Apesar do breve alívio em 2020, a inflação retorna com o cenário desanimador para os brasileiros. Os dados divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) na semana passada, revelam que o rendimento médio real (descontada a inflação) domiciliar per capita caiu 6,9% em 2021, frente ao ano anterior. Passando de R$ 1.454 para R$ 1.353 mensais, a média atinge o menor valor da série histórica da Pnad contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua), iniciada em 2012. As informações são do Correio Braziliense.

No total, o rendimento mensal real domiciliar per capita encolheu 6,2% em relação a 2020, chegando a R$ 287,7 bilhões em 2021, o segundo menor valor desde 2012 (R$ 279,9 bilhões). No recorte regional, o Norte e o Nordeste registraram as maiores perdas, de 12,5% e 9,8%, respectivamente, para R$ 871 e R$ 843 mensais. Enquanto o Sul e Sudeste, permaneceram relativamente estáveis, indo de R $1.656 a R$ 1.645, respectivamente, de acordo com o IBGE.

Ainda que afete toda a população, não é novidade que os mais vulneráveis seriam os mais impactados. “A maioria das rendas perdeu valor, mas os mais afetados foram os que ganhavam menos e tiveram uma melhora de renda fictícia durante a pandemia. E essa perda de renda fez com que a desigualdade aumentasse, principalmente, entre os mais pobres”, destacou Alessandra Scalioni, analista do IBGE.

Desigualdade social

No que se refere a renda fictícia, o auxílio emergencial fez com que 2020 fosse um ponto fora da curva quanto ao desequilíbrio social e econômico de um país. Com o fim do programa, a desigualdade voltou a crescer em 2021, com o Índice Gini do rendimento mensal real domiciliar per capita passando de 0,524 para 0,544, mesmo patamar que em 2019.

“De uma maneira geral, após a injeção massiva de recursos durante a pandemia, estamos vendo o fim da anestesia via auxílio emergencial”, destacou Marcelo Neri, economista e diretor da FGV Social (Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas). “Esse efeito na renda média fala por si, porque 2020 foi um ano excepcionalmente bom por causa do auxílio generoso, que não durou em 2021. E a redução do benefício, em termos de quantidade e de valores, explica a queda da renda e o aumento da desigualdade em 2021”, continua.

Apesar do recente recuo do desemprego, há uma precarização do mercado de trabalho e, consequentemente, redução das remunerações, além da inflação mais elevada. Por conta destes fatores, Neri acredita que em 2022 os dados sejam ainda piores.

“Embora a comemoração do aumento da ocupação no mercado de trabalho seja justa, há outros fatores como inflação e perda de renda que devem predominar daqui para frente”, afirma Neri. “O Banco Central, se seguir o manual, vai continuar subindo os juros diante da inflação, que continua elevada. E isso vai impactar negativamente em três pontos: no crescimento, na desigualdade e na instabilidade”, alerta.

Já para o economista e professor do Insper, Sérgio Firpo, os dados revelam um retrocesso generalizado, devido à falta de políticas públicas para minimizar o problema da desigualdade no país. “O mercado de trabalho tem um número absurdo de MEIs trabalhando por conta própria que não têm o mesmo rendimento garantido do emprego formal, que paga um salário mínimo, pelo menos.”, lamenta.

“Não existe uma política voltada para a qualificação e não vemos nenhum dos pré-candidatos às eleições com uma plataforma. Parece que todos têm medo de falar sobre o assunto”, acrescenta.

Comércio desacelera

Embora o comércio tenha crescido nos últimos meses, o ritmo vem desacelerando rapidamente, conforme dados da Pesquisa Mensal de Comércio, divulgada na semana passada pelo IBGE. Para Fábio Bentes, economista sênior da CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo), a inflação e juros elevados prejudicam bastante, mas as liberações de recursos, como FGTS e antecipação do 13º, podem contribuir para aumentar o consumo.

“O cenário atual não é favorável para a ampliação de vendas. A inflação está em alta, os juros estão subindo e o mercado está evoluindo de forma lenta. Os quatro meses de alta no volume de vendas, foram uma surpresa, mas sabemos que, no segundo semestre, não haverá muitos estímulos para o consumo”, alertou Bentes.

Quanto ao impacto da política monetária na economia, o economista lembrou que os efeitos das altas da taxa básica da Selic (12,75% ao ano), são esperados para chegar no segundo semestre de 2022.

(*) Crédito da foto:  Viki Mohamad/Unsplash