No início da pandemia, grande parte dos trabalhadores se viram obrigados a mudarem suas rotinas, adaptando-se ao home office. O que antes parecia uma medida temporária vem se perpetuando há quase seis meses. Confinados com filhos e altas demandas de trabalho, como manter o foco e equilíbrio para alcançar objetivos profissionais de dentro de casa?

Segundo Ednaldo Pereira, treinador do Instituto Foco no Essencial, é preciso criar uma rotina muito poderosa para fazer uma mudança tão drástica como o home office. “Envolve muitos pontos pessoais, porque quando você tem a empresa, toda a questão do deslocamento prepara você mentalmente para estar naquele lugar”. Além disso, no ambiente físico de trabalho existem horários de entrada e horário de saída, o que ajuda as pessoas a executarem suas tarefas da melhor forma possível. “Em casa sempre existe aquela ‘puxadinha’ e muitas pessoas cederam. Acredito que algumas empresas gostaram muito disso”, analisa.

Com isso, o tempo passa a ficar mais apertado e as distrações são fatores que somam ainda mais para o resultado da exaustão ao fim do dia, influenciando nos objetivos profissionais. “O desafio em trabalhar em casa é dividir o espaço, as tarefas domésticas e, em especial, o cuidado e acompanhamento dos filhos”, comenta Clímaco Nardi, profissional para o desenvolvimento humano.

Para enfrentar o desafio, Pereira recomenda uma técnica que intitula de “método Disney”. A metodologia é baseada nos funcionários que se fantasiam dos personagens no universo Disney World. Nos parques, há uma faixa amarela que separa a pessoa que incorpora o personagem, do próprio personagem. Ao ultrapassar esse limite, o funcionário passa a interpretar o papel no qual está caracterizado e deixa sua personalidade de lado.

Transmutando isso para a nova realidade dos colaboradores, Pereira recomenda a construção da faixa amarela em casa. “As pessoas vão ter que começar a ter o espaço delimitado de trabalho, ao invés de ficar com o computador no colo em qualquer lugar. Ter um espaço que a pessoa sai do papel de marido, esposa, e entra no papel de profissional”, diz.

Pensando nesse papel dentro da família, inclusive, os relacionamentos passam a ser afetados por uma convivência mais constante, e em um cenário tão atípico. “Então, emocionalmente este momento atual nos desafia revermos a maneira como cuidamos dos nossos relacionamentos”, analisa Nardi. “Talvez seja necessário contarmos com ajuda, primeiro das pessoas com as quais nos relacionamos e isso começa como o compartilhamento das próprias necessidades e das dificuldades em atendê-las”, conclui.

Ao que Pereira complementa que, justamente por essa dificuldade em atender todas as necessidades, é preciso aprender a dizer “não” para algumas coisas. “Quando você está em casa é preciso falar muitos ‘nãos. É preciso abrir mão de algumas coisas”, comenta.

Além disso, estabelecer uma rotina de trabalho é fundamental, caso contrário, existe uma demanda psicológica muito alta para não se perder meio às distrações. “Do mesmo jeito que você acorda de manhã e escova o dente, e não fica pensando muito, o trabalhar em casa tem que começar a ser um hábito. Para que isso não fique cobrando todos os dias um autocontrole”, afirma Pereira. E isso ainda precisa ser transmitido para as crianças, para que elas saibam que você está trabalhando da mesma forma como se estivesse no escritório.

objetivos profissionais - Ednaldo Pereira

Pereira recomenda técnica intitulada como “método Disney”

Objetivos profissionais: tipos de personalidade

No contexto de trabalho remoto, para algumas pessoas passar para o home office foi algo natural devido ao seu estilo de personalidade e sua forma de se relacionar com o trabalho. “São pessoas pragmáticas, para as quais, objetivos, metas e tarefas são prioridades”, explica Nardi.

Mas nem todo profissional tem o mesmo perfil e segue esses mesmos padrões. “Muitas pessoas contam com o contato social presencial para motivá-las a alcançar seus objetivos profissionais. Organizam suas vidas no trabalho a partir dos relacionamentos”, conta Nardi. “O encontro e a conversa espontânea são momentos de descontração e nutrição. O que pode aumentar a confiança depois de um alinhamento final com um colega na porta da sala de reuniões. Então, conhecer o seu estilo de personalidade e os recursos próprios favorecem a adaptação ao trabalho remoto”, recomenda.

Neste momento, o especialista recomenda uma comunicação aberta e franca. “Os líderes com os quais tenho contato esperam que suas equipes apresentem as dificuldades com o momento atual o quanto antes. A interação se dá por uma tela de poucas polegadas, com isso perdemos a leitura dos sinais não verbais, não nos percebemos mais como antes”, conta. “É importante levar os líderes os desconfortos e desafios do momento. Embora remoto, temos que ser mais juntos e compartilharmos as necessidades se quisermos manter a qualidade e a produtividade”.

Outra dica valiosa que o profissional aponta é compartilhar experiências do dia a dia. Seja com um colega de trabalho de confiança, um amigo fora da empresa ou um profissional. “Se faz muito necessário falarmos do que estamos vivendo e de como nos sentimos. Geralmente guardamos nossos pensamentos e emoções, há muitas crenças sobre falar de si, umas delas é mostrar-se vulnerável”, esclarece. “Socialmente temos que nos mostrar fortes e espertos, prontos para os desafios, mas isso aumenta muito a pressão interna. Quando não compartilhamos às vezes despejamos, comprometendo os relacionamentos, e este é sem dúvida, o maior impedimento para um bom desempenho profissional, pois não fazemos nada sozinhos”, finaliza.

objetivos profissionais - Climaco Nardi

Nardi afirma que tipos de personalidade influenciam em como lidar com o home office

Foco e equilíbrio

Depois de algumas dicas sobre como gerir a equipe em home office, o Hotelier News apresenta agora pontos chave para manter o equilíbrio sem desviar dos objetivos profissionais. De acordo com Pereira, o foco é um instrumento que vai separar as pessoas de sucesso das pessoas de fracasso. Para auxiliar nesse processo, existem cinco âmbitos vitais para estabelecer uma rotina saudável. O profissional elencou e especificou cada um. Confira:

1) Corpo: durante a pandemia, muitas pessoas abandonaram suas rotinas de exercício, e passaram a se alimentar mal, fazendo visitas recorrentes à geladeira, uma vez que ela está mais próxima e disponível. “Muitas pessoas deixaram de cuidar do corpo, de fazer exercício, e houve um maior foco no trabalho pelo medo de perder o emprego devido às maiores taxas de demissão com a crise”, diz Pereira. “Mas a rotina de qualidade precisa que você esteja com o corpo bem, vitalidade, disposição, se alimentando corretamente, tudo isso vai ajudar a manter foco e equilíbrio”, recomenda.

2) Mente: só a alimentação saudável e exercícios, porém não é o suficiente. “Às vezes ficar trancado dentro de casa com a família é um desafio e a mente precisa ter um autocontrole muito poderoso para não perder o foco”. Nesse momento, entra o conceito Disney recomendado pelo profissional, com delimitação de espaço para garantir uma maior concentração. “O foco é uma energia, como qualquer outra, e se eu não cuidar dela, ela vai se dissipar. E depois que ela dissipa, não consigo fazer ela voltar. E muitas pessoas já entenderam isso, estão ganhando performance trabalhando dessa forma, mas é preciso construir hábitos todos os dias”, pontua Pereira.

3) Emoções: atrelados à mente, as emoções são também pontos chaves para encontrar o equilíbrio desejado no ambiente de casa. “As pessoas tem que aprender e encaixar a rotina de uma forma com muita clareza, porque muitas vezes falta essa clareza do que está fazendo e a importância do que se está fazendo”, analisa Pereira.

4) Tempo: “tempo é um capital que vai separar muita gente entre o sucesso e o fracasso. Não existem mais o ambiente, não existe mais a quebra, então estando em casa o foco tem que estar totalmente alinhado com o que a pessoa está fazendo. É o que chamamos de atenção focada, você está trabalhando, então atenção no trabalho”, comenta Pereira.

5) Finanças: durante a pandemia as pessoas ficaram mais suscetíveis às compras, que alinhadas com as facilidades tecnológicas, resultam em um consumo excessivo e sem grandes considerações. “Problemas financeiros, ou porque existe um gasto maior, ou por causa de compras excessivas na internet, isso é um sabotador”, afirma Pereira.

(*) Crédito da capa: Free-Photos/Pixabay

(**) Crédito das fotos: Arquivo pessoal