A sensação invariavelmente é a mesma. Quando adentra o saguão do Maksoud Plaza, bate sempre aquele orgulho, a certeza de que acertou muito mais do que errou. Os jardins suspensos, o espelho d’água, os elevadores panorâmicos, o majestoso atrium… tudo perfeitamente harmonizado com obras de arte de Maria Bonomi, Yutaka Toyota e Tomie Ohtake.

“Arquitetura só é verdadeira e autêntica quando transmite emoção. Do contrário, é apenas mais uma obra de engenharia. Após 40 anos, percebo que as pessoas, ao entrarem no Maksoud Plaza, emocionam-se. Então, fico feliz de poder ser cúmplice dessa emoção, juntamente com as centenas de profissionais que participaram da construção e realização desta obra”, afirma Paulo Lucio de Brito.

Sim, como vocês já devem ter reparado, Brito é o pai da criança, como gostava de falar um antigo narrador esportivo. O arquiteto concebeu e gestou o projeto de cabo a rabo, mas, obviamente, algo dessa dimensão e complexidade não se faz sozinho. E, na verdade, seu justo gracejo aos profissionais que atuaram ao seu lado nos quase quatro anos de trabalhos também deve ser estendido à equipe do hotel (atual e do passado), aos hóspedes (anônimos e famosos) e aos fornecedores de produtos e serviços da propriedade, que também colaboraram na construção da mítica em torno dessa bela obra de engenharia.

Ah, claro, falar sobre a construção do Maksoud Plaza sem citar o homem que empresta o nome ao hotel e assumiu o risco de idealizar um cinco estrelas de nível internacional em plena década perdida, é simplesmente impossível. “Nunca tinha feito um projeto de um hotel”, relembra Brito, então funcionário da Hidroservice Engenharia, fundada em 1958 pelo patriarca dos Maksoud e autora de obras de grande porte no país, caso emblemático da Usina Binacional de Itaipu, em Foz do Iguaçu (PR).

Maksoud Plaza - Paulo Lucio de Brito

 

“Arquitetura só é verdadeira e autêntica quando transmite emoção. Do contrário, é apenas mais uma obra de engenharia.”

Paulo Lucio Brito, arquiteto do Maksoud Plaza

 

“Havia desenhado e executado o prédio da sede da empresa, na Vila Mariana. Pelo sucesso do projeto, o Dr. Maksoud achou que estava preparado e acabou me incumbindo do Maksoud Plaza. Fiquei orgulhoso”, conta o já septuagenário arquiteto, que acrescenta: “A intenção dele era fazer um grande hotel, uma obra de engenharia exemplar e, principalmente, com grande espaço interno. Ele era viajado e queria seguir as referências das propriedades que se hospedava no exterior”, completa.

O desejo de Maksoud era totalmente factível, mas não menos trabalhoso. O principal desafio estava no majestoso atrium que habitava os sonhos do magnata da construção civil. A execução, por sua vez, estava na cabeça do jovem engenheiro, então com 32 anos, que, para deixar tudo mais emocionante, teve que acelerar os preparativos.

É vero que apoio não faltou para a construção do Maksoud Plaza, apesar dos dores econômicas que marcaram os anos 1980. O então prefeito Olavo Setúbal desejava um grande hotel de luxo para “presentear” São Paulo e instigou a iniciativa privada. Havia também incentivos por parte do governo federal, que sinalizava com generosas linhas de crédito para financiar a obra.

“Encontramos a área certa, essa localização incrível que todos conhecem próximo à Avenida Paulista, mas havia no terreno um convento tombado”, conta Brito. “O prefeito falou ao Dr. Maksoud que tratássemos de desenvolver logo o projeto que ele garantia o destombamento. E assim foi: corremos e, em dois meses, mais precisamente em 6 de maio de 1976, a papelada foi aprovada. No dia seguinte, como Setúbal prometera, o nosso e cerca de outros 200 imóveis foram destombados”, completa.

Bem, agora mãos à obra, certo? Bem, na verdade não, porque Brito estava um pouco inseguro. O projeto aprovado previa um atrium com 20 m (metros) de comprimento, por 20 m de largura e 70 m de altura – bem do jeito idealizado por Maksoud. “Isso me preocupava, pois é difícil controlar um espaço com essa dimensão. Não tinha certeza se funcionaria bem”, reconhece. “Procurei o Dr. Maksoud, expus minha preocupação e ganhei uma viagem exploratória para fazer.”

Maksoud Plaza - obra-prima do Paulo_Grand Hyatt SF

Lobby do Hyatt Regency San Francisco foi referência

Mesmo com o projeto aprovado, Brito foi visitar hotéis nos EUA, México e Peru – todos com grandes espaços internos. “Conhecendo essas propriedades, particularmente o Grand Hyatt de Atlanta e o Hyatt Regency San Francisco, cheguei à conclusão que o projeto original estava completamente errado em relação à solução adotada para o atrium. Com essa constatação, mudei tudo ainda na viagem. Chegando a São Paulo, convenci o Dr. Maksoud de que deveríamos modificá-lo.”

Originalmente, o hotel previa quatro alas de apartamentos. No novo esboço, acabou com duas, voltadas para a Rua São Carlos do Pinhal e para a Alameda Ribeirão Preto, respectivamente. “Consegui desenhar um atrium de 18 m por 32 m e 70 m, com 24 andares. Ainda assim, a iluminação do topo não era suficiente e tive que criar uma entrada de luz lateral, com dois blocos de elevadores nas extremidades. Foi a maior contribuição para o novo projeto”, diz.

Com certa correria novamente, a papelada foi aprovada de novo pela prefeitura de São Paulo e, finalmente, o pontapé inicial da construção poderia ser dado. Das pranchetas e bastidores, Brito foi para a linha de frente no canteiro de obras, mas sem deixar de lado o serviço burocrático de acompanhar as inúmeras licitações feitas para a contratação de fornecedores. “Foram dois anos exaustivos, mas recompensadores”, revela o arquiteto, que lembra sempre da eminência parda do Dr. Maksoud.

“Com ele, os projetos eram de A a Z, do desenvolvimento e aprovação do projeto à montagem final”, revela Brito. “Passei nove meses direto na obra. Emagreci 13 quilos, por exemplo. Era uma pressão muito grande para entregar a obra dentro do cronograma. Trocávamos o dia pela noite”, acrescenta.

Segundo Brito, ligações durante a madrugada de Henry Maksoud, que visitava a obra todos os dias pontualmente às 11h, não eram incomuns. “Ele me ligava às três da madrugada como se fossem 15h. Foi desgastante, e isso inclui minha família, mas participei de todas as fases de execução do hotel, algo raro para um arquiteto. Então, foi uma experiência incrível. Posso me gabar: conheço cada metro quadrado do Maksoud Plaza”, diz.

E, então, finalmente chegou o grande dia exatamente no dia 1º de janeiro de 1980, quase quatro anos após a aprovação do projeto original na prefeitura. E, para uma abertura tão especial para a São Paulo, clientes famosos eram obrigatórios. “O primeiro hóspede foi o Roberto Marinho”, lembra Brito, referindo-se ao magnata da telecomunicação brasileiro e presidente das Organizações Globo.

Maksoud Plaza - atrium toma forma

O mais famoso atrium de São Paulo toma forma, com as duas alas de quartos acima

 

Desse dia em diante, várias e marcantes históricas foram contadas nas dependências do Maksoud Plaza, gerando emoções para celebridades internacionais, músicos famosos, reis, rainhas, políticos e, claro, completos anônimos. “O que mais me marcou? Afora a emoção que sinto ainda hoje ao visitá-lo, diria que foi a possibilidade de alterar o projeto. Aquele espaço interno não foi nunca mais reproduzido: vegetação, fonte da água, os elevadores panorâmicos, que eram uma grande inovação para a época… tudo ali gera emoção”, garante Brito.

A vida após o Maksoud Plaza, como não poderia ser diferente, seguiu nas pranchetas. Com a rica experiência adquirida, passou a trabalhar em novos projetos para a hotelaria e para a família Maksoud, que tinha intenção de construir uma rede. Um deles o orgulha bastante e pode ser facilmente encontrado no perfil do Facebook do escritório de Brito, chamado PLB Arquitetura de Hotéis: o Maksoud Plaza Manaus Hotel & Eco Resort.

Grandioso, o empreendimento ocupa um terreno de 152.572,75 m² (metros quadrados), ficando às margens do Rio Negro, bem na confluência com os Igarapés Tarumã e Gigante. Ao todo, são 225 habitações, entre apartamentos standard de 41,1m² e suítes com cerca de 70 m², distribuídas em um edifício de 10 pavimentos com as extremidades escalonadas mais a cobertura.

Maksoud Plaza - obra-prima do Paulo1_Manaus

Brito desenhou outros projetos de hotéis, caso desse eco resort em Manaus

 

“Especializei-me em projetos de hotéis depois do Maksoud Plaza. Ministrava aulas na FAU/USP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo) para ensinar novos arquitetos sobre o desenvolvimento de empreendimentos hoteleiros”, conta Brito, que atuou por 21 anos na Hidroservice.

Logo após sair, em 1991, ele se associou a um ex-colega da empresa para lançar um projeto de hotéis supereconômicos. “No interior de São Paulo havia muita demanda para esse tipo de produto, com quartos de 12 m² e estrutura mínima de A&B”, lembra. Segundo Brito, a Embratur chegou a “apadrinhar” a iniciativa, mas o impeachment de Fernando Collor e, de quebra, a queda do presidente da agência de promoção turística, em 1992, paralisou tudo.

“Só anos depois do nosso projeto apareceu a marca Formule 1, da Accor, no Brasil. Está vendo como nosso projeto estava certo?” É claro que estava, Paulo, assim como estava também em relação às duas alas de apartamentos, à luz lateral, aos jardins suspensos, aos elevadores panorâmicos e, claro, ao atrium menor, mas não menos bonito e imponente. Seu projeto ficou para a posteridade. A hotelaria de São Paulo agradece!

(*) Crédito da capa: Divulgação/Maksoud Plaza

(**) Crédito das fotos: Arquivo/Paulo Lucio de Brito Arquitetura de Hotéis

(***) Crédito da foto: Reprodução de internet/Hidden Architecture