Operadoras hoteleiras, comercializadoras, incorporadores, desenvolvedores imobiliários, advogados e consultores encheram os salões do Ocean Place, em Balneário Camboriú (SC), para a quarta edição do Multipropriedade Summit. Organizado pela revista Turismo Compartilhado, o evento reuniu cerca de 200 profissionais da indústria, debatendo oportunidades e desafios no setor de propriedade compartilhada.

“Com a programação do evento, criamos uma jornada de conhecimento sobre o setor, apresentando desde painéis destinados a debater os desafios da incorporação e operação a cases de sucesso de projetos de multipropriedade, passando ainda por questões jurídicas”, explica Flávia Mendonça, sócia da Turismo Compartilhado, logo na abertura do evento. “Esperamos que o vocês saiam daqui preparados, com mais informações e conhecimento, para estruturar e operar projetos na área”, completa.

E, de fato, a jornada de conhecimento do evento citada por Flávia perpassou todas as etapas que envolvem um projeto de multipropriedade, setor que tem um VGV (Valor Geral de Vendas) de R$ 79,5 bilhões, segundo a última edição do estudo Cenário do Desenvolvimento de Multipropriedades, produzido pela Caio Calfat Real Estate Consulting. Logo nos dois primeiros painéis, por exemplo, a visão do desenvolvedor imobiliário foi explorada. Afinal, o que os fez apostar no segmento? Este mercado é realmente um bom negócio?

É inegável que o VGV dos projetos chama atenção de qualquer desenvolvedor. Mais ainda, na visão do incorporador e em comparação à hotelaria tradicional, a multipropriedade tem um ROI (Retorno do Investimento, na tradução livre) potencialmente mais rápido. E, de fato, “potencialmente” é um termo relevante nesta equação, pois os desafios para colocar tudo de pé – e entregar o empreendimento e a boa experiência que o cotista e o consumidor esperam – não são poucos. O caminho do sucesso, na visão de Nathalia Mendes, passa por uma palavra-chave.

“Tínhamos um terreno na Praia Brava e um produto residencial não encaixava bem ali. Achamos interessante a multipropriedade e passamos a nos informar melhor para entender o segmento e suas oportunidades”, explica a CEO da Mendes Incorporadora, empresa catarinense mais focada em residenciais e que desenvolveu o Brava Mundo, que tem mais ou menos um ano de operação. “Não é um negócio fácil, diferente da incorporação tradicional, que é o nosso negócio. Entendo que o sucesso do Brava Mundo tem relação com os bons parceiros que nos associamos. Isso diminuiu nossa margem de erro, mas, mesmo, erramos bastante nesse processo, o que é normal em uma indústria tão nova”, complementou.

Ao mencionar parceiros, ela se refere a empresas especializadas em etapas importantes da estruturação e entrega do projeto, como comercializadoras e operadoras hoteleiras. “O desafio do metro quadrado na região de Balneário Camboriú, que é alto, não é simples, o que nos obriga a estudar bem o mercado para escolher o nicho certo para o lançamento imobiliário. Bons parceiros ajudam a não só a errar menos, mas a possibilitar que sua empresa foque no que faz de melhor, que no nosso caso é a incorporação”, comenta Nathalia.

Parte estratégica do “negócio” imobiliário, e mais ainda na multipropriedade, a comercialização das unidades demanda conhecimento não só do mercado, mas principalmente do público-alvo, ensina Danilo Samezima, CEO da Oceanic. “Aqui na região, por exemplo, o veranista não é o público-alvo ideal. Por isso, recomendo estudar bem essa persona potencial para reduzir o percentual de distratos. Esse cuidado é muito importante, pois o custo da venda é alto e tem que acertar bem para machucar o menos possível o fluxo de caixa do empreendimento ao longo do desenvolvimento do projeto”, acrescenta.

painel

Painelistas debateram a experiência no setor

Funding

Na fase da estruturação do projeto, outra parte estratégica do negócio, qual o melhor caminho seguir? Qual o momento mais apropriado para buscar recursos no mercado de capitais, por exemplo? Ou o ideal é seguir com recursos próprios? “Com certeza, o modelo de negocio da multipropriedade já é por si só um gerador de funding para construir”, comenta Diego Vailatti, CEO do grupo Pedra da Ilha, que lançou (e já entregou e opera) o Solar Pedra da Ilha, em Penha (SC). “Agora, o modelo tem seus desafios comerciais e, por isso, é necessário entender bem o público para estruturar um projeto mais certeiro possível, o que mitiga riscos financeiros.”

Roberto Kwon, da Amazon Parques & Resorts, destaca que, afora o inviável patamar atual da Selic, o mercado financeiro está mais reticente com o segmento de multipropriedade. E, neste sentido, uma questão relevante é o descasamento entre a “planilha”e a a realidade na hora de buscar o funding, seja para que etapa do desenvolvimento, seja para a estruturação e o lançamento ou mesmo para turbinar a comercialização, que demanda muito recursos para manter a velocidade de vendas necessária.

“A parte mais importante é ter as pessoas certas. A multipropriedade é um bom negócio, mas precisa ter cuidado. No nosso caso, as obras estão andando juntamente com as vendas, e te digo que não foi fácil chegar até aqui. Gerar fluxo de caixa para começar o projeto e, depois, para manter as vendas no ritmo necessário, é uma tarefa desafiadora”, comentou Kwon.

“É importante estar preparado para essa etapa, a chamada ‘barriga’. Embora tenhamos seguido um caminho diferente em nosso projeto, diria que a busca por funding é ideal para essa fase do desenvolvimento imobiliário, pois a planilha e a realidade nem sempre andam juntas por diferentes fatores”, acrescentou Rafael Schlesting, CFO do Surfland Brasil, projeto que está em fase final de entrega (da parte de hospitalidade) localizado em Garopaba (SC). “Estamos negociando um CRI para acelerar mais as vendas e finalizar o projeto, além de nos permitir alongar a dívida”, continuou.

Agora, para a estruturação e lançamento do projeto, em especial diante do patamar atual dos juros, o melhor é iniciar com recursos próprios, disseram os incorporadores presentes. “Somos avessos a isso nessa fase, já que reduz a exposição do caixa lá na frente”, pontuou Wesley Reis, do Hard Rock Gramado. “Com certeza, (recursos próprios) é o dinheiro mais barato, mas sabemos que não é a realidade do mercado. Por isso, recomendamos planejar muito bem desde o início uma eventual captação, independentemente da etapa em que esses recursos forem direcionados”, complementou.

Gabriela Schwan

Gabriela apresentou o conceito do Jangal

Conceito e operação

Então, para quem deseja apostar (e vencer) no segmento, é preciso ter ciência de que o negócio multipropriedade têm várias pontas diferentes e complementares, que precisam estar bem ajustadas para que o projeto seja um sucesso. E, após a entrega e com a operação já rodando, uma boa experiência de hospitalidade é vital para a retenção dos investidores e a atração de novos. Esse adendo é relevante, pois, no início dessa indústria, eram poucos os incorporadores com esse (necessário) olhar. Afinal, a missão era vender as unidades e “partir para outro projeto”.

O Multipropriedade Summit trouxe um bom exemplo de como unir essas pontas (comercialização, entrega e hospitalidade) ajuda no relacionamento com o consumidor e, claro, na perpetuidade do negócio. Em operação há dois anos em Canela (RS), o Jangal das Araucárias inicialmente não foi planejado para ser uma multipropriedade, mas seu conceito inicial vem sendo determinante para a fase atual do projeto.

“O cuidado com o design, com a marca e, principalmente, com a experiência do cliente balizaram a estruturação do empreendimento desde o início”, revelou Gabriela Schwan, CEO da Swan Hotéis. “Oferecemos as mesmas experiências para os proprietários e hóspedes, e com uma taxa de condomínio de R$ 220. A hospitalidade é percebida desde a chegada e não fazemos abordagens de vendas dentro do Jangal. Ali é só hospitalidade e experiência”, ressaltou.

Ou seja, não se pode desvincular a multipropriedade da hotelaria para ter uma entrega de hospitalidade efetiva e engajadora. “Recomendamos chamar alguém que entende de hospitalidade desde a conceituação do projeto. Ajuda a minimizar erros lá na frente”, comentou Luciana Kuzuhara, gerente de Desenvolvimento de Negócios das Wyndham Hotels & Resorts. “O cancelamento é ruim para todo mundo e, por isso, investimos muito tempo na relação com os proprietários e com a incorporadora do projeto. Somos uma empresa de hotéis e garantir a experiência na hospitalidade é nosso papel principal, mas entendemos que ajudar o incorporador a vender mais e manter sua base de clientes é fundamental”, finaliza Rafael Delgado, diretor de Operações e Implantações da Livá Hotéis.

* O jornalista viajou a convite da organização do Multipropriedade Summit.

(*) Crédito das fotos: Vinicius Medeiros/Hotelier News