Se antes da pandemia apreciar uma boa refeição em casa com boas companhias já era um programa quase irrecusável, com a chegada do coronavírus se tornou questão de segurança. Impossibilitada de sair para bares e restaurantes, a população buscou suprir a vontade de retomar a normalidade com incontáveis pedidos de delivery. O modelo foi o oxigênio de muitos negócios do setor de alimentação e uma grata descoberta para a hotelaria.

Para se ter uma proporção do avanço do segmento de 2020 pra cá, em um levantamento realizado pela CNDL (Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas) em parceria com SPC Brasil (Serviço de Proteção ao Crédito) aponta que 91% dos internautas brasileiros fizeram alguma compra online entre março do ano passado até abril de 2021. O crescimento representa o incremento de cinco pontos percentuais na comparação com o mesmo período em 2019.

O aquecimento na quantidade média de compras também é expressivo. Em um ano, aumentou de sete vezes para 8,5 vezes. Com a permanência das pessoas em casa, o delivery foi a categoria que mais cresceu no país. De acordo com o estudo, o número de internautas que realizaram ao menos um pedido em 12 meses dobrou frente a 2019, subindo de 30% para 55%.

Consequentemente, os gastos com aplicativos de entrega dispararam. Segundo uma pesquisa desenvolvida pela Mobilis, as despesas computadas nessas plataformas aumentaram 149% durante a pandemia. Os apps de delivery com maior demanda foram iFood, com crescimento de 172%, Rappi (121%) e Uber Eats (37%).

Para Percival Mericato, presidente do Conselho Estadual da Abrasel-SP (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes – Seccional São Paulo), a tendência veio para ficar. “Acredito que essa é uma demanda que não irá se perder. Talvez haja uma redução com a volta do presencial, o que é melhor para nós. Futuramente, a oferta do delivery será ainda maior e mais variada em termos de valores”.

delivery - masserini

Delivery Masserini impulsionou a receita de A&B

Delivery e a hotelaria

Os números de crescimento das plataformas de entrega são impressionantes e contaram com a colaboração do setor hoteleiro. Com a falta de hóspedes, muitos empreendimentos enxergaram no delivery uma maneira de obter alguma receita e não naufragar perante a crise.

A Laghetto Hotéis firmou parceria com seis restaurantes de diferentes tipos de gastronomia. Já o Clarion Goiânia Órion passou a oferecer entregas para coffee break e happy hour. Para a Accor, o A&B (Alimentos & Bebidas) tem como tradição uma parcela importante do faturamento. Em São Paulo, a rede francesa implementou o delivery e take away nos bares e restaurantes de suas unidades.

Apesar de estar localizado nas dependências do Sol Ipanema Hotel, o restaurante Masserini sempre operou de forma independente. Aberto em 2018, o espaço foi pensado para atender ao público carioca. Com vista para o mar e um menu onde os frutos do mar são as estrelas, o empreendimento já operava com sistema de delivery mesmo antes da pandemia, mas sem sucesso.

“Não conseguíamos emplacar o delivery por sermos especializados em frutos do mar e demandar um ticket médio mais elevado. Era uma fatia pouco representativa para o restaurante. Desde o início mantemos parcerias com o iFood, mas acho que não sabíamos lidar. Achava que era uma plataforma que ajudava na divulgação, mas a logística é muito mais complexa até entendermos o que o cliente precisa e como conseguir êxito nas vendas”, pontua Danilo Chami, diretor do Sol Ipanema.

Reaberto em setembro de 2020 após cinco meses de paralisação, o empreendimento passou a dar mais atenção ao delivery. O Masserini fechou um contrato de exclusividade com o iFood e promoveu mudanças no menu da plataforma. “Preparamos um cardápio para o aplicativo com alguns pratos da casa. Percebemos que muitos não viajam bem e a entrega acaba não sendo boa”, conta Chami.

O acordo com o iFood foi assinado em fevereiro deste ano e o resultado veio. O restaurante passou a ter maior relevância na plataforma e as vendas explodiram. “Hoje, estamos nas principais listas do aplicativo. Para se ter uma ideia, o número de pedidos cresceu 350% nos últimos três meses. Do meio de abril pra cá, conseguimos nessa guinada”, esclarece o diretor.

Mericato afirma que as adaptações de menu são parte fundamental da estratégia do delivery. “É preciso ter em vista a origem dos ingredientes, facilidades para desenvolver o produto e pensar na entrega, para que esteja de maneira apresentável ao cliente. Alguns pratos são difíceis transportar”.

Precificação e estratégia de vendas

Ao precificar o menu do delivery é necessário levar em conta muitas variantes, como a taxa de comissionamento das plataformas e a sazonalidade dos produtos. “Você tem uma ficha de custo e a margem de lucro que procura obter. Por isso mesmo que os restaurantes desenvolvem cardápios específicos. É preciso levar em consideração a mão de obra, manipulação dos alimentos, transportes e analisar a concorrência”, acrescenta Mericato.

No Masserini, o sucesso de vendas veio como consequência de algumas iniciativas. O restaurante promoveu uma campanha de incentivo para clientes avaliarem o espaço no iFood com o intuito de melhorar seus serviços. “Só recebemos 5 estrelas desde então. Também entendemos que fotos bonitas dos pratos são fundamentais. A pessoa precisa de um estímulo visual para o que ela vai pedir”, revela Chami.

Outra sacada foi a criação de um menu executivo para clientes em home office, composto por entrada e prato principal. O restaurante também passou a abrir pedidos às 11h30, cerca de meia hora antes da concorrência. “Desta forma, pegamos o pessoal que quer almoçar meio dia. Como nossa cozinha não para, trouxemos o chef antes e esse intervalo de 30 minutos fez toda a diferença”.

Embalagens que conservam a qualidade dos alimentos foram implementadas e os plásticos foram abolidos. “Investimos em embalagens com furos para a comida chegar bem e passamos a aceitar o ticket refeição no almoço para quem está em home office. Passamos a olhar com uma lupa os pedidos, avaliações e concorrência”, complementa o diretor.

Adaptações e receita

Chami explica que não foram necessárias grandes adaptações operacionais. Uma praça foi separada exclusivamente para o delivery como forma de ganhar tempo e otimizar a entrega. “Nosso índice de atrasos é zero. Sempre estamos prontos antes do entregador”.

E o impacto da receita de A&B não poderia ser diferente de extremamente positivo. O diretor ressalta que apenas as entregas não sustentam o departamento, mas ajudou o hotel a se manter nos período maia sombrios da crise e reter funcionários. “Conseguimos manter o quadro de colaboradores trabalhando e lucrando. Fidelizar clientes é algo que estamos muito focados, mandando sobremesas de cortesia após certo número de pedidos”.

Daqui pra frente, os planos do Masserini são manter os menus sempre atualizados, investindo em promoções e almejando entrar em novas listas do iFood. “Queremos ganhar cada vez mais relevância na plataforma. Temos clientes que nos conheceram pelo aplicativo e hoje são frequentadores. Acredito que as demandas não irão cair, pois as pessoas perceberam que é possível ir além da pizza e do sushi no delivery”, finaliza.

(*) Crédito da capa: reprodução/goomer

(**) Crédito da foto: Divulgação/Sol Ipanema Hotel