Bem-servir é marco primeiro do
profissional hoteleiro no Brasil
(foto: brasillogado.com)
 
As filosofias são muitas e as tentativas de sair do lugar-comum também, porém não há hoteleiro que, quando indagado sobre o que traz excelência à hotelaria, não mencione a questão dos serviços como forma primeira.
 
Tal receita, que tem tom benévolo para o setor, vem cada vez mais ultrapassando as fronteiras do País. As empreitadas recentes do InterCity Montevideo, no Uruguai; do Bourbon Conmebol, no Paraguai; e do Blue Tree Fundador, no Chile, dão indícios claros de que as redes brasileiras querem e podem flertar com outros mercados.
 
Essa expansão pode mostrar uma mão de obra qualificada – diferente do estigma – no que tange à transformação do atendimento em algo pessoal e muito mais humanos. Coisas urgentes, desejos aparentemente inalcançáveis e solicitações esdruxúlas do hóspede podem ser, por muitas vezes, minimizadas com o velho jeitinho brasileiro. Ainda que paradoxal, o tapinha nas costas e o ar sorrateiro de quem dá jeito em tudo e consegue auxiliar o cliente seja lá no que ele precise são ferramentas possíveis e corriqueiras.
 
“Porque na minha aprendizagem falta alguém que me diga o óbvio com um ar tão extraordinário”, escreveu certa vez Clarice Lispector. E a missão hoteleira, com o perdão do parâmetro aparentemente descabido, é reconstruir coisas simples de forma excepcional, igualmente ao aforismo da escritora.
 
O brasileiro tem isso, se é que se pode dizer, por ontologia. A faceta interpessoal e o carisma tupiniquim transformam em tarefa fácil o ato de cativar. Isso, somado a conhecimento técnico e postura profissional, é a melhor ferramenta para o bem-servir. Sim, o caminho ainda é prematuro quanto aos dois itens citados, pois se trata de capacitar, treinar, disseminar conhecimento, refletir. Contudo, há meios para trilhar tal cenário uma vez que outras qualidades ficam latentes.
 
Enquanto tudo é percebido como equivalente, não há necessidade de pagar pela diferença. Todavia, a regra deve ser atrelada somente à estrutura hoteleira – e não ao serviço -, já que todos hotéis costumam ter cama, chuveiro, televisor etc etc etc. É aí que o olho no olho faz seu papel de protagonista. A hotelaria brasileira, mesmo que a afirmação pareça jactante, tem a ensinar neste sentido.
 
Assim como o visitante de um museu que, antes de mais nada, quer que o quadro que está contemplando entretenha sua visão, o hóspede – independente de sua nacionalidade – quer sua estada num hotel transformada numa experiência. Dividir a sensação de um sorriso franco que recebeu de um recepcionista ou simplesmente o fato de ele ter sido chamado pelo nome constroem uma atmosfera muito pessoal para o visitante – e nisto reside o superlativo do serviço na hotelaria do País.
 
O povo brasileiro tem isso e sabe demonstrá-lo com ingenuidade de criança – sem que tal postura soe negativa. É um povo único, o povo da confluência, do entrechoque, do caldeamento do invasor português com índios silvícolas e com negros africanos, como definiu o antropólogo Darcy Ribeiro.
 
“Somos uma cultura sincrética, um povo novo que apesar de fruto de matrizes diferenciadas se comporta como uma só gente sem se apegar a nenhum passado. O povo aberto para o futuro”, definiu o estudioso.
 
Tais pontos formam o conjunto de características que favorecem o atendimento de forma tangível, e as redes já vislumbraram a possibilidade de levar isso para além dessas paragens. É um avanço, uma guinada que precisa correr de mãos dadas a incentivos, tanto públicos quanto privados, para que se crie uma consciência da importância de se capacitar. Isto, que fique claro, não deve ser pensado somente para o trabalho; mas sim para a construção de um povo cuja educação seja norte primeiro.