Se grandes crises trazem bons aprendizados, 2020 foi uma dura especialização para o setor hoteleiro. Passado o auge da pandemia e iniciado o gradual processo de retomada da hotelaria, o Hotelier News convidou oito executivos e CEOs do segmento para compartilhar seus pontos de vista quanto às principais lições da pandemia e os maiores desafios enfrentados durante o ano que ficará marcado na história.

Os executivos e dirigentes convidados foram: Francisco Costa Neto (Aviva); Roberto Bertino (Nobile Hotels & Resorts); Paulo Roberto Caputo (Atrio Hotel Management); Chieko Aoki (Blue Tree Hotels); Orlando de Souza (FOHB); Manoel Linhares (ABIH-Nacional); Eduardo Giestas (Atlantica Hotels) e Thomas Dubaere (Accor). Em suas falas, destacaram pontos como adaptabilidade, comunicação, gestão de crises e a importância de culturas sólidas dentro das empresas. Veja abaixo os posicionamentos de todos os convidados pela reportagem:

Lições da pandemia

Comunicação, comunicação e comunicação, especialmente com os nossos associados. Aprendemos que empresas com culturas fortes e consistentes superam qualquer crise, inclusive esta. Temos que continuar aprendendo, pois fizemos muitas paradas de aprendizado durante nossos comitês ao longo do processo, e não podemos esperar finalizações para absorver as lições” – Francisco Costa Neto.


Lições da pandemia - Roberto BertinoSe fazíamos mais com menos, aprendemos a fazer muito mais com muito menos. Aprendemos que, em momentos como este, devemos unir esforços com todos os atores do negócio para garantirmos a sobrevivência de toda a cadeia produtiva. Nessa crise identificamos quem são os colaboradores realmente engajados com a companhia, dedicando nosso foco em colocar as pessoas certas nos lugares certos e as pessoas erradas para fora da empresa. Que na crise surgem oportunidades, as quais devem ser identificadas e aproveitadas. Por fim, continuamos a seguir com disciplina fanática nosso modelo de negócio,  investimos em tecnologia e mantivemos nosso foco na marcha de 20 milhas ao dia, seguindo nosso lema que é sobreviver, crescer e perpetuar. O planejamento estratégico e o trabalho sério, junto com a paixão e esforço de nossa equipe, seguirão sendo os pilares da nossa proposta no decorrer do ano de 2021” – Roberto Bertino.


Aprendemos que na dificuldade é fundamental agir rápido, tomar as decisões duras que precisam ser tomadas e, super importante, comunicar-se muito. Nos momentos de incerteza as pessoas precisam estar unidas e confiarem na liderança da empresa. E, para isto, é preciso agir com transparência” – Paulo Roberto Caputo.


O maior aprendizado é a capacidade de adaptar as operações das unidades com quadros mais reduzidos, e a preocupação com a não canibalização das diárias, pois tarifas muito baixas, só para ter clientes, levam a um caixa frágil que faz sucumbir um hotel quando colocado em situação de crise. Nunca o Revenue Management e o BI na administração da distribuição/comercialização se mostraram tão fundamentais. Quem partir para guerra de preços como estratégia no futuro vai naufragar” – Orlando de Souza.


Lições da pandemia - Chieko AokiA hotelaria vive momento de inflexão, consequência da mudança no estilo de vida que vinha acontecendo e que tomou velocidade com o Covid-19. O maior aprendizado é que devemos aprender muito mais, abrir a mente para o impossível e fazer tudo isso em alta velocidade. É tempo de zerar crenças e absorver novas tendências, com olhar estendido, imaginando a nova sociedade daqui 10 anos, ou menos ainda, daqui cinco anos! As mudanças são profundas, velozes, diárias e de minuto em minuto. E quer saber melhor? A Blue Tree Hotels e nossa equipe já entraram nesse novo ritmo, e estamos dando as boas-vindas e contribuindo na construção do novo estilo e qualidade de vida” – Chieko Aoki.


A adaptação dos meios de hospedagens aos novos procedimentos exigidos pelas autoridades de saúde foi um dos principais desafios de 2020. E a hotelaria respondeu com rapidez para que pudesse voltar às atividades, sem colocar hóspedes e colaboradores em risco. Essa agilidade só foi possível porque os hotéis sempre investiram em produtos de ponta e novos equipamentos para garantir 100% de limpeza em seus ambientes, privados ou coletivos. O setor sempre foi um dos primeiros a incorporar novas tecnologias relacionadas à higienização de ambientes. A rápida adaptação aos canais online também foi um desafio. Se eles já eram importantes, agora se tornaram parte fundamental da operação dos hotéis para a captação de hóspedes. Investir na comunicação com clientes e com a sociedade em geral, para que todos possam conhecer mais de perto como trabalham e que medidas preventivas estão tomando os meios de hospedagem do país para retomar suas atividades de forma segura, foi uma marca do ano passado e deve permanecer daqui em diante. Com relação ao mercado de turismo, sem dúvida, no ano passado, conquistamos importantes avanços, mas é preciso ir adiante se realmente queremos nos tornar um dos principais destinos turísticos do mundo. O ano de 2020 mostrou com clareza a importância de trabalharmos constantemente junto às autoridades, em todos os níveis, para encontrarmos os caminhos para modernizar – no âmbito executivo, legislativo e jurídico – o turismo no país e explorar com consciência e inteligência todas as nossas potencialidades” – Manoel Linhares.


A maior lição que aprendemos com a pandemia foi mostrar a capacidade inovadora e pioneira da Accor no setor. Fomos a primeira empresa do setor a anunciar uma parceria com o Bureau Veritas, que resultou na criação do selo de segurança ALLSAFE. Fomos também a primeira empresa do setor a anunciar a adaptação de alguns quartos de hotel para escritórios, nosso produto Room-Office, que fez tanto sucesso e, agora, é um formato definitivo, com o lançamento da marca WOJO no Brasil. Também ampliamos a nossa oferta de estadias longas, que são opções rápidas de alojamento de longa duração, com preços e vantagens especiais. Além disso, adotamos o formato Dark Kitchen, onde mais de um restaurante concentra sua operação no mesmo espaço para delivery. Assim, garantimos que os pratos dos renomados restaurantes da Accor em São Paulo não ficaram fora da mesa de nossos clientes durante o período de isolamento social. Temos também como exemplo de inovação nossos Estúdios Digitais, localizados nos hotéis combo Pullman São Paulo Vila Olímpia e Grand Mercure São Paulo Vila Olímpia, que foram estrategicamente desenhados devido ao aumento da demanda de empresas que gostariam de continuar seus eventos, mas agora de forma adaptada, seja virtualmente ou de forma híbrida. Além disso, a crise inédita que vivemos também nos mostrou a importância da proximidade e da transparência nas relações, e a importância do carinho e do acolhimento – valores que já tínhamos em nosso DNA na Accor, mas passaram a ser ainda mais necessários. Abrir um canal de comunicação direto com todos os nossos parceiros (colaboradores, investidores e clientes) foi e ainda é a melhor forma de passarmos por este momento delicado, para que agora estejamos juntos nisso, na procura das melhores soluções. A recuperação ainda é lenta e gradual, mas acredito que sairemos disso ainda mais fortes do que fomos– Thomas Dubaere.


Lições da pandemia - Eduardo GiestasDurante a pandemia nos reinventamos, buscando maneiras de manter a saúde financeira de nossos investidores utilizando fundos de reserva pensados para momentos como esse. Aprendemos a fazer mais com menos, nos tornamos mais produtivos, desenvolvemos maneiras de prestar um bom atendimento mesmo com as limitações e o distanciamento social. Adicionalmente, criamos novas formas de nos relacionar com os nossos canais de vendas. Nos aproximamos ainda mais do trade e da equipe operacional dos hotéis. A Atlantica Hotels tem promovido, desde o início da pandemia, uma série de eventos online de capacitação da equipe, o ConectAHI, que discute e aprofunda temas relacionados à retomada da demanda e melhores práticas para a comercialização e operação hoteleira no cenário que se apresenta. Outro ponto que observamos na pandemia, especialmente ao longo do segundo semestre, foi o destaque para o segmento de viajantes a lazer. Vimos clientes que procuraram nossos hotéis como uma alternativa ao home office, clientes que buscaram os hotéis para viagens curtas de ‘descompressão’, mas também vimos um movimento de turistas que tipicamente viajam para o exterior e que, durante a pandemia, se viram forçados a buscar destinos dentro do Brasil. No Nordeste, por exemplo, a demanda se manteve praticamente estável em relação ao ano anterior. Esperamos que esse legado permaneça após a pandemia. Apesar dessa recuperação gradativa da demanda, acreditamos que o movimento de conversões de hotéis se intensificará este ano. Temos um pipeline de contratos de novos hotéis que frutificará ao longo do ano. Parte desses hotéis eram projetos previstos para 2020, mas que tiveram sua abertura postergada pela queda na demanda. Demos continuidade ao nosso plano de expansão. Em dezembro, por exemplo, anunciamos uma nova parceria com a Bristol Hotels, de Belo Horizonte, e a nossa entrada num novo segmento de negócios, o Atlantica Residences, responsável pela administração de apartamentos e estúdios com serviços. Por fim, avaliamos que apesar da pandemia e dos impactos gerados para o setor, a AHI reagiu bem à crise, com ações eficientes para suportar clientes, parceiros e investidores” – Eduardo Giestas.

Desafios para 2021

Com certeza a segunda onda, o desgaste emocional das equipes, pois trabalharam muito para a reabertura. A confiança do consumidor, incertezas da malha aérea, que depende muito do turismo de negócios e ajuda o turismo de lazer são os principais desafios” – Francisco Costa Neto.


Elenco três grandes desafios enfrentados em 2020. O primeiro foi o de adotar com agilidade as medidas de austeridade e contingenciais, incluindo a redução do quadro de pessoal, para responder a uma queda de dois terços das receitas dos hotéis da rede, buscando atingir o breakeven nos níveis mais baixos possíveis. O segundo foi o de elaborar e implantar com brevidade os protocolos de higiene e segurança da Nobile com o objetivo de preservar a saúde dos nossos colaboradores, hóspedes e fornecedores, de tal maneira a manter os hotéis em funcionamento de forma sustentável e segura, gerando credibilidade às nossas operações e garantindo a demanda dos nossos clientes da rede. O terceiro desafio foi o de ampliar a comunicação com nossos investidores no sentido de comunicar as medidas adotadas pelo nosso Comitê de Crise no enfrentamento dessa crise global provocada pela Covid-19 num cenário de total imprevisibilidade”– Roberto Bertino.


Lições da pandemia - Paulo Roberto CaputoFoi tudo muito rápido, de um dia para o outro tudo tinha mudado. Não se tinha ideia do que iria acontecer com as pessoas, com a empresa, enfim, uma sensação que nunca tínhamos sentido antes. Então, o grande desafio era agir rápido, tomar decisões duras e passar para colaboradores, investidores e mercado em geral que a empresa iria sobreviver e que tinha um plano para enfrentar a crise. Assim, rapidamente fechamos todos os hotéis ainda no mês de março, renegociamos todos os compromissos visando preservar o caixa e já iniciamos o plano de reabertura, hotel por hotel, de acordo com a evolução de cada mercado”– Paulo Roberto Caputo.

 


O ano de 2020 foi um período que podemos considerar ter sido um MBA na prática, pois revisamos e reforçamos a gestão dos negócios em todas as frentes. No início, pelo próprio desconhecimento geral sobre a Covid-19, inclusive por parte dos profissionais da área médica, fiquei assustada com as reportagens sobre o vírus. Felizmente, o ser humano é dotado de resistência e elasticidade para se adaptar ao novo, com soluções sempre muito assertivas. Neste sentido, os maiores desafios foram identificar os pontos que seriam mais atingidos e aplicar essas soluções em alta velocidade. Ou seja, o processo do pensar, fazer acontecer na prática, acompanhar os resultados, organizar e reorganizar as soluções foi ainda mais dinâmico e preciso. As decisões e ações foram muito rápidas! E isso colocou à prova a cultura, os valores, a solidez do nosso conhecimento, procedimento e processos, além das práticas e equipe preparada para realizar eventuais ajustes e mudanças. Ao olhar para trás, vejo o trabalho incrível que foi realizado pela nossa equipe, que ficou firme à frente da gestão de riscos, dos recursos financeiros, da mudança radical na operação dos hotéis, mesmo com o fechamento temporário de muitos deles. Cada etapa era monitorada e compartilhada diariamente por todos os envolvidos nesse processo desafiador, o que nos permitiu agilidade no direcionamento das ações. Assim, com uma intensa união de esforços, superamos os desafios com celeridade, tranquilidade mental e sentimento de segurança”– Chieko Aoki.


O turismo no Brasil precisa ter estratégias de longo prazo para consolidar-se no mercado internacional. Um dos objetivos principais deve ser torná-lo sustentável, com um ambiente de negócios mais favorável para novos investimentos, para que ele assim possa ser uma atividade com maior relevância, gerando mais renda e emprego por todo o país, desde pequenas a grandes cidades. O setor turístico pode ser um dos principais indutores do crescimento de nossa economia. Exemplos não faltam em todos os continentes, com diversos países que muitas vezes não possuem tantos atrativos naturais e culturais mas souberam se estruturar para ocupar espaço no mercado internacional. Nosso país possui opções de destinos e hotéis para todos os tipos de turistas. No momento, ainda estamos retomando as atividades e precisamos ter cautela, observar as recomendações das autoridades e continuar trabalhando para que o turismo – e consequentemente a hotelaria – possam de fato alçar números compatíveis com seu potencial, se equiparando aos principais destinos do mundo” – Manoel Linhares.


Lições da pandemia - Orlando de SouzaO maior desafio de todos foi definir e implementar medidas que pudessem alongar a disponibilidade de caixa dos hotéis, uma vez que, as receitas de uma hora pra outra, foram a zero. Assim o desafio seguinte foi articular junto ao governo federal, ações de amparo a essa deficiência de fluxo de caixa/receitas tais como: suspensão de contratos de trabalho/redução de jornada e salários com a implementação do benefício emergencial; a não obrigatoriedade de imediato reembolso das reservas feitas antecipadamente, transformando em crédito ou na possibilidade de remarcação; e também na capitalização do Fungetur e a possibilidade de que pudesse fazer empréstimos não só para obras e investimentos mas também para capital de giro”– Orlando de Souza.


O setor do turismo foi um dos mais impactados pela pandemia. Tanto as viagens corporativas, quanto as de lazer, tiveram uma redução drástica no período. No entanto, com o fim da primeira fase crítica da pandemia, acompanhamos a volta do funcionamento dos hotéis, e hoje temos um inventário de quartos em operação maior do que o pré-pandemia. Nosso desafio e grande foco em 2020 foi garantir a segurança e integridade física dos nossos hóspedes e colaboradores, bem como a sobrevivência financeira dos nossos empreendimentos, minimizando a necessidade de aportes de capital e facilitando o acesso a linhas de crédito aos investidores, nossos principais clientes. Como parte da estratégia de recuperação, desenvolvemos parcerias e criamos novas oportunidades de receitas para os empreendimentos, ajudando os hotéis da rede a enfrentarem esse momento. Dessa forma, focamos em campanhas institucionais digitais, visando alavancar o número de reservas; fizemos blitzes virtuais nas agências de viagens corporativas; e estreitamos o nosso relacionamento com a Abracorp e com as OTAS. Um dos principais desafios que a pandemia nos trouxe foi acompanhar a propagação do vírus, que se disseminou de uma forma muito rápida pelo mundo. Por isso, agimos rapidamente e implementamos um comitê multifuncional para monitorar diariamente o avanço da Covid-19. Mantivemos um canal aberto com os hotéis e investidores para comunicar as medidas que estavam sendo tomadas para garantir a rápida execução de procedimentos adequados para mitigar o impacto da pandemia”, conta Giestas. “Junto com a preocupação de garantir os protocolos internos de segurança, também houve o desafio de reforçar a nossa presença e relacionamento junto ao trade. Por isso, buscamos informações sobre a retomada do mercado e mantivemos a equipe operacional informada e capacitada através de encontros quinzenais. Também reforçamos ações corporativas de Day Use e Day Office em que os hóspedes eram incentivados a trabalhar do hotel – especialmente aqueles que encontravam dificuldades em desempenhar seu trabalho de casa. Também trabalhamos segmentos de mercado específicos (saúde, farmacêutico, offshore, TI, entre outros), que permaneceram ativos durante a pandemia devido à natureza essencial de suas profissões, e que mantiveram suas necessidades de hospedagem” – Eduardo Giestas.


Lições da pandemia - Thomas DubaereA pandemia foi, sem dúvida, o maior desafio para todos os setores no Brasil e no mundo todo em 2020. O mercado de turismo, muito afetado, teve que se adaptar e inovar para atender às novas necessidades de nossos clientes. Por outro lado, o turismo interno / local foi crescendo e ganhando ainda mais importância, pois os viajantes tiveram que pausar suas férias internacionais e buscar viagens mais próximas, principalmente aquelas feitas de carro. Inquestionavelmente, esta pandemia ainda é um desafio contínuo, mas acredito que o pior já passou. As adaptações necessárias foram feitas e com a vacina, nossa esperança é testemunhar o controle do vírus– Thomas Dubaere.

(*) Crédito da capa: geralt/Pixabay 

(**) Crédito das fotos: Divulgação

(***) Crédito da foto Thomas Dubaere: Matt Writtle/Accor