A capacidade de dialogar é o que nos diferencia da selvageria. O diálogo carrega consigo sinônimos e variações nem sempre bem vistas pelas pessoas, como “debate” e “discussão”. Contudo, o que é enxergado como problema por alguns é, para gestão de conflitos, o percurso a ser trilhado rumo à solução.

Ao aplicar este modelo à hotelaria, que passa por fechamentos, quebra e rediscussões de contratos, é possível entender o quão necessário é um mediador em situações de divergência profissional.

A Covid-19, por exemplo, foi o elemento surpresa que reforçou conflitos, sem dúvidas, mas até que ponto? Uma bola de neve já formada só precisa de um empurrão para rolar a montanha. A metáfora serve para dizer que conflitos são inerentes, ou seja, à natureza do ser humano. E, enquanto houver civilização, a gestão desse tipo de situações por terceiros será necessária. Como citado, épocas de crise exigem mais paciência, empatia e técnicas.

Gestão de conflitos

Carol: conflito faz parte de ser humano

É o que diz Alessandra Mourão, professora de Negociação e Gestão de Conflitos da FGV (Fundação Getulio Vargas). Em entrevista à reportagem do Hotelier News, a especialista, responsável pela criação do curso da área na mesma instituição que leciona, afirmou que o ponto de partida está em saber o objetivo com a negociação.

“A hotelaria foi um dos setores mais afetados pela pandemia, então está entre as que mais precisam gerir desarranjos. De forma prática, traçar um plano com os resultados esperados ajuda na estratégia a ser adotada na gestão de conflitos. No meu trabalho específico, tento aliar esse caminho à sustentabilidade dos negócios envolvidos no processo. Não sabemos o dia de amanhã, portanto, buscar o melhor acordo faz com que portas não sejam fechadas”, explica.

Ao falar sobre isso, Alessandra alerta ao contexto atual: a sobrevivência é o foco de todas as partes, independente do problema. Manter-se vivo no mercado deve ser prioridade.

Também professora da FGV na mesma disciplina, Carol Hannud relembra que as práticas da gestão de conflitos surgiram em meio à Guerra Fria, período em que a iminência pelo confronto nuclear entre URSS (União Soviética) e EUA (Estados Unidos) trouxe a necessidade, mais uma vez, do diálogo entre partes que discordavam uma da outra. Colocado o cenário, entende-se que a adoção da prática não aconteceu ontem. É um arcabouço histórico importante que reforça ainda mais o resultado positivo disso.

“É uma tríade formada por pesquisa sobre o assunto em discussão, técnicas de negociação e questões emocionais. Diferente de tribunais, nos quais é comum o advogado ver o outro como ‘rival’, a gestão de conflitos deve ter a visão colaborativa e empática. É um processo de pensamento analítico somado a intuição do mediador ou gestor. Mais que isso, falta entendê-la também como instância na qual há menos gastos financeiros, desgaste emocional e, principalmente, controle da decisão final. O veredito do juiz, às vezes, não agrada lado nenhum”, aponta Carol.

Gestão de conflitos

“Ouvir mais e falar menos é uma boa técnica”, diz Alessandra

Bons acordos com a gestão de conflitos

Entenda essa gestão como a pavimentação da sua rua. O ponto crucial será deixar o caminho nivelado, sem buracos e, no mínimo, utilizável aos passantes. É assim que gerir conflitos funciona. Agora, de forma literal, como conduzir bons acordos? Segundo a professora Alessandra, a boa costura na negociação se dá, inicialmente, pelo fato do negociador não estar envolvido ou desgastado emocionalmente com nenhuma das partes – apesar de sempre ser contratado de uma delas.

“É uma forma de quebrar a turbulência preexistente e conversar de forma produtiva. Sem a imersão total no caso, é possível pensar abertamente sobre soluções criativas e sem escolhê-las previamente. É um caminho aceitável para ambos os lados guiado pela imparcialidade e, essencialmente, pelo ato ouvir mais e falar menos”, fala a especialista.

Em complemento, Carol junta as pontas e, voltada à técnica da gestão de conflitos, cita também a busca por informações da empresa ou pessoa, entender esses anseios, frustações, cultura e crenças. “O preparo está em ter referências e usá-las para mediar o ocorrido. Não basta saber tudo de negociação e simplesmente entender o básico do assunto abordado ali. Se inteire, busque comunicação, relacionamento e naturalize o conflito para tratá-lo”, conclui.

(*) Crédito da capa: Romain V./Unsplash

(**) Crédito da foto: Acervo pessoal

(***) Crédito da foto: Acervo pessoal