São International Square (imagem: saointernationalsquare.com.br)
Projeto da Gafisa que conta com hotéis da Atlantica
é exemplo de complexo de uso misto
(imagem: saointernationalsquare.com.br)

O compromisso de trabalho agendado, claro, para as 9h é em determinado endereço, de modo que é preciso planejar toda a viagem de negócios em função do tempo de descolamento versus a localização do hotel versus a quantidade de compromissos em sua agenda. Ou você viaja e fica hospedado, de fato, em um lugar próximo do motivo de sua viagem, mas precisa comprar algo e descobre que está distante de qualquer centro comercial. Quem viaja para São Paulo, Rio de Janeiro ou em qualquer grande cidade de qualquer país já passou por uma situação parecida com esta, sofrendo com o trânsito. Quem vai a remotas cidades pequenas também reconhece a situação. A qualidade de vida frequentemente está associada à possibilidade de escapar do trânsito, de organizar seu cotidiano de uma maneira mais prática.

A praticidade é o mais óbvio – mas não o único – mote a favor do desenvolvimento de um tipo de projeto imobiliário que se vê crescer ano a ano: os complexos multiuso, ou de uso misto. Em linhas gerais, são empreendimentos desenvolvidos de forma planejada abrangendo prédios residenciais, lojas, shoppings, escritórios. Dentro do âmbito de turismo, os projetos incluem um ou mais hotéis. A tendência não é exclusiva dos últimos anos e nem do mercado brasileiro, mas vem sim sendo uma escolha frequente dos desenvolvedores da nossa indústria hoteleira – inclusive da Emoções Incorporadora, empresa do cantor Roberto Carlos.

Por Juliana Bellegard

Cidades, bairros ou condomínios planejados são tentativas de organizar o crescimento e desenvolvimento dos grandes centros populacionais e também dos municípios menores. Mas também são uma aposta comercial com grandes possibilidades de sucesso, pois apoia-se na combinação da necessidade de praticidade citada acima com a possibilidade de enxugar custos e dividir gastos. Os projetos de complexos unindo edifícios com diferentes funcionalidades, principalmente capitaneados por grandes construtoras e incorporadoras, apoiam-se exatamente nessa premissa.

Em tempos de entusiasmo – seja excessivo, seja fundamentado – com a indústria do turismo, a regra do planejamento também se aplica ao segmento de hospedagem. O desenvolvimento de hotéis perpassa uma série de questões discutidas à exaustão entre os players do mercado: demanda crescente ou risco de superoferta, meios e alternativas para o financiamento dos projetos, oportunidades, construção e dificuldade de encontrar bons terrenos a preços menos exorbitantes. Um investimento em um complexo de uso misto aparece, neste cenário, como uma possibilidade de contornar alguns desses problemas.

negocios (imagem: favip.edu.br)
(imagem: favip.edu.br)

Hotelaria
Em termos práticos, já se viu isso. Há complexos de entretenimento, por exemplo, que foram desenvolvendo-se aos poucos, chegando a seu tamanho e diversidade funcional com o passar do tempo e as adequações às necessidades do mercado. Aqui no Brasil, o Rio Quente Resorts é exemplo disso; no exterior, impossível não lembrar do Walt Disney World, ou nas estações de esqui com seus hotéis próprios. Mas há também empreendimentos que são, desde sua concepção original, um ordenado quebra-cabeça de edifícios e serviços, muitas vezes pensando mais no turismo corporativo do que no de lazer.

No início deste ano, a Mandarin Oriental inaugurou um hotel em Guangzhou, na China, dentro de um projeto nesses moldes; o W Panama, primeiro da marca na América Latina, fará parte da Evolution Tower, um edifício de uso misto; o InterContinental Osaka está instalado em um complexo na cidade japonesa que inclui, além de hospedagem, lojas e residências, um centro de convenções. Estes são apenas alguns exemplos.

A Atlantica é uma das diversas redes atuantes no Brasil que lançaram recentemente empreendimentos no formato de complexo multiuso, como o projeto da Gafisa com hotéis das bandeiras Comfort e Quality, em São Caetano do Sul; e o Brookfield Century Plaza, com unidades Quality e Go Inn, em Santo André. Não coincidentemente, ambos instalados em cidades da região metropolitana de São Paulo. Para Mateus Cabau, diretor Senior de Desenvolvimento da rede, estes projetos são “a capacidade de criar uma nova referência arquitetônica, um novo destino na cidade. O complexo surge através do melhor aproveitamento do terreno, pensando em empreendimentos sinérgicos e com um master plan eficiente”.

Mateus Cabau
Mateus Cabau, da Atlantica
(foto: divulgação)

A questão da sinergia, quando o empreendimento é bem sucedido, é uma das grandes vantagens para os hotéis ali inseridos. “O próprio complexo tem a capacidade de gerar uma demanda de hospedagem, de eventos e gastronômica para o equipamento hoteleiro. O complexo multiuso tem vida 24 horas”, opina Cabau. Antonio Setin, presidente da Setin Empreendimentos Imobiliários, é da mesma opinião, e cita alguns exemplos simples desta simbiose imobiliária: “quem trabalha no escritório, come no restaurante do hotel. O cliente da empresa hospeda seus executivos ali. A garagem pode ser usada por quem trabalha no complexo e pelos hóspedes, mas está sempre ocupada”.

Desenvolvimento
O tema dos complexos de uso misto foi debatido recentemente em São Paulo durante o Brasil Hospitality Investment Conference, no qual os participantes ressaltaram a importância do bom planejamento – desde a planta e a construção até a clareza na gestão – para a eficácia deste tipo de projeto. Para Clay Dickinson, vice-presidente executivo da América Latina da Jones Lang LaSalle Hotels, é preciso ver se cada um dos componentes do projeto é viável individualmente. A sinergia seria, portanto, um bônus.

Parte deste planejamento passa pela avaliação de como será a inserção do hotel dentro deste empreendimento. “A bandeira hoteleira é importante. A grife agrega valor”, declara Setin, cuja incorporadora trabalha com as marcas da francesa Accor. Entre os recentes projetos lançados por meio desta parceria, percebe-se uma variedade de perfis. O Mondial Osasco (SP) conta com três torres, uma com escritórios comerciais e as outras duas dedicadas à hospedagem com as bandeiras ibis, que atende o público classificado como econômico, e ibis budget, que tem os clientes de perfil super econômico. Já o Mondial Salvador (BA) tem duas torres com salas comerciais, apartamentos e um hotel da marca Adagio, que atende clientes long stay. O recém-lançado Mondial São Bernardo (SP) contará com quatro torres abrigando três hotéis da rede francesa – ibis, ibis budget e adagio -, um edifício residencial e um comercial.

Accor e Setin Empreendimentos
Antonio Setin, da Setin Empreendimentos Imobiliários, e Roland de Bonadona, COO da Accor, em lançamento de projeto conjunto
(foto: divulgação)

Setin ainda explica que outra das grandes questões referentes ao desenvolvimento hoteleiro – a financeira – também pode ser amenizada no caso do trabalho com um complexo multiuso. “Há a possiblidade de diluir os custos da operação entre os diferentes empreendimentos dentro do projeto. É sinergia não só de uso, mas de custos também”, diz. Dickinson, da Jones Lang LaSalles, também aponta que um investidor pode optar por não dar continuidade a um projeto hoteleiro viável por conta do tempo de retorno, menor em outros segmentos, mas a combinação de um hotel com outro empreendimento pode aumentar o retorno de ambos. Este também é um fator que faz com que tanto Setin quanto Cabau, da Atlantica, acreditem não haver grandes desvantagens em um projeto de uso misto.

Tendência?
“Esse tipo de produto tende a expandir por conta dos problemas de deslocamento que possuímos em nossas cidades e pelas muitas facilidades que se tem quando se consegue obter todos os serviços que uma pessoa precisa em um só local. A criação de pequenas comunidades autossustentáveis tende a ser um modelo vencedor”, afirma Franklin Mira, diretor de Negócios e Mercado da Odebrecht Realizações Imobiliárias. A empresa tem, dentro de seu portfólio, projetos como o Eurostars Brisas do Lago, em Brasília, e o Porto Atlântico, no Rio de Janeiro.

Complexo Porto Atlantico Leste - reduzida (imagem: divulgação)
Complexo Porto Atlântico Leste, um projeto da Odebrecht
(imagem: divulgação)

Antonio Setin explica que empreendimentos de uso misto já foram desenvolvidos anos atrás e, sim, voltaram a ser tendência pela questão da mobilidade urbana e pelo fato da hotelaria ter voltado a ser uma área interessante de desenvolvimento. Mateus Cabau tem opinião diferente. “Acredito que não seja tendência, pois este tipo de projeto necessita de grandes áreas, mercado imobiliário comprador e demanda. Mas tem uma aceitação muito grande porque oferece ao mercado imobiliário um master plan confortável, diversificado e sinérgico”, pondera.

Serviço
www.accor.com
www.atlanticahotels.com.br
www.joneslanglasalle.com.br
www.odebrecht.com
www.setin.com.br