar na hotelaria com seus pares e chefes.

Expectativa versus realidade
Nos Estados Unidos, há muitas vantagens e benefícios, mas cito aqui algumas ressalvas:
Segurança – existem pessoas más em todos os lugares. Por isso, cuide e fique atento;
Oportunidades – não existe lugar nenhum que é perfeito;
Ilusão – se você chegar nos Estados Unidos pensando que tudo é Disney, poderá ter sérios problemas com o ambiente de trabalho na hotelaria;
Regionalidade – assim como no Brasil, cada região nos Estados Unidos tem uma personalidade diferente, podendo ser cidade pequena, grande, natureza, praia. Escolha o lugar que mais lhe agrade para você trabalhar mais feliz; 
Validação de outras profissões – se você não trabalha ainda com prestação de serviços ou hotelaria e tem outra profissão, por exemplo, advogado, médico e queira estabelecer e se mudar, terá que se preparar para recomeçar, pois ao meu ver há um grande desafio em validar seu diploma nos Estados Unidos. Nada é impossível, mas, a hotelaria pode ser outra opção na sua carreira, inclusive fazendo sucesso.

O que os americanos têm a aprender com os brasileiros
Como o povo brasileiro sabe receber muito bem e é super hospitaleiro e acolhedor, os americanos podem aprender aqui a questão da hospitalidade. Os brasileiros gostam de apresentar o hotel, preocupam-se genuinamente com seu bem-estar, têm mais carisma e abertura.

Já o americano tem dificuldade de demonstrar afeto, carinho, amor, ou seja, é mais frio, porque faz parte da cultura. Isso não quer dizer que amem ou cuidem menos, é apenas dificuldade em demonstrar aos seus.

A limpeza e a higiene nos hotéis no Brasil, por sua vez, supera os Estados Unidos. Desculpe a franqueza, mas nas minhas várias viagens para fora, este foi um pequeno detalhe que percebi como hoteleiro.

Felicidade é a chave da escolha
Hoteleiro é hoteleiro em qualquer lugar do mundo. Por isso, escolha ficar onde você vai se sentir melhor, mais feliz e acolhido perante os seus. Porém, se decidir ir em busca de outras possibilidades, errar faz parte do processo.

O que fica de lição é nunca se acomodar a aceitar a mesmice ou mediocridade que a vida lhe apresentou. Corra riscos, faça acontecer e veja que, num piscar de olhos, a vida passou muito rápido e você mais pensou ou mais fez do que além de pensar?

Será? Será que eu consigo, será que vale a pena? Será que eu estou certo? Será que eu vou quebrar a cara? Será? Será? Será?
Pense nisso, mas especialmente aja sobre isso!

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Nilson Bernal é especialista em hotelaria há mais de 20 anos. Bacharel em Administração de Empresas, já atuou em diversas redes e hotéis independentes como Atlantica, Bourbon e Jurema Águas Quentes. Em 2017 lançou seu primeiro livro intitulado "Para uma Trajetória de Sucesso na Hotelaria" e é, também, coautor do Segredos do Sucesso – Histórias de Executivos da Alta Gestão. 

www.nilsonbernal.com.br

(*) Crédito da foto: divulgação/Arquivo pessoa