Cada vez mais brasileiros trabalhando por salários gradualmente menores, além de recorde de profissionais sem carteira assinada: este é o cenário do mercado de trabalho brasileiro. Segundo especialistas entrevistados pela BBC News Brasil, em matéria veiculada pela Folha de S. Paulo, a situação é incomum e desfavorável. Ainda assim, o setor de serviços segue como o maior gerador de empregos, com destaque para a hotelaria e alimentação, de acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

A taxa de emprego de 9,3% do segundo trimestre foi a mais baixa desde o mesmo período de 2015. O rendimento médio, no entanto, se manteve estável em comparação ao mês anterior e sofreu queda de 5,1% frente ao mesmo trimestre do ano passado, ainda segundo informações do IBGE.

De acordo com a pesquisadora Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), Maria Andreia Lameiras, o panorama é inesperado por economistas, visto que normalmente o mercado de trabalho reage com certo atraso ao crescimento da economia. Tendo em vista os impactos da pandemia no setor de serviços, no entanto, essa regra não se aplica à atual situação.

“Temos um aumento brutal da demanda por serviços e sabemos que o setor de serviços é o que mais emprega no Brasil. Então toda a demanda reprimida que a gente tinha, por conta da pandemia, ela chega no mercado de uma vez só”, explica Maria Andreia. “Além do Auxílio Brasil, que está injetando dinheiro na economia como um todo”, acrescenta.

Segundo a teoria econômica nomeada Lei de Okun, que propõe uma relação entre a taxa de desemprego e a dinâmica do PIB, o desemprego no país deveria estar mais próximo de 11% ao invés de 9%. Segundo Bráulio Borges, economista-sênior da consultoria LCA e pesquisador-associado do FGV IBRE, isso só não se concretizou por conta das características da retomada.

“Vemos que o PIB brasileiro está sendo muito puxado neste ano e desde o final do ano passado por alguns segmentos que demandam muita mão de obra, principalmente os serviços —’outros serviços’ de um modo geral, serviços domésticos— e construção civil”, avalia Borges.

Setores geradores de empregos

Abaixo, seguem os principais setores geradores de postos de trabalho do segundo trimestre de 2022, frente aos valores do mesmo período do ano passado, de acordo com o IBGE:

  • Alojamento e alimentação (23,1%, ou mais 1 milhão de pessoas)
  • Serviços domésticos (18,7%, ou mais 931 mil pessoas)
  • Outros serviços (18,7%, ou mais 805 mil pessoas)
  • Comércio, reparação de veículos automotores e motocicletas (14,2%, ou mais 2,4 milhões de pessoas)
  • Construção (11,2%, ou mais 753 mil pessoas)
  • Indústria geral (10,2%, ou mais 1,2 milhão de pessoas)
  • Transporte, armazenagem e correio (10%, ou mais 463 mil pessoas)
  • Administração pública, defesa, seguridade social, educação, saúde humana e serviços sociais (5,5%, ou mais 893 mil pessoas)
  • Informação, comunicação e atividades financeiras, imobiliárias, profissionais e administrativas (5,1%, ou mais 568 mil pessoas)

Rendimento baixo e informalidade

Esse fenômeno, no entanto, também ajuda a explicar a queda nos salários reais. “Esses setores demandam muita mão de obra, mas, ao mesmo tempo, pagam salários baixos, geralmente pouco acima do salário mínimo, e isso ajuda a entender um pouco outro aspecto: os salários reais estão caindo também”, diz Borges.

Segundo o economista, é uma situação incomum, posto que com o desemprego relativamente baixo, era esperado que o comportamento dos salários estivesse mais favorável. “Então os salários estão realmente perdendo, e bastante, da inflação, mesmo com a economia gerando mais e mais empregos em termos quantitativos”, complementa.

Por conta dos mesmos efeitos, a informalidade no setor privado também atingiu número recorde, ao incluir mais de 13 milhões de pessoas, alta de 23% no comparativo anual. Segundo Maria Andreia, é uma resposta natural em função das incertezas do empregadores sobre o cenário econômico atual.

“O emprego informal sempre vai existir, mas podemos diminuir, trazendo esse trabalhador sem carteira para o trabalhador com carteira, esse conta própria para um conta própria com CNPJ — e o caminho é crescimento econômico”, pontua Maria Andreia. “Não existe maneira mais eficaz de criar emprego de qualidade do que crescendo de maneira forte e sustentável”, completa a economista.

(*) Crédito da foto: Rodrigo_SalomonHC/Pixabay