José Ruy Veloso Campos
(foto: divulgação/Camila Gutierrez)

Na década de 1980, quando as empresas hoteleiras no Brasil eram ainda predominantemente familiares, os investimentos em marketing eram quase rudimentares. 

Os hotéis urbanos, nos grandes centros, experimentavam a expansão de suas áreas de eventos, os hotéis de lazer começavam a compreender a importância de seus espaços para as convenções e os hotéis do interior ganhavam novas roupagens e espaços para eventos.

Embora abalado por um processo inflacionário sem precedentes, o país vivia um momento em que o setor de serviços crescia, diante de mudanças de paradigmas.

Foi nessa época que começaram a surgir shopping centers país afora, aumentando exponencialmente a oferta dos serviços de alimentação e a consolidação dos serviços de fast food e praças de alimentação. 

Outra frente a ser lembrada foi o começo da informatização. Com um mercado fechado, numa perspectiva de nacionalismo atrasado, o país carecia de bons sistemas informatizados para a indústria da hospitalidade. E vários empreendimentos em informática para a área surgiram no período.

A chegada, no país, de diferentes bandeiras internacionais, de hotéis e de alimentação, e a grande expansão dos empreendimentos de flat service, geraram as primeiras concorrências efetivas na indústria, tanto para os investimentos, como para a venda de seus serviços. 

Do ponto de vista do marketing tudo era rudimentar, se olharmos a partir das perspectivas d’agora. 

Os gurus da época eram Peter Drucker, Michael Porter, John Naisbitt, Alberto Levy, Stanley Rapp, Alvin Toffler e certamente Philip Kotler, cuja primeira publicação sobre marketing data de 1967. 

Mas em meados dos 80 foi mesmo Stanley Rapp que, com seu colega Tom Collins, trouxe a reflexão sobre a importância do atendimento mais personalizado, chamado de Maxi Marketing, que fazia um contraponto com os ainda insipientes sistemas informatizados e pela sofreguidão das campanhas na TV, pouco personalizadas.

Fazia sentido. A tese era atacar seu público alvo diretamente, falar com o seu cliente, dar-lhe atenção, resgatar os cumprimentos no aniversário etc. Disso resultou uma enxurrada de folhetos em mala direta. Era uma ferramenta cara. A produção de folhetos a quatro cores para qualquer promoção dos hotéis, como as temporadas, o novo restaurante, as datas festivas etc., tinha um custo alto. 

A partir de 1992 as mudanças foram muito rápidas.

Os folhetos promocionais enviados por fax foram sendo substituídos por e-mails. 

No lugar dos inúmeros impressos as empresas recebiam uma fita de vídeo com explicações sobre as diferentes áreas do hotel e suas possibilidades.

A Internet, então uma novidade, era a oportunidade da criação de sites e de mostrar seus produtos. Mas era ainda algo estático. Remetia ao endereço de e-mail. 

Em 1994 chegou a telefonia celular. E o Brasil ganhou o Plano Real.

Os sites na Internet ficaram mais amigáveis.

O mundo descobriu o Spam. 

Estava encerrada definitivamente a era da mala direta.

O Plano Real trouxe grandes investimentos no mercado imobiliário e as bandeiras internacionais tiveram as suas oportunidades. 

A estabilização da moeda resgatou o uso do cartão de crédito, o brasileiro médio realizou o sonho de ver de perto o mundo de Walt Disney e as praias do nordeste brasileiro.  A nação pode atravessar o Atlântico pagando em doze vezes.

As agências de viagem ainda eram as maiores emissoras de bilhetes aéreos e reservas de hotéis. 

Em 1999 o Real foi desvalorizado, mas a demanda continuou. Não havia inflação e era possível para o hóspede uma programação de suas viagens pagas a prazo.

Comparado à década anterior, o mercado hoteleiro era só sorrisos depois de 1994. E via como um passado distante os anos de 1985/90 quando os orçamentos eram feitos em ORTN (Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional) ou em dólar estadunidense. 

Mas foi na virada do século que o panorama começou a mudar de fato. Sempre via tecnologia.

O uso da Internet foi mudando os paradigmas de venda e, portanto, de ações mercadológicas para a indústria hoteleira.

Se o turismo já não se valia mais de folhetos para vender seus produtos e se as agências de turismo tiveram que enfrentar as agências próprias das companhias aéreas, a mudança maior estava por se consolidar: a venda direta de bilhetes aéreos online.

Os hotéis também faziam exercícios de malabarismo com seus sites para reservas e seus mailings para divulgar suas promoções. 

Então, consolidada a primeira década do novo século, o cenário já estava mudado.

O melhor ponto de venda deixou de ser o site do hotel.

A chegada dos sites de vendas de hotéis e destinos turísticos estabeleceu um modelo facilitado para o cliente. Ali o interessado encontra todas as informações sobre o hotel e pode escolher pelo melhor preço, pela melhor localização, pelo charme ou pelas informações dos demais usuários que deixam ali suas críticas e elogios.

Mesmo tendo que praticar preços menores, trabalhar com ofertas promocionais, pagar taxa de adesão ou taxa para conhecer a opinião do hóspede, os hotéis têm nesses sites um ponto de venda imbatível.

Mas o marketing e as vendas nessa indústria enfrentam mais de um leão por dia. 

A chegada dos serviços Airbnb de hospedagem, por exemplo, não pode ser ignorada.

Da mesma forma como o UBER vem fazendo com os serviços de táxi, esse modelo de serviços de hospedagem criado a partir de 2008 nos EUA, vem crescendo e ganhando força. 

Se os hotéis urbanos sabem que o que garante a sua boa ocupação são os eventos nas cidades, e as reuniões corporativas, sabem também que os hóspedes pessoa física não podem ser negligenciados. E, quem sabe, agora, terão que mostrar também sua porção intimista e de charme a preços convidativos. Porque está posta a hospedagem em residências, com discutíveis benefícios e custos quase sempre compensadores em relação ao hotel estabelecido, que gera empregos, paga impostos, taxas, direitos trabalhistas, uso de marca, inúmeros fornecedores e até para afixar seu nome na porta. 

Nessa perspectiva, a de enfrentar mercado recessivo e concorrência quase predatória, nada mais atual do que o livro de Michael Gerber, de 1986, e revisado em 1995, O Mito do Empreendedor. Exatos trinta anos depois o livro – que vendeu mais de quatro milhões de exemplares só nos EUA – o tema permanece atual.

Gerber trata de diversos aspectos de um mesmo tema: como conseguir eficácia no seu negócio de serviços com o uso de sistemas, manual de operações e, sobretudo, o calor da hospitalidade, em qualquer ramo de atividade. Mas trata, sobretudo de inovação, palavra da moda nos dias atuais.

E no capítulo 15 do livro ele aborda sua experiência como hóspede num hotel de Santa Mônica, Califórnia, quando descobriu que a surpreendente atenção e gentileza com as quais foi tratado eram, ao final e ao cabo, fruto de um bom sistema e do manual de operações. Ou seja, o calor, o cosi da hospitalidade garantidos através de processos. E com eficácia. 

Receber bem o hóspede é o obvio coração do negócio hoteleiro.

Mas em tempos de demanda baixa e concorrência alta talvez algumas providências na lhaneza do trato ao seu hóspede venham fazer a diferença que vai além do preço.

Os investimentos em marketing tiveram, depois de 2010, seu foco direcionado ao Branding. 

Num mercado virtual onde sua marca está ao lado de outras concorrentes, com preços escancarados e deveras competitivos, tratar da imagem, de garantir o bom atendimento ao cliente final e até romper com algum modelo tradicional parece mesmo uma alternativa inteligente.

E o momento atual? E os próximos anos?

Se os prognósticos sobre a economia do Brasil são de que o país só vai respirar sem aparelhos depois de 2018, como fica essa indústria até lá?

Provavelmente o foco estará no Brand Equity. Esse parece ser um dos caminhos.

O valor adicional às marcas deverá ser trabalhado em compasso com ações que se traduzam em vendas. 

Criar é preciso.

Não se trata mais de simplesmente concorrer. 

Trata-se de água turva e poucos peixes.  

Criar é preciso.

Para Kotler, num senso abstrato, o Brand Equity pode ser pensado pelos profissionais de marketing como uma ponte estratégica entre o passado e o futuro. 

O exercício dos talentos será (já está sendo) interessante nos próximos dois anos. 

Resta torcer para que todos atravessem a ponte a que se refere o grande guru do marketing.

* Consultor sênior independente, foi gestor da área de Hotelaria e Turismo do SENAC de São Paulo, Gerente da área de A&B do Shopping Eldorado, Coordenador de Hotelaria e Turismo da Universidade São Francisco, consultor de várias instituições educacionais no Brasil, fundador e presidente da Ass. Brasileira dos Dirigentes da Escolas de Turismo e de Hotelaria, fundador do Instituto de Hospitalidade, BA, Vice presidente da Confederación Panamericana de Escuelasde Hoteleria y Turismo. Tem várias publicações sobre o tema.

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