(imagem: br.freepik.com)
 
O entorpecimento coletivo frente aos mundiais esportivos dos próximos anos enevoa algumas questões – que o Brasil tende a deixar abaixo do tapete, para fazer coro à indulgência típica.
 
Pela última semana, durante debate sobre os possíveis legados que tais eventos podem trazer ao Brasil, Geoff Buckley, diretor da KPMG e ex-diretor do Tourism Australia, órgão oficial de turismo daquele país, palestrou sobre o tema com o case australiano, sede dos Jogos Olímpicos de 2000. Nessa malha, ele pontuou que o deslumbramento do povo e dos realizadores tende a ofuscar pontos relevantes.
 
Ao princípio colocado pelo palestrante, acrescenta-se a senha para a falta de tato com alguns pormenores: qual o legado que o mundial de futebol vai trazer à população brasileira no que diz respeito à educação e à cultura? São minúcias que, de fato, estão banidas do debate e seguem com tom de ninharia.
 
A análise da realidade e dos indicadores sociais brasileiros mostra um quadro alarmante em diversos aspectos. No que tange à educação, ainda que caminhos profícuos tenham sido traçados nos últimos anos, há lacunas seculares – que reverberam em muitos setores por conta da mão de obra. E o turismo, como de costume, não fica aquém da lista – uma vez que os serviços balizam atividade e, sublinhe-se, em tempos de Copa tal insígnia fica ainda mais taxativa.
 
Isto, por si só, vai fazer eco no turista estrangeiro por uma prerrogativa simples: a da imagem. Explica-se. Para que uma nação faça o melhor proveito ao sediar um mundial esportivo, atraindo visitantes e construindo ou reforçando a simbologia de destino turístico, é preciso que, antes de mais nada, sua própria população viva num campo de flores quanto ao desenvolvimento humano – anedota, exponha-se, por essas paragens. O estrangeiro, quando no Brasil, precisaria se sentir estimulado a residir no País, entender que aqui ele teria meios de criar seus filhos com respaldo para educação, cultura e estrutura econômica – principalmente se suas bases natais dão conta disto. Este desenho sim, se traçado para o visitante, seria um legado desmedido.
 
Exemplo básico de que tal ausência de benesses para os que vivem no país pode solapar a vitrine proporcionada pelos eventos pode ser observado na China. Quando das Olimpíadas de Pequim, em 2008, a poluição fez comum a corrida do turista olímpico à farmácia, na tentativa de minguar a falta de ar. “Uma bouillabaisse fotoquímica feita de fumaça de carvão, gosma de funilaria e canos de descarga, misturada a pó de concreto e assada no forno formado pelos morros que cercam a capital”, escreveu um jornalista, da revista Wired, certa vez sobre a definição do que é a maior nação do planeta.
 
Não é dessa estampa que o Brasil quer viver. Por esses procedimentos pontuais é que é preciso elevar o turismo à categoria de difusor social, de viabilizador do desenvolvimento humano e do País. Consciência coletiva é a palavra. Para tanto, a pauta deveria recair desde o ensino fundamental no que tange à formação do indivíduo – pois só assim ele compreenderia o papel econômico do setor.
 
Em contrapartida, não se debateu, em nenhum momento, desde que os eventos esportivos foram angariados, como incluir à educação formal a disciplina do turismo ou como conscientizar os que estão em fase fundamental de formação sobre a relevância desta indústria – para que isso se tornasse sintomático e fosse propagado para estrangeiros e, até mesmo, às futuras gerações. O que se vê são cursos de inglês instrumental, à distância, simplesmente para fazer meio-termo ao atendimento; lembrando cotidianamente a posição de semi-profissionalismo em que estamos metidos.
 
Diante desta situação, é evidente a necessidade de incluir a formação cultural do País no leque Copa do Mundo e Olimpíadas, dando fim às generalidades e ao discurso poliânico em letra miúda. De forma indissociável, uma vez que determinado ponto influencia outros, a falta de estrutura e os altos preços, por si só, já tomaram proporções epidêmicas e impossíveis de serem sanadas a essa altura. Nisto, o Brasil já falhou. Restou, pois, minimizar o dano viabilizando educação e cultura ao povo; abrindo mão das derivas estatizantes. É pouco, mas é o legado que pode sobrar.